Substituição da G3: parece que à terceira será de vez

Depois de anulados os concursos de 2004 e 2007, ministério inicia neste ano compra da arma ligeira de que se fala há várias décadas
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Décadas após serem anunciados e cancelados os concursos para substituir a velha espingarda G3, estima-se novo prazo para um processo agora conduzido através da NATO: o final do ano, com as primeiras armas a chegarem em 2018.

A informação foi dada nesta semana pelo ministro da Defesa: se continuarem a ser cumpridos os prazos, é seguro que "até final de 2017 praticamente tenhamos o concurso concluído", disse Azeredo Lopes, o que "significa quase uma revolução, considerando o tempo extraordinário que demorou" o processo para Portugal deixar de ter o exército europeu com a arma mais antiga nos teatros de operações.

O ramo disse que "o processo de aquisição de armamento ligeiro vai iniciar-se em 2017 e decorrerá até 2022", através da agência de apoio e compras da NATO (NSPA, sigla em inglês), "estando prevista a chegada das primeiras armas em 2018". Mas, ao contrário dos concursos anteriores, "não vai realizar testes com nenhum fabricante em particular (...) e o que se pretende é adquirir uma arma "já pronta", que já exista e de preferência com provas dadas em outros exércitos da NATO", disse o porta-voz, tenente-coronel Vicente Pereira.

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Segundo a tutela, houve "dois concursos" (2004 e 2007) que foram anulados, pelo que este será o terceiro. Mas há quem tenha outras memórias desde os anos 1970. Barroca Monteiro, coronel paraquedista, escreveu em 2012, no Público, que a G3 "anda há séculos a ser objeto de tentativas de substituição", sendo "inúmeras as provas de teste de novas armas [e] tantas como os concursos lançados". Ex-ajudante-de-campo de Ramalho Eanes, o oficial deixava uma dúvida: "Haverá algures na Defesa um dossiê com o registo das despesas efetuadas" ao longo dos anos?

O programa integra a Lei de Programação Militar (LPM), na rubrica "Capacidade de Proteção e Sobrevivência das Forças" terrestres, havendo 80,8 milhões de euros repartidos por dois subprojetos: o do "armamento ligeiro" e o da aquisição de "equipamento individual" (uniformes, botas, acessórios).

"Nesta fase ainda não existe qualquer outro tipo de informação" sobre o concurso, informou a Defesa, "designadamente as opções técnicas e operacionais na escolha das armas a adquirir". O que se sabe é que "o projeto prevê a aquisição de quatro tipologias" de armas: espingarda automática, metralhadora ligeira, pistola e pistola-metralhadora, para "equipar pelo menos três batalhões com todo o equipamento individual", referiu a tutela.

O concurso vai assim equipar apenas a componente operacional do Exército e não todo o ramo ou as Forças Armadas, com 32 700 efetivos. O Exército escusou-se a quantificar as unidades por cada modelo, cujo total ronda as 15 mil armas. "A tendência atual", com as lições da guerra no Afeganistão, "parece ser manter espingardas 5,56 mm como arma regulamentar e usar as de calibre 7.62 em número razoável para atiradores de precisão ou certas missões especiais", explicou o tenente-coronel paraquedista Miguel Machado. O Exército também se escusou a dizer quantas G3 estão em uso e armazenadas. Mas elas serão "largas dezenas de milhares", adiantou este oficial superior na reforma.

As G3 começaram a ser usadas pelas tropas portuguesas no início da guerra colonial, com a compra de quase três mil unidades à Alemanha em 1961 e o posterior fabrico, em Portugal, de meio milhão dessas armas, segundo dados publicados na Revista Militar pelo major-general Marques Pinto.

Essas espingardas "têm provas dadas" e ainda hoje "são fiáveis", contou ao DN o sargento-ajudante comando Silva Freitas, na cerimónia de despedida, na terça-feira, para a missão da ONU na República Centro-Africana (RCA) e onde o contingente português vai usar a G3.

Miguel Machado realçou que as G3 "têm uma boa mecânica, são robustas" e "certamente puderam ser escolhidas as melhores", entre as muitas em uso e as várias dezenas de milhares armazenadas, "para equiparem a força" que vai atuar na RCA. Mas "é uma arma obsoleta" - e a prova é que os aliados estão a substituir armas mais modernas. A G3 "é uma espingarda concebida há mais de 50 anos! A evolução nos materiais, na ergonomia das armas, na capacidade de adaptação de acessórios e, muito importante, nos sistemas de pontaria tem sido enorme", enfatizou o autor do site especializado www.operacional.pt.

"Aspeto significativo, dos mais importantes em combate além do bom funcionamento da arma, é o sistema de pontaria que é sempre constituído por uma alça telescópica com sistemas mais ou menos complexos para facilitar ao atirador o acertar no inimigo". Agora "as espingardas automáticas são construídas em ligas de aço diferentes, são concebidas para levar uma série de suportes para acessórios (lança-granadas, sistemas de pontaria, punhos, tripés, lanternas), têm carregadores com maior capacidade e ou possibilidade de ver o número de munições ainda no interior... a parte mecânica está mais desenvolvida, os sistemas de recuperação de munições são muito mais suaves, têm melhor ergonomia", adiantou.

Quanto ao futuro das velhas G3, a Defesa informou que, dado o seu estado de conservação "e apenas quando existirem" as novas armas "será equacionada a melhor solução", que "poderá passar pela sua alienação para venda a outro país". Outra hipótese é a "alienação para sucata" - leia-se destruição.

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