O tango com Sócrates deixou de ser possível com António Costa
Acabou-se o tango. Uma das grandes diferenças no discurso de vitória do último sábado à noite, o que fez quando foi eleito pela primeira vez líder do PSD (em abril de 2010), é que Passos Coelho estava disposto a dar a mão a um governo socialista minoritário (o de José Sócrates) e agora vinca a diferença para o de António Costa, numa espécie de ou nós ou eles.
Em 2010, o líder do PSD - que Sócrates chegou a considerar "parceiro de tango"- preparava-se para viabilizar um PEC (Programa de Estabilidade e Crescimento) de Sócrates e dizia estar "disponível para ajudar o governo a vencer as dificuldades grandes em que o país se encontra". É certo que dizia que não ia "andar com o governo ao colo", mas recusava contribuir para o surgimento de "crises políticas que o país não precisa".
Agora - após apresentar uma moção de estratégia em que põe esse ónus no futuro Presidente da República - apresenta-se como a reserva do país para quando Costa falhar. No discurso da vitória nas diretas (que venceu com 95% dos votos) disse ser "fundamental que o país nos próximos anos possa ter uma alternativa a este governo".
As críticas a Costa também foram mais duras do que as que fez a José Sócrates, acusando o atual governo de "andar para trás, gerindo de forma populista e facilitista as aspirações dos portugueses" .
Entre estes dois discursos de vitória no PSD (o de 2010 e o de 2016) houve dois que coincidiram com o período de governação. Em 2014, Passos lembrava que o programa de austeridade estava a chegar ao fim, mas não as restrições.
Passos dizia que sabia que não teria "um milagre económico em maio", mês da saída da troika. E por isso avisava que "quando fecharmos o período de assistência económica e financeira ainda teremos desafios muito importantes para enfrentar, seja a nível do desemprego seja a nível da coesão social, coesão territorial e recuperação económica".
Já em 2012, o discurso foi virado também para dentro do partido, defendendo que "o PSD quando está no governo precisa de encontrar outros mecanismos para manter a sua vitalidade.
Neste fim de semana, Passos Coelho teve a sua quarta eleição consecutiva e, curiosamente, nos quatro discursos de vitória afirmou que o PSD iria iniciar um "novo ciclo".
Mortos nos cadernos eleitorais
Com uma vitória superior a 95%, as eleições diretas do último sábado foram mesmo tranquilas para Passos Coelho, que conseguiu a maior vitória de sempre de um candidato (Marques Mendes tinha a melhor, até agora, como único, com cerca de 91% dos votos). Passos conseguiu 22 161 votos num universo de 23 271 votantes. Em 2014, só tinham votado 17 mil militantes.
Em Aveiro, a lista que tinha o líder parlamentar, Luís Montenegro, como mandatário perdeu as eleições de forma clara. O atual líder da distrital, Ulisses Pereira, perdeu para o presidente da Câmara Municipal de Ovar, Salvador Malheiro.
Depois da polémica de 418 militantes inscritos em bloco (17 na mesma morada, 77 com o mesmo número de telefone), ontem o DN voltou a ouvir queixas de uma fonte da distrital de Aveiro de que havia "mortos nos cadernos eleitorais". Ainda assim, apurou o DN, nenhuma queixa chegou ao Conselho de Jurisdição Nacional (CJN).
O CJN pode agora também estar mais tranquilo, é que a lista de Ulisses Pereira, que tentou anular a convocatória de eleições, perdeu por 1234 votos. Ou seja: os 418 que foram aceites pelo órgão de jurisdição, não teriam influência no resultado.
Fechado o ciclo das diretas, Passos Coelho vai agora preparar o XXXVI Congresso do partido, que se realiza entre 1 e 3 de abril, em Espinho.
Passos Coelho deve renovar as vice-presidências, havendo para já dois dirigentes que têm a recondução assegurada: Marco António Costa (Passos nunca descurou o controlo do aparelho) e Jorge Moreira da Silva (o homem em quem mais confia). Carlos Carreiras dificilmente sairá. De resto, dependerá das escolhas de Passos. O ex-líder da JSD, Pedro Duarte, é um dos nomes falados para a futura direção de Passos Coelho.