Défice parecia controlado antes da bomba Banif
No final de novembro, era a calma antes da tempestade. O desvio no défice público global face ao orçamentado para 2015 estava apenas em 136 milhões de euros. Nesta altura, ainda não se sabia dos "desvios bastante disseminados" na receita e na despesa, que levaram o governo PS a avançar com um plano de contenção orçamental extra. E ainda faltava o pior: resolver o Banif.
Isto é, aquele valor, que decorre de cálculos feitos com base na execução orçamental relativa a novembro ontem divulgada pela Direção-Geral do Orçamento (DGO) para os primeiros 11 meses do ano, mostra que no final desse mês a situação das contas ainda não era de descalabro, apesar de já se saber que o governo tinha consumido quase toda a dotação provisional para pagar despesas com pessoal.
No dia 10 deste mês, o governo avançou com o tal minipacote de austeridade para trazer o défice para perto, mas abaixo de 3%, e cumprir o pacto de estabilidade. Mas disse logo que a meta de 2,7% prometida pelo executivo anterior era para esquecer.
Nesta altura, o desvio apurado internamente pelas Finanças já seria preocupante. Começaram a falar numa "margem de incerteza", que se materializou. Caiu uma bomba chamada Banif, que só em dezembro faz subir a despesa em 2255 milhões (1,3% do PIB).
De acordo com o boletim da DGO, e fazendo a anualização para 2015 do que foi gasto e recebido até novembro, fica claro que há um desvio enorme na receita total, mas que a despesa quase compensa.
A receita de novembro anualizada está 2,7 mil milhões abaixo do que era suposto (no OE 2015), sobretudo por causa do colapso no IRS (menos 984 milhões em impostos indiretos) e nas contribuições (menos 630 milhões). O desvio na despesa é favorável às metas: os gastos totais até novembro (anualizados) ficam quase 2,6 mil milhões abaixo do previsto.
Contas feitas, o défice em contabilidade pública estava com um desvio negativo na ordem dos 136,5 milhões. Não era muito, quando o défice final anual previsto no OE é de 5093 milhões.
Já o desvio encontrado pelos socialistas (face aos 2,7%) deve andar na ordem dos 800 milhões de euros (colocando o défice em 3,1%). Mas a equipa de António Costa, constrangida pela falta de tempo e de soluções, lutaria apenas por uma correção pequena, na ordem dos 200 ou 300 milhões. O suficiente para respeitar os míticos 3%.
Os números da execução orçamental ontem divulgados deixam perceber que o problema, mesmo sem Banif, é que dezembro trará surpresas más e grandes. O desvio na receita deve aumentar e haverá gastos inesperados.
Em termos comparáveis (entre novembro de 2014 e igual mês de 2015), a DGO diz que o défice global recuou 1736,3 milhões de euros devido ao "efeito combinado da diminuição da despesa e do aumento, em menor proporção, da receita".
"A receita total aumentou 0,6%, em termos homólogos, para o qual contribuiu o aumento da receita fiscal [5,2%] parcialmente anulado pela evolução negativa das restantes componentes da receita" e a despesa desceu 1,9% com a redução no valor dos subsídios à formação profissional, nos gastos com pessoal, com prestações de desemprego e com juros.
Ontem também, o INE apurou o défice público em contas nacionais até setembro (terceiro trimestre). Foi 3,6%, ainda acima do teto do pacto europeu.
Revelou ainda que a taxa de poupança das famílias voltou a cair, tendo-se fixado em 4%. Para encontrar um valor mais baixo é necessário recuar ao 1.º trimestre de 1999.