Luís Montenegro fala dos incêndios.
Luís Montenegro fala dos incêndios.FOTO: LEONARDO NEGRÃO

"Inimigo enorme" do Governo e acusações de incompetência. Debate acaba com "bombeiros ridicularizados" e Gaza

O primeiro-ministro foi esta quarta-feira ouvido pelos partidos, depois das propostas do Chega e do PCP terem sido aceites. Livre apelou a que Montenegro não entrasse na "chicana política".
Publicado a
Atualizado a

Gaza, "bombeiros ridicularizados" e apelos a que Montenegro se afaste da "chicana política"

Uma troca de argumentos entre o líder do Chega e a líder do BE acabou por afastar o debate do seu propósito inicial. Enquanto Mariana Mortágua − tal como o tinha feito Hugo Soares − referiu "o raminho" que André Ventura utilizou num vídeo nas redes sociais para "fingir" que tinha andado a apagar incêndios, o líder do Chega retorquiu com: "A senhora deputada vai duas semanas para Gaza fingir que vai fazer alguma coisa."

"O BE quer falar sobre Gaza e não sobre os incêndios em Portugal", acusou o líder do Chega, enquanto lembrava as palavras de Mortágua sobre "a fome e a miséria em Gaza".

Com uma referência, entre outras corporações, aos "bombeiros do Fundão" e "da Covilhã", André Ventura afirmou que, "se tiver que escolher entre os que vivem em Gaza" e os seus, escolherá sempre os últimos.

"Vá como está sempre", desafiou em tom retórico o líder do Chega,

acrescentando, a Mariana Mortágua, que "vá como uma mulher livre que é e vai ver que não vão gostar de si", numa referência ao Hamas, que, afirmou, é um governo que "não defende ninguém, nem minorias, nem LGBT, nem mulheres".

Por seu turno, antes destas acusações, a líder bloquista afirmara que "há uma diferença entre ajudar os bombeiros e ridicularizar os bombeiros", acusando André Ventura de ter "gozado" com os bombeiros quando fez o vídeo.

"E não é a primeira vez que goza com os bombeiros", lembrou a deputada única do BE, recordando o momento, em novembro do ano passado, quando o Chega colocou sem autorização uma tarjas no gabinete dos então 50 deputados, como protesto contra o fim do corte de cinco por cento no salário dos políticos, que vigorava desde a intervenção da troika.

No final, Mariana Mortágua questionou se a comissão parlamentar de inquérito sobre os incêndios será "séria ou oportunismo político".

A intervenção final coube ao primeiro-ministro que começou por assinalar que este debate exige "capacidade de podermos olhar para trás e escrutinar aquilo que foi feito e aquilo que não foi feito e olharmos para frente".

Depois de dissecar o Plano de Intervenção para as Florestas, que foi apresentado pelo Governo a 21 de março − "muito antes das ocorrências", lembrou −, o primeiro-ministro defletiu as críticas que acusavam o Governo de ter estado "ausente" e ter acordado "tarde para este problema".

"Posso ter contribuído para essa perceção, mas é injusta", afirmou.

Para sustentar esta consideração, Luís Montenegro apresentou uma "cronologia" dos eventos relacionados com os incêndios, que começou a "22 de julho", segundo o primeiro-ministro, com uma reunião com o "Conselho Coordenador da AGIF", a Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais.

Depois, a "29 de julho", nos "primeiros dias de maior severidade meteorológica", Montenegro lembrou a sua ida à sede da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil, junto com a ministra da Administração Interna.
Recordando que houve um "Conselho de Ministro de 7 de agosto", o primeiro-ministro recuperou as 45 medidas tomadas pelo Governo para responder aos incêndios.

"Fizemos aquilo que nos competia", frisou, enquanto acrescentava: "Não vestimos casacos da proteção civil, quisemos respeitar a prioridade que demos ao trabalho operacional."

"Demos cumprimento a uma estratégia que visava proteger o património e as pessoas", concluiu.

Líder do PS classifica ação do Governo como insensível e com "falta de humildade"

O líder do PS, depois de um momento inicial em que hesitou dar o sinal para a sua intervenção a José Pedro Aguiar-Branco, lembrou a Luís Montenegro que o primeiro-ministro tem direito a "férias, mas para a população portuguesa foi incompreensível" não ter adiado a Festa do Pontal, a rentrée do PSD, no Algarve, numa altura em que já tinham começado os incêndios florestais.

José Luís Carneiro lembrou que já esteve no Parlamento a prestar contas, na qualidade de ministro da Administração Interna, e que por isso compreendia, mas não deixou de assinalar a ausência do ministro da Agricultura no debate.

Vincando que, pelo PS, "este debate não teria ocorrido", porque ainda não era o momento de fazer esta avaliação, José Luís Carneiro lembrou que Montenegro quis que "o debate se realizasse hoje [quarta-feira, 27 de agosto]".

Foi com esta ideia em mente que o líder socialista falou em "insensibilidade" do primeiro-ministro, não só pelo Pontal mas na forma como geriu a prevenção e por ter decapitado "várias estruturas intermédias [na Proteção Civil] por razões partidárias".

José Luís Carneiro referiu "menos de 4 mil ações de fiscalização" preventivas de limpeza para continuar a acusar o primeiro-ministro de falta de sensibilidade.

O líder do PS assinalou também a "falta de humildade" de Montenegro por não ter ouvido a "proposta que" José Luís Carneiro lhe fizera "no dia 1 de agosto, para ativar o Mecanismo Europeu de Proteção Civil".

Depois, veio a acusação de "incompetência", por "o responsável desta pasta", da Administração Interna, não ter estado "sempre com a Proteção Civil e a Guarda Nacional Republicana".

"Finalmente, no combate foi patente o recuou nos reacendimentos", destacou José Luís Carneiro, lembrando que o "ICNF [Instituto de Conservação da Natureza] diz que estão nos 9%", quando tinham sido 4%.

"Ausente, incapaz e frágil na resposta", disse o líder socialista sobre o Governo, lembrando que esteve "presente nos momentos mais difíceis e críticos da comunidade portuguesa na Venezuela", nas "Caraíbas, no furacão Irma", tal como o Estado esteva "presente junto dos portugueses nas horas mais difíceis".

"Queira assumir connosco este pacto, senhor primeiro–ministro, para garantir que a operação dos meios aéreos será garantida pela Força Aérea", lançou José Luís Carneiro a Montenegro no final da sua intervenção.

Já depois do microfone estar desligado, que é algo que acontece de forma programada com todos os intervenientes, José Luís Carneiro continuou a falar, apesar dos pedidos reiterados do presidente da Assembleia da República para que terminasse a sua intervenção.

A insistência de José Luís Carneiro motivou críticas do líder parlamentar do PSD, Hugo Soares, e do líder do Chega, André Ventura, que acusou o deputado do PS de "querer mandar" no Parlamento.

Rui Tavares apela a "diálogo sincero" do Governo

O coporta-voz do Livre Rui Tavares começou por apresentar ao hemiciclo a ideia de que "amamos todos o nosso país e o nosso território" e que "a metáfora da guerra leva o primeiro-ministro a falar de inimigo", que neste caso é o fogo, motivo pelo qual "devemos garantir que este não é um debate ciclo", até porque, a seguir, lembrou, "vamos discutir seca, e a seguir inundações".

"Foi preciso chegar à situação em que estamos para que diga que quer um plano a 25 anos. Vamos perceber essa vontade de diálogo percebendo onde ela pára”, desafiou o deputado do Livre, deixando várias perguntas ao Governo: "Quer discutir a sério a profissionalização dos bombeiros? Mais meios e mais urgência para o cadastro florestal? Vamos finalmente à resposta do Estado?"

Rui Tavares, com estes argumentos, disse querer saber se, por parte do Governo, "o apelo ao diálogo é sincero".

Mariana Leitão atribui "calculismo político" ao Governo no combate aos incêndios

A líder da IL, Mariana Leitão, acusou o Governo de ter falhado com três “negligências”, justificando esta acusação com três argumentos: “A de nada fazer, que não introduz reformas na proteção civil e no governo da floresta; A de apenas reagir, que aposta tudo no combate a fogos cada vez mais difíceis, sem fazer antes o trabalho de prevenção; E a do calculismo político, que quando já era tarde, adiou o recurso aos meios de combate que mais precisamos para não assumir que o país vivia uma situação de calamidade.” 

Com a ideia de que a "legislação da floresta está um caos" e "precisa de ser simplificada e consolidada", Mariana Leitão deixou uma mensagem ao primeiro-ministro: "Se ainda está à espera de outro relatório [numa alusão a medidas da IL que não foram aprovadas] para lhe dizer isso, então o problema não é da floresta, é da sua falta de decisão."

CDS diz que Montenegro está no Parlamento porque quer

O deputado do CDS João Almeida começou por defender que "os políticos têm de ter respostas", estendendo esta ideia ao facto do primeiro-ministro, junto com todo o Governo, independentemente de "ter estado ou não" noutro eventos, "houve conselhos de ministros" e "tomou medidas para o que estava a acontecer".

"Algum primeiro-ministro do PS veio a este parlamento debater a questão dos incêndios", perguntou de forma retórica.

Com esta ideia, o deputado centrista, defendeu que Luís Montenegro está no Parlamento a responder "porque quis estar".

"Não há nenhum direito potestativo", disse a André Ventura, acusando a bancada do Chega de ter feito apenas "o que outros grupos parlamentares fizeram no passado".

Assegurando que "é mentira o que está a ser dito da área ardida", João Almeida disse que "as ocorrências aumentaram 60%", enquanto "os despachos de meios aumentaram acima de 100%".

Mariana Mortágua acusa o Governo não ter preparado "a época dos incêndios"

A coordenadora do Bloco de Esquerda afirmou que "em 45 medidas [anunciadas pelo Governo], zero para os bombeiros", lembrando perguntas que atribuiu a bombeiros que lhas dirigiram.

Mariana Mortágua referiu ainda "um raminho" que foi utilizado por André Ventura num vídeo do Chega para "apagar um incêndio", acabando por se referir à "seriedade com que cada um enfrenta os incêndios".

Continuando a recuperar perguntas que disse que os bombeiros lhe fizeram, a líder bloquista disse que "o Governo não preparou a época dos incêndios".

Elencando vários meios que disse não estarem ativos quando era necessário que estivessem, como "detetores de fumo e mecanismo de videovigilância", Mariana Mortágua ironizou que o Governo considerou "sensato desviar 120 milhões da gestão da floresta".

"Com bombeiros sem saber para onde vão", com "floresta ocupada por eucaliptos" e "meios aéreos avariados", o "Governo acha sensato adiar o Mecanismo Europeu".

JPP diz que a confiança dos portugueses no Estado "está a arder"

“Não é só o País que está a arder, é a confiança dos portugueses no Estado”, afirmou o deputado único do JPP, Filipe Sousa, enquanto acusava o Governo de ter "relaxado" e de ter chegado tarde demais.

Filipe Sousa fez estas afirmações depois de ter lembrado que desde o Governo liderado por Durão Barroso, em 2003, já havia medidas para combater incêndios.

André Ventura acusa o Governo de "incompetência"

"Felizmente não se esqueceu dos bombeiros", ironizou o líder do Chega sobre a intervenção do primeiro-ministro, antes de atacar o Governo por Portugal não ter no terreno nenhum avião Canadair enquanto, sublinhou, a Grécia, com menor população, ter 17.

"Incompetência", disse o líder do Chega para classificar a ação do Governo.

"Não vale a pena ir ao Pontal falar de Fórmula 1, quando perdemos o mais útil, que é a vida das pessoas", criticou André Ventura.

