7 meses de conflitos na educação e 7 reuniões com o Ministério da Educação

Desde setembro de 2022 que o "braço-de-ferro" entre o Ministério da Educação e os sindicatos do setor não tem tréguas.
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Depois de cerca de sete meses de instabilidade, greves e manifestações pelo país, há muitas questões e reivindicações que ainda aguardam resposta da tutela. Assim sendo, os professores prometem "não parar" e continuar a lutar pelo respeito e valorização da profissão. No dia em que está marcada mais uma ronda negocial no Ministério da Educação, em Lisboa, os docentes esperam encontrar soluções para a recuperação do tempo de serviço, depois de se ter chegado, a 22 de março, a um entendimento sobre o novo modelo de contratação. Restam apenas uns meses para terminar o ano letivo e com a aproximação dos exames nacionais, acrescem as preocupações dos pais que veem os seus filhos sem aulas e forçados a adaptar-se a uma nova realidade escolar, após dois anos de pandemia.

Desde o início de setembro de 2022 que os representantes dos professores e do governo tentam negociar para chegar a acordo quanto a um novo modelo de recrutamento e colocação de docentes, bem como a recuperação do tempo de serviço congelado ou o fim das vagas e quotas de acesso ao 5.º e 7.º escalões.

Os professores estão em greve desde 9 de dezembro, dando início a uma paralisação por tempo indeterminado convocada pelo Sindicato de Todos os Profissionais da Educação (S.T.O.P), que se mantém, em protesto contra as propostas do governo.

Lutam pela valorização da carreira docente, cujos problemas têm vindo a, no seu entender, prejudicá-los. De acordo com Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof, as seis grandes reivindicações dos professores são "a vinculação tardia, o incumprimento do limite do horário de trabalho, a recuperação do tempo de serviço, a revisão do modelo de contratação, a criação de um regime especial de aposentação e salários justos".

Nas reuniões negociais com os representantes dos professores, o ministro João Costa propôs a vinculação aos quadros de cerca de 10 mil professores em 2023/2024, bem como a redução das distâncias entre as residências dos docentes e as escolas onde são colocados. Além disso, propôs ainda uma mudança no concurso, permitindo que os docentes concorressem a escolas em 2024, abrindo só depois vagas onde faltem professores. Por fim, o Ministério da Educação prometeu aumentos salariais para os professores que não consigam entrar nos quadros.

As organizações sindicais voltam a reunir-se com o Ministério da Educação esta tarde, pelas 15h00, para discutir a "correção dos efeitos assimétricos internos à carreira docente, decorrentes do período de congelamento" -- 6 anos, 6 meses e 23 dias.

Depois de "um longo processo negocial", a tutela e os docentes apenas chegaram a entendimento quanto ao modelo de contratação de professores.

O ministro da Educação, João Costa, anunciou a contratação prevista para 2024, que pretende dar resposta a algumas das reivindicações dos professores e uma "melhoria das condições de trabalho de professores, a sua estabilização, a valorização salarial e combater e reduzir fortemente a precariedade historicamente associada a esta profissão".

De acordo com o ministro, o decreto-lei aprovado em Conselho de Ministros, permite que este ano sejam vinculados cerca de 10 500 docentes, reduzindo "em cerca de 50% a precariedade dos professores". Aliás, passa a existir ainda a possibilidade de os docentes serem integrados nos quadros à medida que reúnam os requisitos necessários (através de um mecanismo de vinculação dinâmica).

Desde o dia 27 de março que a Federação Nacional de Professores iniciou paralisações sem data de término, que desta vez implicam as avaliações finais dos alunos.

Nesse sentido, a partir de 17 de abril (depois da interrupção letiva da Páscoa) e até 12 de maio, os docentes prometem sair à rua para dar início a uma nova ronda de greves por distrito, começando no Porto e acabando em Lisboa. No entanto, de acordo com a Fenprof, as greves não se ficam apenas pelos distritos: a plataforma vai também iniciar uma "greve ao ultimo tempo letivo diário de cada docente".

Além disso, a nova forma de luta promovida pela Fenprof prevê uma manifestação nacional a 6 de junho -- data simbólica (06-06-23) que assinala os 6 anos, 6 meses e 23 dias que os professores reivindicam de recuperação de tempo de carreira.

Por sua vez, o Sindicato de Todos os Profissionais da Educação vai manter o pré-aviso de greve por tempo indeterminado até 16 de abril.

O líder do S.T.O.P, André Pestana, apelou ainda a uma grande manifestação no dia 25 de abril, em Lisboa, em nome da luta dos professores e profissionais de educação.

As paralisações dos professores têm causado impactos sobretudo nas escolas (muitas fecharam devido à ausência de profissionais da educação), afetando alunos dos vários anos de escolaridade que ficaram sem aulas por tempo indefinido. Muitos pais alertam para o atraso no processo de aprendizagem dos alunos - especialmente para os jovens que irão realizar exames nacionais de acesso ao ensino superior - e para o facto de as escolas serem o local que dá apoio a muitas crianças enquanto os familiares estão a trabalhar.

Perante a situação de instabilidade provocada pelas greves, o Tribunal Arbitral determinou, a pedido do Ministério da Educação, a realização de serviços mínimos nas escolas. Nesse sentido, os estabelecimentos de ensino terão de garantir apoios a alunos sinalizados pela CPCJ, crianças e jovens integrados na educação inclusiva e alunos em "especial perigo de abandono escolar".

O pessoal não docente terá ainda de garantir o serviço de portaria e vigilância aos alunos dentro do espaço escolar, assim como a disponibilização de refeições (quando o refeitório não está concessionado).

Para o cumprimento dos serviços mínimos, as escolas devem disponibilizar um docente por apoio, de acordo com a especialidade, bem como um mínimo de um trabalhador para o serviço de portaria, três trabalhadores para o refeitório e um trabalhador para vigilância e segurança dos alunos.

Apesar de o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, ter pedido um entendimento entre o governo e os professores até à época da Páscoa, a situação ainda se encontra instável, não havendo uma data prevista para o fim das greves dos docentes. Nesse sentido, as paralisações poderão estender-se até ao final do atual ano letivo.

O Ministério da Educação pediu um parecer jurídico à Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre a legalidade da forma de execução das greves por tempo indeterminado que estão em curso nas escolas.

Segundo a PGR, em resposta ao apelo do ministro João Costa, "há uma divergência entre os avisos prévios de greve enviados ao Ministério da Educação, que referiam que a greve corresponderia à jornada diária de trabalho, e a informação aos docentes" publicada pelo S.T.O.P "que afirma ser possível aos docentes decidirem a concreta duração do período em que aderem à greve, tornando-a, nesses casos, numa greve com características similares às da greve self-service".

Logo, segundo o parecer da Procuradoria-Geral da República, divulgado pelo ME, a execução das greves nestes termos, e em detrimento dos avisos prévios, "afeta a respetiva legalidade do exercício deste direito". Em comunicado, o ME relembrou que execução das greves "deverá respeitar os pré-avisos apresentados pelas organizações sindicais, em respeito pela legislação que enquadra o direito à greve, enquanto direito fundamental dos trabalhadores".

Dezenas de profissionais da educação estiveram no dia 28 de março no Parlamento Europeu, em Bruxelas, para expor aos eurodeputados do PSD, Bloco de Esquerda, PCP, CDS e PS as reivindicações do setor, queixando-se de em Portugal não serem ouvidos e serem apenas números. Formado "de forma espontânea" através da rede WhatsApp, o grupo Rumo a Bruxelas os professores e profissionais da Educação saíram do Parlamento Europeu com "esperança" numa mudança, realçando o sentimento de que foram finalmente ouvidos.

A luta dos professores e dos profissionais da educação tem ficado marcada por duas personalidades que dão cara ao manifesto: Mário Nogueira (Fenprof) e André Pestana (S.T.O.P).

Além dos restantes sindicatos e organizações -- FNE, SNPL, SIPEB, ASPL, SEPLEU, PRóORDEM, SIPE, FENEI/SINDEP, SPLIU e FEPECI -- os representantes da Federação Nacional de Professores e Sindicato de Todos os Profissionais da Educação têm sido os responsáveis pelas greves e manifestações sentidas por todo o país durante os últimos sete meses.

A 11 de fevereiro, todas as organizações de professores uniram-se para uma Manifestação Nacional "histórica" que uniu cerca de 100 mil pessoas no Terreiro do Paço, em Lisboa, depois de 18 dias de greve por distrito.

A falta de professores nas escolas um problema para o qual sindicatos têm alertado há mais de uma década.

A classe docente está neste momento envelhecida e a registar um número elevado de aposentações. Esta situação é agravada pelo facto de haver pouca procura por seguir esta profissão por parte dos jovens, que não consideram haver atratividade na carreira devido aos baixos salários e falta de condições.

Tendo em conta a recuperação do tempo de serviço, os professores defendem que os colegas das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores viram todo o tempo congelado contabilizado e, por esse motivo, recusam-se a abdicar do tempo que trabalharam.

Nos Açores já não existem quotas na avaliação da carreira e a Madeira promete seguir a mesma medida. Esta é uma realidade que os professores garantem ser possível estender a Portugal Continental. Logo, "não paramos" é a palavra de ordem dos docentes que mantm as greves, manifestações e protestos em frente às escolas até ao final do ano letivo.

ines.dias@dn.pt

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