Orçamento de Costa nas mãos de Passos e Portas

PCP vai votar contra o Retificativo. BE impôs condições a Costa. Viabilização fica dependente dos votos de PSD e CDS

Nem PSD, nem CDS disseram ainda como vão votar o orçamento retificativo. A decisão social-democrata deverá ser tomada esta tarde na reunião da comissão permanente do partido. E poderá ser a "abstenção", segundo o Expresso - solução que o CDS também prefere e que será suficiente para "compensar" o voto contra do PCP e o eventual voto contra do BE, dada a natureza das condições reivindicadas.

Até agora, apenas o presidente do Governo Regional da Madeira, Miguel Albuquerque, disse já ter dado indicações aos deputados do PSD/M na Assembleia da República para "não votarem contra" o Orçamento Retificativo - o que significa três votos que "tanto podem ser de abstenção, como a favor"

"Não votar contra o Orçamento Retificativo, foi essa a indicação que dei aos deputados uma vez que este Orçamento Retificativo vem resolver uma situação que para nós é muito importante, que é a manutenção dos depósitos e assegurar os depósitos no Banif e os postos de trabalho", afirmou o governante madeirense.

O líder regional apontou ainda que "a abstenção não tem implicações, uma vez que o orçamento vai ser retificativo".

Na segunda-feira, depois de se ter reunido com o primeiro-ministro, António Costa, Miguel Albuquerque considerou que a venda do Banif foi "a possível", já que salvaguarda os interesses dos clientes, e defendeu o reforço dos poderes de supervisão sobre o sistema financeiro.

Passos Coelho não revelou esta manhã qual será a orientação de voto social-democrata, mas confessou que não teria uma "solução muito diferente" para o Banif da encontrada pelo atual Governo.

O ex-primeiro-ministro recusou, no entanto, quaisquer responsabilidades dizendo que "não foi possível identificar ao longo destes anos um comprador para o Banif". Ontem, Mário Centeno, ministro das Finanças, responsabilizou Passos e Portas pela situação - falou em questões eleitoralistas por causa da "saída limpa" e das eleições de 4 de outubro - avisando que os "défices de 2015 e futuros" vão subir e que o caso Banif iria "aumentar o endividamento do país".

O CDS também ainda não revelou como vai votar amanhã. O líder parlamentar disse que a solução do governo, levanta "muitas dúvidas sobre se os valores injetados no banco são os adequados", tendo em conta a dimensão do Banif. As mesmas "dúvidas" tem o CDS sobre se "a repartição dos custos entre os contribuintes e sistema financeiro é o mais adequado". Se haveria outras soluções? Nuno Magalhães remeteu para a comissão de inquérito.

PCP VOTA CONTRA

O PCP vota contra a proposta do Governo de Orçamento Retificativo para 2015, discordando da solução de transferir para os contribuintes uma fatia substancial dos encargos com o Banif.

"Defendemos a integração da atividade bancária do Banif na esfera do sistema público bancário, porque essa era a solução que corresponderia melhor à defesa dos interesses nacionais", sustentou João Oliveira em conferência de imprensa na Assembleia da República.

Durante a conferência de imprensa, em que esteve acompanhado pelo deputado do PCP Miguel Tiago, João Oliveira mostrou-se em total desacordo com a solução inscrita pelo executivo socialista no Orçamento Retificativo para 2015 no sentido de transferir para um veículo público potenciais perdas do Banif - perdas que podem atingir os três mil milhões de euros -, mas também com a venda desta instituição bancária a um banco multinacional estrangeiro, o Santander Totta, por cerca de 150 milhões de euros.

"O Estado deveria dispor daquilo que fica da atividade do banco e daquilo que deve ser salvaguardado, como os postos de trabalho, a atividade bancária e os depositantes (em particular as economias das regiões autónomas dos Açores e Madeira)", justificou o presidente do Grupo Parlamentar do PCP.

Não podemos acompanhar uma solução em que se prevê que o Estado gaste para cobrir o buraco do Banif e, ao mesmo tempo, entregue o Banif a um banco privado estrangeiro

Ao longo da conferência de imprensa, o líder da bancada comunista advertiu que "a culpa" deste processo de venda do Banif "não pode morrer solteira", apontando então "pesadas responsabilidades" ao anterior Governo PSD/CDS-PP - isto, já depois de ter classificado como "insustentável" a posição de Carlos Costa enquanto governador do Banco de Portugal.

