Hernâni Dias, ex-secretário de Estado
Hernâni Dias, ex-secretário de Estado TIAGO PETINGA/LUSA

Técnica da Entidade para a Transparência queixou-se de ser pressionada por Hernâni Dias. Ex-governante nega

Presidente da Entidade para a Transparência disse que uma funcionária se queixou de ter sido pressionada pelo ex-secretário de Estado, que nega as acusações.
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A presidente da Entidade para a Transparência afirmou esta terça-feira que uma funcionária se queixou de ter sido pressionada pelo ex-secretário de Estado Hernâni Dias e considerou inverosímil que o ex-governante tenha contactado o organismo antes de criar uma imobiliária.

Antecipando que, na audição que está a realizar-se atualmente no parlamento, Hernâni Dias pudesse indicar que a técnica superior que analisava a sua declaração única foi substituída, procurando "estabelecer uma relação causa e efeito" com o facto de ter anteriormente alegado que ela lhe tinha dado o aval para constituir as imobiliárias, Ana Raquel Moniz salientou que foi ela própria, em conjunto com o vogal Pedro Nunes, que optou pela substituição.

Em causa, segundo disse, está o facto de a técnica superior em questão ter revelado que se "estava a sentir pressionada" por Hernâni Dias e que, inclusivamente, tinha deixado de lhe atender as chamadas telefónicas.

"Achei que não atender um titular não é o mais adequado para cumprir o princípio da colaboração e, portanto, não havia condições para que pudesse haver uma continuação da análise do processo por esta trabalhadora e o processo foi atribuído a outro trabalhador", disse.

Após esta intervenção, o deputado do PS André Rijo manifestou preocupação com o facto de "a atuação de um membro do Governo da República ter proporcionado um sentimento de pressão" a uma funcionária da EtP, perguntando a Ana Raquel Moniz se essa pressão foi no sentido de procurar que a técnica alterasse o seu entendimento relativamente à declaração.

Na resposta, a presidente da EtP negou que fosse esse o objetivo, referindo que a funcionária considerava-se apenas "pressionada pelo conjunto de tentativas de contacto", disse.

Numa audição na comissão parlamentar de Poder Local, requerida pelo Chega, Ana Raquel Moniz considerou "altamente improvável" a versão de Hernâni Dias, segundo a qual terá recebido o aval, por contacto telefónico, da Entidade para a Transparência (EtP) para criar duas empresas imobiliárias.

Ana Raquel Moniz salientou que Hernâni Dias constituiu a primeira sociedade imobiliária em 28 de outubro de 2024 e a técnica superior da EtP encarregada de verificar a declaração única do ex-secretário de Estado só foi atribuída no dia 11 de novembro.

"Quer dizer que, até esse momento, o titular não sabe qual é a técnica superior que lhe vai fazer as verificações. Portanto, antes de 28 de outubro, era impossível, era altamente improvável que o ex-secretário de Estado conseguisse saber quem era a técnica superior que iria fazer a sua verificação para lhe poder perguntar se poderia ou não constituir as sociedades", disse.

Depois de ser criticada pelos deputados do PSD Carlos Silva e do CDS-PP João Almeida por não ser rigorosa nem poder utilizar palavras como "altamente improvável" em casos desta importância, Ana Raquel Moniz defendeu que "é impossível provar o que não aconteceu" e "quem tem de provar é quem diz que aconteceu", numa alusão a Hernâni Dias.

"O que eu procurei demonstrar é que é inverosímil que tenha acontecido um contacto de um titular com uma pessoa relativamente à qual não poderia saber que estava a fiscalizar a sua declaração única", disse.

Sobre se houve ou não contactos telefónicos entre Hernâni Dias e a EtP, Ana Raquel Moniz confirmou que existiram, mas "o que não se confirma é o teor das informações" que são invocadas pelo ex-secretário de Estado, designadamente que lhe foi dado o aval para constituir as empresas imobiliárias, reiterando ainda que a EtP nunca emitiu qualquer parecer sobre esse caso.

Questionada pelos deputados sobre se um telefonema com técnicos da EtP pode ter caráter vinculativo, Ana Raquel Moniz respondeu que "informações telefónicas não vinculam" e "as informações escritas, segundo o Código do Procedimento Administrativo, também não são vinculativas, mas são suscetíveis de fazer incorrer a entidade em responsabilidade civil".

"Mas há uma questão de princípio de boa-fé", defendeu.

Hernâni Dias, ex-secretário de Estado
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O ex-secretário de Estado Hernâni Dias negou qualquer pressão sobre a técnica superior da Entidade para a Transparência com a qual contactava numa "relação enorme de confiança".

"Não senti ali nenhuma mal-estar da senhora relativamente ao meu contacto, nem pouco mais ou menos. Mas posso dizer-vos inclusivamente que a relação que mantínhamos era muito cordial, de uma pessoa extremamente solícita no fornecimento das informações", disse.

Hernâni Dias afirmou que sempre esteve "de boa-fé neste processo" e que lhe pareceu que "esta técnica jurista estava igualmente de boa-fé" nas respostas às informações que foi solicitando.

"Não havia aqui nenhuma tentativa de esconder o que quer que fosse, porque não havia necessidade nenhuma disso (...). Tanto mais, que eu já o repeti, já o disse e repito, nenhuma destas sociedades que foi constituída, tinha - não tinha, não tem hoje, e posso garantir que não terá no futuro - qualquer negócio feito que tenha a ver com a lei dos solos", considerou.

O ex-governante sublinhou que a primeira empresa foi declarada logo após a sua constituição, e que a segunda não o foi logo porque ele próprio entendeu "que, não estando diretamente envolvido nesta segunda sociedade, uma vez que quem fazia parte era a primeira empresa", que lhe pertencia, "não seria obrigado" a declará-la.

Mesmo assim, enviou um email à EpT em 06 de janeiro, no qual questionava sobre a necessidade de declarar a segunda imobiliária, mas "até hoje" não obteve resposta.

"Também não sei se agora vale a pena ter. Já declarei as duas sociedades, efetivamente, nas declarações onde eu tinha já de as colocar. Vou agora declarar também na declaração como deputado, uma vez que retomei a função no dia 01 de março", disse.

Hernâni Dias destacou que "a partir de hoje, não haverá nenhuma documentação, nenhuma informação que pedirá à EpT que não seja por escrito".

O ex-governante afirmou ainda que, após a audição de 04 de fevereiro no parlamento, em que afirmou ter estabelecido contacto com a EpT por causa das empresas, não voltou a contactar com a mesma técnica, uma vez que lhe foi atribuído outro contacto dentro da Entidade para acompanhar as suas declarações daí para a frente.

O ex-governante reafirmou ter consultado por telefone a Entidade para a Transparência sobre o caso da criação de empresas imobiliárias enquanto era governante.

Em resposta à deputada do BE Joana Mortágua, o ex-governante afirmou que nunca disse ter "um parecer" da EpT, porque os contactos que manteve foram telefónicos com a técnica que estava a acompanhar os seus processos de declarações obrigatórios na entidade.

"Em momento algum me ouviu dizer que eu tinha um parecer. Eu disse que contactei a EpT, foi exatamente nesses termos. E não tenho culpa absolutamente nenhuma que os órgãos de comunicação social deturpem aquilo que foi aqui dito na audição do dia 04 de fevereiro e que depois inquinem aquilo que é a interpretação e as respostas que são dadas pelas várias entidades", declarou, numa audição na Comissão parlamentar do Poder Local, pedida pelo BE.

Em janeiro, a RTP noticiou que Hernâni Dias criou duas empresas que podem vir a beneficiar com a nova lei dos solos, sendo que na altura era secretário de Estado do Ministério que tutela essas alterações.

O mesmo canal de televisão tinha revelado que Hernâni Dias estava a ser investigado pela Procuradoria Europeia e era suspeito de ter recebido contrapartidas quando foi autarca de Bragança.

Posteriormente, num comunicado enviado à agência Lusa, Hernâni Dias recusou ter cometido qualquer ilegalidade, afirmando que está "de consciência absolutamente tranquila" e que agiu "com total transparência".

O primeiro-ministro aceitou no dia 28 de janeiro o pedido de demissão do agora ex-secretário de Estado que, na qualidade de cidadão, prestou esclarecimentos no parlamento em 04 de fevereiro.

Nessa audição, Hernâni Dias afirmou ter contactado com a EpT para perceber se a sua posição como governante permitia a criação da empresa.

O organismo respondeu afirmativamente, disse, explicando apenas que Hernâni Dias não poderia ter a maioria do capital social da empresa, nem ser sócio-gerente, duas condições que não abrangiam a sua posição nas empresas.

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