Erasmus: eles chegaram a Portugal por acaso e apaixonaram-se

Portugal é o 9.º país mais procurado pelos estudantes europeus para fazer Eramus. Vêm pelo bom tempo e custo de vida acessível, meses depois acabam rendidos. Veja o vídeo.
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Um mês depois de ter chegado a Portugal, Beatrice Tuinete ainda não se recompôs do choque cultural. E isso é uma coisa boa para a jovem romena natural de Bucareste, que procurava "diversidade cultural" na sua experiência Erasmus. Ainda a descobrir "a magia de Lisboa", Beatrice veio para Portugal, tal como outros alunos Erasmus com quem o DN falou, porque era um dos países com que a sua universidade tinha acordo. Não conheciam o país, muito menos a sua capital e aqui acabaram por aterrar no início do mês de setembro. Agora, confessam-se rendidos ao país que nos últimos anos recebeu mais de nove mil alunos estrangeiros nestes programas.

Fernando Llopis, que vem do país vizinho, até teve uma recomendação extra além da sua universidade: "Tenho um primo que viveu em Lisboa e disse-me que ia gostar muito. Aconselhou-me a vir para cá." Indicação que o madrileno seguiu e não se arrependeu. Pawel Pankowicz não é novato no programa Erasmus, mas da primeira vez resolveu ficar mais perto de casa. O polaco escolheu Sófia, na Bulgária, mas depois de "ver fotografias" de amigos que estudaram em Lisboa sabia que tinha de vir conhecer Portugal.

Ao contrário de erasmus anteriores, Kristýna Vlhová decidiu não vir para Lisboa. Está em Portalegre e é um dos 23 alunos deste programa de intercâmbio que o Politécnico local vai acolher neste ano vindos de oito países. A escolha, mais uma vez, ficou a dever-se aos laços entre as duas instituições de ensino superior (a de origem e a portuguesa), mas a jovem checa também ponderou outros fatores. "Gosto do calor, Portugal é um país pequeno e por isso mais fácil e barato para se viajar e conhecer."

Há um mês em Portugal, todos eles já tiveram oportunidade de conhecer alguns dos locais turísticos e, para já, a maior dificuldade é a língua, que todos já estão a aprender.

Com vontade de falar português

À exceção de Fernando, que frequenta Publicidade e Relações Públicas na Universidade Lusíada, todos os outros conseguiram inscrever-se em aulas de Inglês. Mas também as diferenças entre o castelhano e o português não são assim tantas: "O problema é que vocês falam muito rápido", diz o estudante de 21 anos, que apesar de ter tirado um curso de Português em Madrid admite que não domina ainda a língua de Camões.

Quem também começou mais cedo a aprender português foi Pawel. E de uma maneira muito em linha com a sua geração. "Descarreguei uma aplicação e comecei a aprender. Mas quando cheguei percebi que era português do Brasil e por isso acho que se calhar preciso de me inscrever num curso a sério." Como tem amigos portugueses, pensou seguir o conselho deles de "ver as notícias e ouvir algumas estações de rádio, mas ainda não sei nada de especial".

Pawel tem até janeiro - ou se tudo correr como ele deseja até junho, porque vai pedir para alargar a estada por um ano - para aprender o básico em português. Quem também espera conseguir manter uma conversa básica em português é Kristýna. "Estou a ter aulas de Português porque às vezes é impossível comunicar apenas em inglês, por isso tenho (e quero)de me adaptar e aprender o básico", adianta a estudante de enfermagem.

Beatrice, que na Roménia estuda Economia, Gestão e Marketing, acabou por vir frequentar a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e escolheu apenas disciplinas que fossem compatíveis com o seu curso e dadas em inglês. "Foi um trabalho árduo, mas consegui", sublinha de forma bem-humorada. O que não a impede de aprender português num curso rápido, à parte das cadeiras do currículo, e até tentar falar com os locais. "Eu respondo aquelas coisas simples como sim e não, mas as pessoas olham para mim e sorriem porque percebem logo pela pronúncia que sou estrangeira. Apesar de o português não ser muito diferente do romeno."

Até janeiro vai aprender inglês para os media, escrita criativa e literatura inglesa. Esta última "é como voltar ao liceu, onde tinha de ler e escrever muito". Mas a sua disciplina favorita é escrita criativa: "Porque sou blogger e gosto de escrever. Esta aula ajuda-me a estruturar os meus pensamentos e a pô-los no papel."

Apesar de ter poucas disciplinas, a universitária encontrou no ensino português duas grandes diferenças: os trabalhos de casa e a forma de estar na sala de aula. "Na Roménia só teria trabalhos para fazer em casa de tempos a tempos, aqui não passa uma semana sem ter de apresentar um trabalho, escrever um conto. É cansativo, mas no bom sentido."