"Não há evidências de que o estado falhou", questionou André Ventura de forma retórica, aludindo a declarações do líder parlamentar do PSD, Hugo Soares, acabando por afirma que "a senhora ministra da Administração Interna falhou".

"Faltou coordenação", acusa Paulo Raimundo, enquanto desafia o Governo a alocar 3,5% do PIB para apoiar mundo rural

Depois de uma "palavra de solidariedade às vítimas dos incêndios", o líder do PCP, Paulo Raimundo disse ao primeiro-ministro que a calamidade dos incêndios foi evidente "para toda a gente", que, "ao contrário do seu governo não pôde acordar tarde".

Depois, assinalou que "escassearam meios, faltou a coordenação, gente indignada", que "viu em muitos casos os fogos consumirem os bens".

"Não é possível erradicar os incêndios, mas tem de ser possível minimizar o drama", considerou o líder comunista, reforçando a ideia de que "o Governo tinha tudo planeado", mas "no fim o que houve foi mais incêndios".

"Faltou coordenação", vincou, enquanto desafiou o Governo a alocar 3,5% do PIB − numa crítica ao valor de investimento em Defesa − para proteger o mundo rural.

"A força do inimigo foi enorme", justificou o primeiro-ministro

A primeira palavra de Luís Montenegro foi de "pesar" para as vítimas dos incêndios, mas afirmou que o governo esteve "antes, durante e depois de cada ocorrência", garantindo que houve "apoio rápido às pessoas e empresas mais afetadas".

A lista que o primeiro-ministro trouxe preparada incluía um reforço do "problema dos sapadores florestais", "um aumento adicional para  as brigadas" e a criação de "mais de 50 operações integradas de paisagem quando só existiam 12", considerou.

"Fizemos o controlo do fogo e autorizámos queimadas em 3562 hectares", acrescentou, antes de dizer que "estes são alguns dos exemplos do muitos que temos".

"Podemos e devemos avaliar a eficácia destas" medidas, afirmou,

"A força do inimigo foi enorme", disse, acrescentando que houve "mais de 25 dias ininterruptos de severidade meteorológica enorme".

"Apesar das taxas de intervenção inicial ser superior a 93%, não conseguimos evitar grandes incêndios", avaliou.

Aguiar-Branco convicto de que AR encontrará soluções para responder a quem "sofre" com incêndios

O presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco, começou por lembrar que este debate será a "primeira reunião depois dos incêndios das últimas semanas" e deixou uma palavra de "sentidas condolências às famílias das vítimas" e "reconhecimento aos bombeiros" e todos os agentes.

Depois, disse ter "convicção de que no Parlamento serão encontradas as soluções" para responder a quem sofre.

Primeiro-ministro pronto para ser "escrutinado"

Luís Montenegro, há uma semana, enquanto era questionado sobre se se arrependia de não ter acionado mais cedo o Mecanismo Europeu de Proteção Civil, garantiu que "os critérios técnicos e operacionais" foram seguidos.

"Verificaremos no final se isso teve o enquadramento devido — a minha expectativa é que sim —, mas nós seremos escrutinados como é normal numa democracia", prometeu.

Esta quarta-feira, por proposta do Chega e do PCP, lançada há uma semana, que foi aceite com unanimidade parlamentar, o primeiro-ministro responderá aos partidos, numa sessão que contará com a presença da ministra da Administração Interna, Maria Lúcia Amaral.

Entretanto, Chega e Bloco de Esquerda também já propuseram uma comissão parlamentar de inquérito sobre os incêndios, que, caso não seja aceite por uma maioria parlamentar do PSD e do PS, será forçada pelo partido liderado por André Ventura.

Luís Montenegro fala dos incêndios.
Montenegro dá explicações aos deputados com a CPI à espreita
Luís Montenegro fala dos incêndios.
Gestão de meios e incentivos de fixação no interior são temas que peritos querem ver discutidos na AR

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt