Mais de 80% do setor privado já não recebia duodécimos
Mais de 80% dos trabalhadores do setor privado já receberam os seus subsídios por inteiro neste ano. A percentagem foi confirmada ao DN por fonte oficial do Ministério do Trabalho, da Solidariedade de e da Segurança Social (MTSSS). O PCP, garante ter recebido do mesmo ministério a confirmação de que o número é ainda mais esmagador: da ordem dos 97%. Uma informação que o governo não quis confirmar ou desmentir. Ainda assim, o fim da opção pelos duodécimos no Orçamento do Estado para 2018 é criticada pelos representantes dos patrões, enquanto o setor do comércio antecipa ganhos no Natal do ano que vem. Os 97% de trabalhadores do setor privado que já terão optado, em 2017, pelos subsídios de férias e de Natal por inteiro, foram avançados ao DN pelo deputado João Almeida - o qual atribuiu a informação ao MTSS - quando questionado sobre a eventual impopularidade da decisão no setor.
"Temos precisamente os trabalhadores do nosso lado", disse ao DN. "Isto é apenas uma guerra que está a ser feita pelo PSD", acusou - referindo-se ao facto deste partido ter sido o único a votar contra alteração aprovada no parlamento. "97% dos trabalhadores do setor privado exigem o pagamento do subsídios nos momentos em que este são devidos", garantiu, acrescentando ainda que "mais de metade" dos que continuaram a receber estes valores diluídos nos vencimentos mensais só o fizeram "porque já não foram a tempo" de se opôr.
O PCP lembra ainda a situação dos aposentados e dos trabalhadores do Estado, para os quais não existia a opção de rejeitar os duodécimos, defendendo estar apenas em causa "voltar a aplicar as regras da legislação laboral".
"Nunca desistimos de voltar a aplicar as regras da legislação laboral, suspensas pelo governo anterior", lembrou. E não estávamos de acordo porque aquela possibilidade de pagamento dos subsídios em duodécimos tinha como verdadeiro objetivo acabar com os subsídios, diluindo os subsídios até ninguém se lembrar mais de que eles existiam. A prazo conduziria à sua extinção", acusou.
Com a entrada em vigor do OE 2018, só serão permitidos pagamentos fracionados "nos termos em que a legislação laboral permitir". Ou seja: nos casos em que existem acordos coletivos que o preveem.
Medida vai animar comércio
Menos dinheiro ao fim do mês, mais para as férias e para o Natal. E, com isso, novo fôlego para as empresas que mais apostam nesta quadra. Os duodécimos acabam em janeiro para o setor privado e, dizem os especialistas, haverá nova disponibilidade para a corrida aos presentes, que se perdeu nos últimos anos.
"O pagamento de duodécimos, ainda que fosse opcional para o setor privado, aumentava o ganho mensal, mas tinha a contrapartida de no Natal haver menos disponibilidade para gastar", adiantou ao Dinheiro Vivo Pedro Pimentel, diretor-geral da Centromarca - Associação Portuguesa das Empresas de Produtos de Marca que, desde a criação da opção de pagamento de um subsídio (50% do subsídio de férias e 50% do subsídio de Natal) diluído por 12 meses notava "algumas restrições no período do Natal", que pesavam no balanço das retalhistas que mais apostam nesta época.
"Notou-se uma quebra clara do consumo no Natal" com a diluição do 14º mês de salário, repete Mafalda Ferreira. A especialista em consumo no IPAM lembra que associada a uma nova lógica de consumo a que a crise também obrigou, a metade do subsídio que restava levou a uma redução do valor gasto em compras de Natal.
Os duodécimos nasceram em 2013, como forma de mitigar o "enorme aumento de impostos" de Vítor Gaspar. Nessa altura, um solteiro sem filhos que ganhava, em 2012, 1000 euros brutos via cair na conta 790 euros. Um ano depois, com o aumento dos escalões de IRS e a introdução da sobretaxa no valor de 3,5% passou a receber 745 euros líquidos. Eram menos 44,45 euros por mês que a escolha dos duodécimos ( à volta de 17 euros mensais) reduzia para 26 euros.
"É óbvio que em 2013 a quebra do consumo habitual dos portugueses teria sido muito maior se não tivessem sido os duodécimos", assume Pedro Pimentel, lembrando que, por esta via, o consumo privado não contraiu tanto quando se esperava.
Em janeiro, um trabalhador com salário mínimo que, há um ano tenha pedido duodécimos, vai receber menos 41 euros, mostra a Deloitte. Para um vencimento de 1000 euros são menos 64 euros por mês. Mas a mudança não deverá reverter o consumo, diz Mafalda Ferreira. "Poderá sentir-se alguma diferença, mas há mais confiança". Mesmo assim, haverá grande preocupação com o preço. "A compra em ambiente promocional vai manter-se, ao mesmo tempo que se abdica da qualidade em função da variável preço", acrescenta.
Também não haverá efeitos para as contas de Mário Centeno, diz Luís León. O fiscalista da Deloitte assume que do ponto de vista técnico, o fim da diluição dos subsídios não terá "impacto orçamental" nem pela via da despesa privada nem pela via dos impostos já que tem um efeito neutro. "A questão dos duodécimos não é quanto, porque o valor dos subsídios é sempre o mesmo, é quando", diz o especialista, assumindo que "tecnicamente não havia mal nenhum em haver uma opção para o privado", ainda que pudesse causar "alguma surpresa haver uma opção para o privado e não para o público". O especialista sublinha ainda que "a grande maioria dos trabalhadores não recebe em duodécimos".
Os patrões criticam a "carga administrativa" que os pagamentos condensados "em dois momentos" do ano vêm gerar à tesouraria das empresas. "Vem perturbar a vida das empresas na sua carga administrativa", disse ontem António Saraiva, presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP).