Maioria das barragens vai ficar sem segurança de vigilantes
A rede nacional de barragens está a ser alvo de uma reorganização do sistema de segurança que visa substituir, na maioria dos postos, a segurança humana por apenas vigilância eletrónica. O projeto é da EDP e deverá estar concluído até setembro deste ano.
Peritos em segurança manifestam apreensão, lembrando que há barragens classificadas como Infraestruturas Críticas Nacionais (ICN), grau atribuído a todas as infraestruturas de setores estratégicos cuja rutura, devido a causas naturais ou atentados, podem afetar o funcionamento de todo o país. A sabotagem de uma barragem que abastece de água ou eletricidade uma zona densamente povoada tem consequências catastróficas, devido à interdependência e interligação existentes. A EDP, entidade gestora, garante que "a segurança sairá reforçada".
Com esta restruturação, revelaram ao DN fontes que estão a acompanhar o processo, a empresa reduz "drasticamente" a despesa com a segurança destas infraestruturas, a qual atualmente é de cerca de 2,5 milhões de euros e, com a dispensa dos vigilantes, vai passar a ser menos de um milhão. A EDP não quis comentar os valores em causa.
Pela lei, os planos de segurança das infraestruturas críticas devem ser validados pelo Sistema de Segurança Interna (SSI), onde existe uma equipa especializada, com representantes da PSP, GNR e da Polícia Marítima, para coordenar a avaliação destes planos e as metodologias de segurança para serem emitidos os respetivos pareceres.
De acordo com o caderno de encargos do concurso lançado pela EDP para alterar os sistemas de segurança, estão incluídas cinco das nove barragens classificadas, segundo informação oficial da empresa. O mesmo porta-voz assegura, porém, que nestas "não está prevista alteração de qualquer tipo, muito menos em termos de segurança". Por isso, "não havendo alteração do plano de segurança, ele não poderia ser submetido a alguma autoridade para efeitos de parecer / validação".
Mas segundo o caderno de encargo estas cinco barragens fazem parte de um grupo de 13 (do total de 39) que vão ser "centrais agregadoras". Ou seja, explicam as mesmas fontes envolvidas no processo, "significa que vão manter o mesmo número de vigilantes que tinham, mas vão ter que vigiar também, por via eletrónica, todas as outras da mesma rede". Receiam que "a segurança fique fragilizada, tendo em conta a distância entre as barragens e a demora numa intervenção humana, caso seja necessária". Lembram ainda que "nem estão a ser exigidos às empresas concorrentes de segurança privada o equipamento que a lei exige para as infraestruturas críticas".
Sobre isto a EDP não respondeu, alegando que toda a rede sairá "com a segurança reforçada". Questionada sobre se vai ser aumentado o número de vigilantes nas "centrais agregadoras", entre as quais as que são ICN, refere que foi feito um estudo interno para analisar a "viabilidade do recurso de um sistema de televigilância para monitorização das centrais, sem alteração dos níveis de segurança existentes nessas centrais. Se tal processo decorrer de modo inteiramente satisfatório, será então avaliado o impacto no contrato de prestação de serviços de vigilância atualmente em vigor."
Confrontado com esta situação, o gabinete da secretária-geral do SSI, a procuradora-geral adjunta Helena Fazenda, sublinha que todas as infraestruturas classificadas como críticas "estão vinculadas" aos procedimentos previstos na lei: parecer da força de segurança territorialmente competente e validação da secretária-geral. Não comentam o plano da EDP.
O presidente do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo (OSCOT), António Nunes, mostra-se apreensivo com a intenção da EDP. "Uma sabotagem nestas infraestruturas, quer sejam centrais hídricas de produção de eletricidade, quer barragens de abastecimento de água, podem provocar incidentes de elevados custos sociais. A EDP não deveria poder, unilateralmente, numa atitude de economia de escala, tomar estas decisões sem o parecer de autoridades de segurança", sublinha. Salienta que " por regra devia sempre haver nestes pontos segurança humana e eletrónica, que se complementam. Toda a exceção teria que ser devidamente justificada".
Francisco Rodrigues, coronel da GNR na reserva e professor de mestrado de Segurança, acrescenta que "o elemento humano é indispensável para a realização de determinadas funções na fase de intervenção, na resposta a incidentes/acidentes, a ameaças ou riscos, ainda hoje não substituíveis por máquinas ou tecnologias". No seu entender, por isso, o plano de restruturação da EDP "não é a melhor solução".