Interrogado sobre a real coesão do suporte parlamentar de esquerda ao executivo socialista, na sequência da posição do PCP sobre este processo, João Oliveira frisou que a solução para o Banif, assim como o quadro da proposta do Governo de Orçamento Retificativo para 2015, "não fazem parte do acordo político" celebrado entre PS e PCP.

Já sobre a opção do Bloco de Esquerda de impor condições ao Governo socialista para aceitar viabilizar a proposta de Orçamento Retificativo, o presidente do Grupo Parlamentar do PCP demarcou-se deste caminho seguido pelos bloquistas: "Não fazemos depender a nossa posição de quaisquer condições, porque não podemos admitir a possibilidade de contribuir para que os portugueses sejam responsabilizados pela situação do Banif", vincou.

BLOCO IMPÕE CONDIÇÕES

O BE impõe duas condições para aprovar o orçamento retificativo do governo. Uma é ser criada uma nova lei de intervenção no sistema financeiro, com a constituição de uma nova autoridade nacional e a retirada de poderes ao Banco de Portugal. A segunda condição é que o Novo Banco fique na esfera pública, com o Estado a assumir a direção do Fundo de Resolução e o fim da proteção aos chamados credores séniores.

Nova lei de resolução bancária deve retirar poderes ao Banco de Portugal, separando poderes de supervisão e de intervenção

"Tem que acabar já o tempo em que os bancos privados são limpos com os dinheiros públicos e depois ficam outra vez nas mãos dos privados. É preciso garantir que não haverá outros bancos a exigir cheques em branco", destacou a coordenadora do BE, Catarina Martins.

A dirigente bloquista sublinhou ainda que o seu partido não concorda com a resolução do governo de António Costa, tendo antes defendido a integração do Banif na CGD, proposta que não foi aceite pela Comissão Europeia.

Catarina Martins afirmou que, "para o Bloco de Esquerda, o sacrifício dos contribuintes tem que terminar agora", porque "haverá sempre outros bancos a exigir o mesmo cheque em branco" e é nesse sentido que apresenta as duas condições anunciadas, além da constituição de uma comissão parlamentar de inquérito sobre o Banif.

A dirigente bloquista considerou que há condições para aprovar a nova lei de resolução bancária que o partido propõe "em tempo útil", podendo o plenário da Assembleia da República ser convocado para o dia 28 de dezembro.

"O reiterado fracasso do banco central e do seu governador demonstra que é necessária uma nova instituição com a competência e a vontade para atuar quando uma instituição financeira tiver que ser intervencionada. Ora, o governador do Banco de Portugal é inamovível e torna-se evidente que o Banco de Portugal não cumprirá essa função", sustentou.

É necessário que haja condições, garantias claras, de uma alteração de estado de coisas

"A venda no Novo Banco está a ser desenhada para impor mais perdas aos contribuintes, ainda além dos 3900 milhões já usados pelo Estado. Porém, uma resolução decidida e criteriosa pode repor os rácios do banco sem nova injeção de capital e sem venda", argumentou, explicando depois que esse processo passa por impor perdas aos "credores séniores".

Sobre o Banif, Catarina Martins exigiu uma inspeção a todas as operações do último ano, em que "nas operações acima de um milhão de euros devem ser obrigatoriamente verificadas as garantias, os destinatários e o cumprimento dos contratos" e deve ainda "ser inspecionada uma amostra aleatória das restantes operações de concessão ou modificação de contratos de crédito ou de aplicações financeiras".

"Os portugueses e os trabalhadores bancários cujos posto de trabalho estão em risco merecem saber onde está o dinheiro", disse.

Catarina Martins reiterou as exigências que já tinham sido feitas ontem pelo BE, em defesa da Comissão de Inquérito: "Quando alguém perde, alguém ganhou e é urgente saber quem ganhou com as perdas do Banif. Onde está o dinheiro?"

OS ARGUMENTOS DO GOVERNO

Em conferência de imprensa no final do Conselho de Ministros de segunda-feira, o ministro das Finanças disse que o Orçamento Retificativo, discutido e aprovado na reunião do executivo, conta com uma injeção total de 2.255 milhões de euros para financiar a medida de resolução do Banif.

Mário Centeno adiantou que, dos 2.255 milhões de euros, o Estado vai dar uma ajuda direta de 1.766 milhões de euros e emprestará 489 milhões ao Fundo de Resolução.

"Este dinheiro vem do Orçamento do Estado e vai refletir-se no défice do Estado de 2015 e vai também refletir-se nos défices futuros, na medida em que aumenta o endividamento do país", mas "não terá consequências da avaliação do procedimento de défices excessivos dada a natureza da operação", frisou o ministro das Finanças.

Segundo Mário Centeno, o impacto nas contas públicas será de 2,2 mil milhões de euros, sendo que em termos de défice, embora seja ainda difícil de calcular, por as contas não estarem fechadas, "vai fazer aumentar o défice em mais de um ponto percentual do Produto Interno Bruto (PIB)".

O ministro das Finanças acrescentou que "o impacto no défice decorre da alteração que está a ser proposta à lei orçamental", o Orçamento Retificativo, sendo que a saída do procedimento dos défices excessivos "é um processo de avaliação que a Comissão Europeia irá desenvolver a partir do momento em que for apurado o défice de 2015".

Em comunicado do Conselho de Ministros, o Governo refere que a opção pelo resgate do Banif, "funda-se em imperiosas razões de interesse público, pois não só visa impedir a liquidação do banco, o qual comportaria sérias consequências sociais, tais como o despedimento dos seus trabalhadores e a imposição de perdas aos respetivos depositantes".

Acrescenta ainda que esta decisão de apresentação de um Orçamento Retificativo "visa minorar os muito elevados custos potenciais para o erário público e prevenir a erosão da confiança no sistema bancário e a perturbação da estabilidade do sistema financeiro nacional".

O QUE DIZ A PROPOSTA

O Governo na proposta de Orçamento Retificativo, prevê um aumento do endividamento do Estado e das garantias a conceder, que a resolução do Banif impede a sua liquidação, que implicaria despedimentos de trabalhadores e perdas para depositantes.

Na primeira proposta de lei de alteração ao OE2015, entregue na Assembleia da República, é dito que, apesar dos 1.100 milhões de euros injetados no Banif em 2013 para a sua recapitalização, este "não logrou assegurar a sua viabilidade de forma autónoma", pelo que no domingo o Banco de Portugal aplicou uma medida de resolução "acompanhada da venda imediata de um conjunto de ativos e passivos", que o Executivo liderado por António Costa justifica por "imperiosas razões de interesse público".

"Não só visa impedir a liquidação do banco, a qual comportaria sérias consequências sociais, tais como despedimento dos seus trabalhadores e a imposição de perdas aos respetivos depositantes, como visa minorar os muito elevados custos potenciais para o erário público e prevenir a erosão da confiança no sistema bancário e a perturbação da estabilidade do sistema financeiro nacional", lê-se na Exposição de Motivos que acompanha a proposta que altera o Orçamento do Estado para 2015.

O Governo diz que, uma vez escolhida esta via, é necessário "financiar a referida operação, bem como dotar o Fundo de Resolução dos meios indispensáveis a garantir o exercício das suas responsabilidades de financiamento".

É feita assim a proposta de alterar a lei orçamental, que será discutida e votado na quarta-feira e que tem de ser aprovada por maioria na Assembleia da República, para aumentar o "montante total das despesas no programa orçamental" assim como os "limites de endividamento líquido" inscritos no Orçamento do Estado para 2015.

No endividamento líquido global direto, o Orçamento do Estado tem atualmente inscritos 8.600 milhões de euros e a proposta é passar para 10.855 milhões de euros, mais 2.255 milhões de euros. Este valor corresponde ao apoio público anunciado para "contingências futuras" no âmbito do resgate ao Banif.

O Governo propõe ainda mudar artigos da lei referentes à concessão de empréstimos pelos serviços e fundos autónomos, passando do limite de 750 milhões inscritos no Orçamento para 1.239 milhões de euros. Ou seja, mais 489 milhões de euros, valor previsto para ser emprestado pelo Fundo de Resolução bancário no âmbito do resgate do Banif.

É ainda acrescentada uma alínea ao artigo 127, que não existia, a permitir que o Estado dê garantias a favor do Fundo de Resolução para cobrir responsabilidades por este assumidas.

Além disso, o "limite máximo para a concessão de garantias" passa de 110 para 860 milhões de euros, mais 750 milhões de euros, que deverão ser usados em garantias ao Banif.

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