Guterres "parecia um verdadeiro secretário-geral da ONU"

Política internacional e candidatura "exemplar" do ex-primeiro-ministro a secretário-geral da ONU dominaram reunião
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Se não foi previamente combinado, parecia. Desta vez, a seguir à intervenção inicial do Presidente da República, quem falou não foi, como é hábito, o primeiro-ministro. Foi antes o seu amigo de longa data António Guterres, que é membro do Conselho de Estado precisamente por convite de Marcelo Rebelo de Sousa.

A reunião - que agora o Presidente convoca numa base trimestral - decorreu entre as 15.00 e as 20.00. Agora, ao contrário do que acontecia com Cavaco Silva, já não se servem sandes aos conselheiros de Estado. É tudo corrido a água e café. E isso contribui para que os trabalhos sejam mais céleres.

António Guterres fez uma longa exposição panorâmica sobre a situação internacional. "Parecia um verdadeiro secretário-geral da ONU", disse um dos participantes - embora salientando que o ex-primeiro-ministro nunca referiu a sua qualidade de candidato a secretário-geral das Nações Unidas.

Revelou-se globalmente sombrio, fazendo um diagnóstico negro sobre, por exemplo, a forma como a UE está a "cavar a sua irrelevância" no contexto mundial. Disse também, quanto ao Médio Oriente, que o aumento das desigualdades e o aumento do desemprego jovem estão a constituir-se um importante fator de atração de muitos para o terrorismo. Recordou a "imprevisibilidade" associada a quatro atos eleitorais importantes nos próximos meses: EUA, França, Holanda e Alemanha.

Numa reunião à qual faltaram Mário Soares, Vasco Cordeiro (presidente do governo regional dos Açores) e Faria Costa (Provedor de Justiça), Guterres não falou da candidatura a secretário-geral da ONU, mas houve quem o fizesse por ele. Pinto Balsemão, Jorge Sampaio e Luís Marques Mendes criticaram a forma pouco transparente como à última hora surgiu a candidatura da búlgara Kristalina Georgieva.

O ex-líder do Bloco de Esquerda Francisco Louçã sublinhou por seu turno os problemas do Deutsche Bank, mas revelou-se confiante de que Angela Merkel acabará por intervir. Também desdramatizou as consequências do problema em Portugal.

No comunicado final da reunião, lê-se que "o Conselho de Estado analisou um dos desafios das próximas semanas - a eleição do novo secretário-geral das Nações Unidas". "O Conselho de Estado saúda o Eng.º António Guterres e regista com particular satisfação os resultados concludentes que a sua candidatura obteve neste primeiro ciclo de votações realizado nas Nações Unidas", lê-se na nota emitida, a qual também salienta o facto de esta "candidatura exemplar" ter "merecido desde o início o apoio empenhado de todos os órgãos de soberania nacionais e de todos os partidos políticos portugueses."

À espera do veto

O comunicado não refere o súbito surgimento da candidatura de Georgieva, mas salienta que um dos elementos que tornou a candidatura de Guterres como "exemplar" foi o facto de ter cumprido "com empenho todas as etapas do processo, nomeadamente as audições e debates, credibilizando, assim, os novos procedimentos estabelecidos pelo Conselho de Segurança, valorizando o estatuto das Nações Unidas e o papel da Assembleia Geral" da organização.

Houve pouca política interna na reunião. Ainda não foi ontem que o Presidente da República anunciou o que fará com o decreto do governo que permite ao fisco ter os saldos de todas as contas acima de 50 mil euros , para detetar eventuais diferenças entre riqueza real e riqueza declarada. Hoje terminará o prazo para o Presidente enviar o diploma para fiscalização prévia no Tribunal Constitucional. Se não for pelo TC, Marcelo deverá vetar politicamente o decreto (ou seja, dizer que discorda e devolvê-lo ao governo). Parece ser isto que pelo menos o executivo de António Costa espera, segundo declarou ontem a ministra da Presidência, Maria Manuel Leitão Marques. "Aguardaremos a devolução do diploma pelo senhor Presidente da República e as razões por ele invocadas para rever a nossa posição, sendo certo que as duas primeiras partes [acordo com os Estados Unidos e transposição de uma diretiva comunitária] terão de ser naturalmente regulamentadas com carácter de urgência, tendo em conta as obrigações internacionais do Estado português nessa matéria e também as consequências que adviriam da não regulamentação para os bancos portugueses", afirmou.

Ontem, no Facebook, uma deputada do PS, Isabel Moreira, disse que o decreto é formalmente inconstitucional porque as matérias de direitos, liberdades e garantias são da exclusiva reserva legislativa da Assembleia da República.

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