Muito diferente da Roménia é também "a atmosfera das aulas". Ao contrário das expectativas de Beatrice, "os alunos aqui estão mais familiarizados com os professores. Não estou a exagerar, porque na Roménia é tudo muito sóbrio, oficial, e apenas alguns alunos falam com o professor" explica. Nada que choque a jovem de 21 anos. "Gosto mais da forma como as aulas estão organizadas aqui. Trabalhamos em grupo, o que nos obrigada a falar uns com os outros nas aulas e isso é uma coisa boa porque assim tive oportunidade de conhecer alunos portugueses, caso contrário seria só o elemento estranho que falaria com o professor de tempos a tempos." No fundo, para a jovem de Bucareste, "existe mais dinâmica".

Pawel - seguindo a experiência de conterrâneos que cá estiveram em anos anteriores - também escolheu disciplinas em inglês no curso de Marketing, no ISCTE. Aluno originalmente de Marketing e Comunicação, escolheu disciplinas em inglês, mas que "tivessem que ver com o meu curso, e acabam por ser também ligadas à gestão".

Um mês de descobertas

A maioria dos estudantes Erasmus chegam por um semestre e logo no início do mês de setembro. É o caso dos jovens com quem o DN falou. Beatrice foi a única que fez a viagem com os pais e a irmã mais nova. "Fizemos uma espécie de miniférias durante uma semana. Os meus pais quiseram vir deixar-me em segurança." Aproveitou para conhecer Cascais, Belém e Sintra com a família.

Quase os mesmos locais que Fernando e Pawel também visitaram. No entanto, eles resolveram ir mais longe e já foram à praia no Algarve. Mais distante da capital, Kristýna - que também não perdeu a oportunidade de conhecer "as espetaculares praias rochosas" de Lagos, com uma amiga eslovaca que, tal como ela, não tem praia no seu país - conhece já pontos menos turísticos: Marvão e Elvas, onde esteve "com os outros alunos Erasmus, numa viagem de dois dias para conhecer as cidades próximas de Portalegre."

Mas como fazer Erasmus é não só estudar fora do seu país mas também viajar, a aluna checa está já a planear visitar Lisboa e Madrid. Visitas fora de Lisboa também estão nos horizontes dos estudantes que vivem na capital portuguesa. Porto e Coimbra são os locais mais referidos como pontos de passagem. Fazem também parte das viagens organizadas pela ESN Lisboa (Erasmus Student Network, associação de apoio para os alunos Erasmus). "Levamo-los a conhecer o Porto, porque é a segunda cidade, e também Coimbra durante a semana da Queima das Fitas para eles terem a experiência da vida académica que não existe nos seus países", explica Inês Sá, da direção da associação.

Além das viagens, a associação ajuda os erasmus na sua integração e a conhecer a cultura e forma de estar dos portugueses: desde jantares em casas de fado, à participação no Carnaval de Torres Vedras ou a ações de voluntariado.

Para Beatrice: "A ESN ajudou--me a não me sentir estrangeira." Já Pawel faz parte da família ESN, sendo membro da associação na sua cidade natal e também da organização internacional. "Já conhecia alguns portugueses da associação e outros estudantes que agora estão cá a fazer Erasmus e fazem parte das ESN dos seus países". Daí que todos se juntem nestas associações.

Tanto que contam com ela até para passar o Natal em Portugal. Nenhum dos erasmus vai a casa nesse período de férias. "Vou ficar por cá, até porque vai ser um Natal muito internacional", antecipa o estudante polaco de 24 anos.

E a família? "De certeza que eles não se vão importar que fique aqui a criar memórias em vez de estar em casa", defende Beatrice. E apesar de falar com a família todos os dias via Skype, a estudante reconhece que um mês ainda não é tempo suficiente para ter saudades. "Vou ter tempo para ter saudades deles. Estou aqui há um mês e pronta para mais." E até aos amigos a jovem romena arranjou maneira de os substituir. "Sinto que os trouxe comigo, mas eles aqui têm outra cara."

Conhecedor de duas coisas e meia portuguesas, antes de chegar (Ronaldo, o fado e Nelly Furtado - "descobri que ela é canadiana, não é?"), Pawel espera ir a casa apenas para tratar dos papéis para ficar mais seis meses em Portugal. Conta com as duas irmãs mais velhas para fazer companhia aos pais enquanto está longe.

Fernando vai receber os pais no mês que vem e isso vai ajudá-lo a não sentir falta deles até ao fim do semestre. Apesar de aqui as coisas "se fazerem mais lentamente" do que em Madrid, o jovem espera mostrar aos pais tudo de Lisboa: "A Baixa Pombalina, o Marquês de Pombal, o Bairro Alto." Para quem foi obrigado a fazer Erasmus - "para ter uma carreira bilingue somos obrigados a ir para fora" -, Fernando é o espelho de que há obrigações que se cumprem com muita alegria.

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