O comissário Artur Serafim (à esquerda) com a equipa Trovit: as agentes-principais Fabiana Tomás e Anabela Ferreira e o chefe João Oliveira. -- Foto: GERARDO SANTOS/GLOBAL IMAGENS
O comissário Artur Serafim (à esquerda) com a equipa Trovit: as agentes-principais Fabiana Tomás e Anabela Ferreira e o chefe João Oliveira. -- Foto: GERARDO SANTOS/GLOBAL IMAGENS

422 comunicações em quatro meses. PSP cria equipa especial para tratar de desaparecimentos

A equipa Trovit é composta por três elementos que juntam toda a informação sobre os desaparecidos e se articulam com 6500 polícias, a trabalhar em rede. A proximidade com os familiares, dando-lhes apoio e informações sobre as diligências em curso, é outro grande objetivo destes agentes.
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A iniciativa partiu do Comando Metropolitano da PSP de Lisboa (Cometlis) e, por enquanto, esta valência ainda só está disponível aqui. O grande número de comunicações de desaparecidos foi o mote para a criação da equipa Trovit. “Se olharmos para os dados deste ano, relativos aos primeiros quatro meses, já tivemos 422 comunicações de desaparecimento. Todas essas tiveram de ser monitorizadas por nós”, começa por explicar o chefe João Oliveira, que está à frente da Trovit, composta ainda pelas agentes principais Fabiana Tomás e Anabela Ferreira. 

No entanto, este número não pode ser lido em termos absolutos. “Isto não quer dizer que 422 pessoas desapareceram. A mesma pessoa pode desaparecer várias vezes e cada vez que isso acontece é aberto um processo”, desvenda este responsável. João Oliveira exemplifica: “Destes 422 que lhe falei, 209 foram de menores institucionalizados, que se ausentaram das instituições, e a maior parte deles já foi encontrado. Temos um menor que desapareceu 30 vezes, ou seja, deu origem a 30 comunicações de desaparecimento”. 

Apesar da relatividade dos números, o desaparecimento de pessoas preocupa as autoridades. “Temos de olhar para isto com um olhar diferente porque não se trata do extravio de uma carteira. É uma pessoa que se perde, portanto, o familiar ou o amigo que participa precisa de ter respostas. Basta colocarmo-nos nessa posição: se fosse a nossa avó, o nosso filho, iríamos querer ter uma resposta por parte das autoridades competentes”, enfatiza a agente principal Fabiana Tomás.

A equipa é recente apesar de já ter bastante trabalho feito. “Nasceu da necessidade do comando dar seguimento a todas as participações de desaparecimento que são comunicadas nas unidades policiais. Esta equipa, que atualmente é composta por três pessoas, integra uma rede de 6500 polícias. Fazemos todos parte dessa rede de localização de pessoas desaparecidas”, observa o comissário Artur Serafim, relações-públicas do comando metropolitano de Lisboa da PSP. E prossegue: “A equipa está em fase embrionária, começou em fevereiro. Já têm alguns trabalhos feitos na rua, bem como a compilação de todos os dados das pessoas desaparecidas”. 

Quando alguém desaparece, normalmente é um familiar que comunica a situação. A Trovit propõe-se, além de tudo o mais, a dar o devido apoio aos familiares. “As famílias deixam, por norma, de ter conhecimento das nossas diligências e, neste caso, esta equipa efetua um contacto de forma a aprimorar essa informação. Dá conforto à família, faz saber que continuamos a dar seguimento à participação de desaparecido por forma a encontrá-lo. Seja qual for o desfecho final, o objetivo é a família perceber que o caso não está esquecido”, continua Artur Serafim.

“Há um primeiro impacto de comunicação na esquadra e esta equipa tem, depois, a missão de dar o seguimento e verificação dos procedimentos que foram efetuados pelas sub-unidades, nomeadamente contactos com hospitais, o Instituto de Medicina Legal (IML) ou até com outras entidades, como, por exemplo, o local de trabalho da pessoa que está desaparecida”.

O nome da equipa, Trovit, não foi escolhido ao acaso. “Trovit vem do Esperanto e significa ‘encontrar’”, esclarece o chefe João Oliveira. “Acabamos por monitorizar todas as comunicações de desaparecimento recebidas no comando (de Lisboa) para perceber onde é que existem lacunas, onde é que podemos melhorar, onde é que podemos fazer um melhor trabalho. Estamos mais próximos do cidadão, sobretudo em casos de risco elevado”, acrescenta João Oliveira.

Para maior eficácia do trabalho de investigação e busca por desaparecidos, o chefe João Oliveira enfatiza: “É preciso que nós consigamos entender melhor este fenómeno. Existem desaparecidos que são voluntários, que entram neste rol e que são crianças que estão institucionalizadas e pretendem eximir-se às regras daquela instituição. E depois existe um outro rol de pessoas que, pelas mais diferentes situações – que podem ser voluntárias ou não –, desaparecem. E aí também temos de ter um trabalho para perceber qual é o perigo que essa pessoa corre”. 

Nos casos em que há “suspeitas de crime no desaparecimento, o caso passa imediatamente para a alçada da Polícia Judiciária (PJ). Nós não fazemos investigação criminal. Fazemos uma compilação de informação, primeiro com o participante, depois em fontes abertas. Hoje em dia passa muito por redes sociais que a pessoa possa ter. Lá pode mostrar um comportamento que os outros não conseguiram perceber e nós, com a formação que temos, conseguimos ter essa destreza”, analisa o comissário Artur Serafim. “Também fazemos a recolha de informações junto de outros familiares, amigos ou vizinhos, se for necessário. E buscas no terreno se houver uma forte possibilidade de a pessoa estar em determinada localidade. Porque a pessoa pode ausentar-se para outros lados”.

Há casos em que logo na altura em que é participado o desaparecimento se percebe que há perigo para o desaparecido. “Uma coisa muito importante é a informação que nos é transmitida pelo participante. Essa recolha de informação é elaborada pelos agentes chefes que estão nas esquadras e é muito importante”, afiança João Oliveira. “Posso dar um exemplo: há situações que são bastante fáceis de qualificar o risco. Por exemplo, quando existe uma ideação suicida do desaparecido, que é transmitida, e o cidadão que recorre a nós para tentar localizar essa pessoa a relata. Aí, não há dúvida nenhuma que há um risco. Então, trabalhamos em conjunto com as esquadras e outras valências que podemos utilizar da PSP, na tentativa de localizar a pessoa”, completa o chefe da equipa.

A Trovit está sempre em articulação com os restantes elementos policiais. “Tentamos melhorar procedimentos, propor alterações a determinados métodos de trabalho que estão instituídos e criar um fluxo de comunicação, mesmo dentro do comando de Lisboa”, avança João Oliveira. “Isto também nos permite analisar e criar metodologias para depois difundirmos, de modo a melhorar o trabalho que fazemos neste âmbito dos desaparecidos”. E completa:“Depois, existe uma parte em que nós entramos paralelamente ao trabalho que é desenvolvido pelas esquadras, quando são casos de risco elevado ou em que o risco sobe para esse patamar com o desenvolver de algumas diligências. Por exemplo, quando há perigo para a vida ou integridade física da pessoa, que normalmente não está ao alcance das esquadras, pelas mais diferentes razões, e aí nós temos uma ação paralela para conseguir reunir mais informação que nos permita conseguir chegar à localização do desaparecido”.

A Trovit, além do suporte que dá aos familiares dos desaparecidos e aos restantes elementos policiais, também sai para o terreno, participando em buscas.

Assim que é notada a ausência de alguém, a mesma deve ser comunicada. E que faz a participação deve tentar reunir o máximo de dados possíveis. “Perante essa situação aconselhamos as pessoas a deslocarem-se a uma unidade policial na posse de várias informações sobre a pessoa: uma fotografia atual, que pode ser em formato digital, altura, peso, a mobilidade da pessoa, indicação sobre as rotinas, contactos da pessoa, moradas, local de trabalho. Todas as informações são importantes”, diz Artur Serafim. 

No caso de crianças ou adultos vulneráveis há ainda a possibilidade de se inscreverem nos programas Estou Aqui ! Crianças e Estou Aqui ! Adultos, que consistem na colocação de uma pulseira com número mecanográfico. Assim, se a pessoa se perder quem a encontrar deve dirigir-se à polícia. “Com essa identificação nós, pela consulta dos nossos dados, conseguimos chegar à identificação da pessoa e dos seus cuidadores ou familiares”, completa Artur Serafim.

isabel.laranjo@dn.pt

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