Catarina Martins quer referendo à UE se houver sanções contra Portugal
Bloco pode avançar com proposta de consulta popular se o Governo não "tomar posição contra a chantagem" da Comissão Europeia
Está feito o aviso. Catarina Martins fez este domingo depender uma proposta de referendo à permanência de Portugal na União Europeia (UE) da eventual aplicação de sanções contra Portugal por incumprimento da meta do défice de 2015. E pressionou o Governo de António Costa a dar uma resposta veemente no próximo Conselho Europeu - uma "posição contra a chantagem, disse -, sob pena de avançar para a consulta popular.
No encerramento da X Convenção, e perante o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Pedro Nuno Santos, e a secretária-geral adjunta do PS, Ana Catarina Mendes, a agora única coordenadora do Bloco de Esquerda (BE) foi cristalina ao dizer que Bruxelas não nos "continuará a pisar": "Se tomar uma iniciativa gravíssima de provocar Portugal, a Comissão [Europeia] declara guerra a Portugal. Pior ainda: se aplicar sanções e as usar para pressionar o Orçamento [do Estado] para 2017 com mais impostos, declara guerra a Portugal. E Portugal só pode responder recusando as sanções e anunciando que haverá um referendo nacional."
"Se o Reino Unido quer sair, deve sair. O precedente está aberto. Outros países poderão decidir por referendo o que fazer na União Europeia", atirou a líder bloquista no pavilhão do Casal Vistoso, em Lisboa. Em Portugal, sublinhou, "virá o dia de decidir". "Não metemos nunca nenhum direito democrático em nenhuma gaveta. Virá o dia de decidir e virá breve", vaticinou.
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Na intervenção, sempre com um olho em Bruxelas e outro no OE do próximo ano, Catarina Martins não poupou críticas a socialistas como o presidente francês, François Hollande, o comissário europeu para os Assuntos Económicos e Financeiros, Pierre Moscovici, ou o presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, e considerou ainda que a atual Europa "é uma corrida para o fundo" e uma "enorme e tristíssima mentira".
"Na esquerda, rejeitamos a corrida para o fundo", acrescentou - para vincar que o Bloco recusa a submissão aos ditames de Angela Merkel, Wolfgang Schäuble (chanceler alemã e o seu ministro das Finanças) e Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia. "Não obedecemos a quem não respeita os povos", completou a coordenadora do Bloco.
Logo depois, e ainda num ambiente de apoteose que se instalou entre os delegados à reunião magna, Catarina anunciou a disponibilidade do seu partido para juntar "os amigos das esquerdas europeias para que num prazo unânime" se reúnam numa "assembleia das alternativas". "Pode ser em Lisboa, Madrid ou Barcelona, mas o Bloco está disposto a ser o anfitrião", esclareceu.
Descongelamento das pensões mais baixas e do IAS
No plano interno, Catarina anunciou duas das bandeiras do Bloco para o próximo OE: um aumento real das pensões e o descongelamento do indexante de apoios sociais (IAS).
Se o aumento do salário mínimo nacional para 557 euros e o aumento do número de escalões de IRS (para conferir àquele imposto maior progressividade) são matérias de acordo e terão de entrar em vigor, Catarina salientou então um "terceiro compromisso".
"O aumento das pensões está indexado à inflação e ao PIB [produto interno bruto]. Em tempos de crise, como o atual, essa fórmula de cálculo faz com que o descongelamento só signifique poucos cêntimos por mês, mesmo em relação às pensões mais baixas", apontou a coordenadora bloquista, prosseguindo com um aviso ao Governo do PS: "É preciso fazer mais. É necessário que se consiga um aumento real das pensões, sobretudo das que são tão baixas e não chegam a pagar IRS", frisou, tal como tinha adiantado nas páginas do DN de sexta-feira.
Já quando ao IAS, valor que serve como referência para a generalidade das prestações sociais, Catarina recordou que está congelado desde 2009, lamentando, por isso, que "quem tem menos recebe cada vez menos". E como o BE quer reforçar os apoios à infância, aos idosos e aos desempregados, juntou ao caderno de encargos a apresentar a António Costa: "Descongelar o IAS é um passo essencial de decência por que nos bateremos no OE de 2017."
Antes disso, Catarina fez uma breve passagem por um tema que dividia as moções apreciadas na Convenção: as autárquicas do próximo ano. Reiterando o princípio da moção A (de que era primeira subscritora) que "em cada local" serão procuradas "convergências políticas amplas", não deixou Jerónimo de Sousa e António Costa, sem resposta.
Recordando que o secretário-geral do PCP afirmou, "com graça", que "não há pacto e não há agressão" entre os partidos da "geringonça" na corrida ao poder local - tese que o primeiro-ministro reiterou -, Catarina respondeu que é verdade mas que a "força que o Bloco tiver será a sua força para responder à vida das pessoas".