Uma troca de argumentos entre o líder do Chega e a líder do BE acabou por afastar o debate do seu propósito inicial. Enquanto Mariana Mortágua − tal como o tinha feito Hugo Soares − referiu "o raminho" que André Ventura utilizou num vídeo nas redes sociais para "fingir" que tinha andado a apagar incêndios, o líder do Chega retorquiu com: "A senhora deputada vai duas semanas para Gaza fingir que vai fazer alguma coisa.""O BE quer falar sobre Gaza e não sobre os incêndios em Portugal", acusou o líder do Chega, enquanto lembrava as palavras de Mortágua sobre "a fome e a miséria em Gaza".Com uma referência, entre outras corporações, aos "bombeiros do Fundão" e "da Covilhã", André Ventura afirmou que, "se tiver que escolher entre os que vivem em Gaza" e os seus, escolherá sempre os últimos."Vá como está sempre", desafiou em tom retórico o líder do Chega, acrescentando, a Mariana Mortágua, que "vá como uma mulher livre que é e vai ver que não vão gostar de si", numa referência ao Hamas, que, afirmou, é um governo que "não defende ninguém, nem minorias, nem LGBT, nem mulheres".Por seu turno, antes destas acusações, a líder bloquista afirmara que "há uma diferença entre ajudar os bombeiros e ridicularizar os bombeiros", acusando André Ventura de ter "gozado" com os bombeiros quando fez o vídeo."E não é a primeira vez que goza com os bombeiros", lembrou a deputada única do BE, recordando o momento, em novembro do ano passado, quando o Chega colocou sem autorização uma tarjas no gabinete dos então 50 deputados, como protesto contra o fim do corte de cinco por cento no salário dos políticos, que vigorava desde a intervenção da troika. No final, Mariana Mortágua questionou se a comissão parlamentar de inquérito sobre os incêndios será "séria ou oportunismo político".A intervenção final coube ao primeiro-ministro que começou por assinalar que este debate exige "capacidade de podermos olhar para trás e escrutinar aquilo que foi feito e aquilo que não foi feito e olharmos para frente".Depois de dissecar o Plano de Intervenção para as Florestas, que foi apresentado pelo Governo a 21 de março − "muito antes das ocorrências", lembrou −, o primeiro-ministro defletiu as críticas que acusavam o Governo de ter estado "ausente" e ter acordado "tarde para este problema"."Posso ter contribuído para essa perceção, mas é injusta", afirmou.Para sustentar esta consideração, Luís Montenegro apresentou uma "cronologia" dos eventos relacionados com os incêndios, que começou a "22 de julho", segundo o primeiro-ministro, com uma reunião com o "Conselho Coordenador da AGIF", a Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais.Depois, a "29 de julho", nos "primeiros dias de maior severidade meteorológica", Montenegro lembrou a sua ida à sede da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil, junto com a ministra da Administração Interna.Recordando que houve um "Conselho de Ministro de 7 de agosto", o primeiro-ministro recuperou as 45 medidas tomadas pelo Governo para responder aos incêndios."Fizemos aquilo que nos competia", frisou, enquanto acrescentava: "Não vestimos casacos da proteção civil, quisemos respeitar a prioridade que demos ao trabalho operacional.""Demos cumprimento a uma estratégia que visava proteger o património e as pessoas", concluiu..O líder do PS, depois de um momento inicial em que hesitou dar o sinal para a sua intervenção a José Pedro Aguiar-Branco, lembrou a Luís Montenegro que o primeiro-ministro tem direito a "férias, mas para a população portuguesa foi incompreensível" não ter adiado a Festa do Pontal, a rentrée do PSD, no Algarve, numa altura em que já tinham começado os incêndios florestais.José Luís Carneiro lembrou que já esteve no Parlamento a prestar contas, na qualidade de ministro da Administração Interna, e que por isso compreendia, mas não deixou de assinalar a ausência do ministro da Agricultura no debate.Vincando que, pelo PS, "este debate não teria ocorrido", porque ainda não era o momento de fazer esta avaliação, José Luís Carneiro lembrou que Montenegro quis que "o debate se realizasse hoje [quarta-feira, 27 de agosto]".Foi com esta ideia em mente que o líder socialista falou em "insensibilidade" do primeiro-ministro, não só pelo Pontal mas na forma como geriu a prevenção e por ter decapitado "várias estruturas intermédias [na Proteção Civil] por razões partidárias".José Luís Carneiro referiu "menos de 4 mil ações de fiscalização" preventivas de limpeza para continuar a acusar o primeiro-ministro de falta de sensibilidade.O líder do PS assinalou também a "falta de humildade" de Montenegro por não ter ouvido a "proposta que" José Luís Carneiro lhe fizera "no dia 1 de agosto, para ativar o Mecanismo Europeu de Proteção Civil".Depois, veio a acusação de "incompetência", por "o responsável desta pasta", da Administração Interna, não ter estado "sempre com a Proteção Civil e a Guarda Nacional Republicana"."Finalmente, no combate foi patente o recuou nos reacendimentos", destacou José Luís Carneiro, lembrando que o "ICNF [Instituto de Conservação da Natureza] diz que estão nos 9%", quando tinham sido 4%."Ausente, incapaz e frágil na resposta", disse o líder socialista sobre o Governo, lembrando que esteve "presente nos momentos mais difíceis e críticos da comunidade portuguesa na Venezuela", nas "Caraíbas, no furacão Irma", tal como o Estado esteva "presente junto dos portugueses nas horas mais difíceis"."Queira assumir connosco este pacto, senhor primeiro–ministro, para garantir que a operação dos meios aéreos será garantida pela Força Aérea", lançou José Luís Carneiro a Montenegro no final da sua intervenção.Já depois do microfone estar desligado, que é algo que acontece de forma programada com todos os intervenientes, José Luís Carneiro continuou a falar, apesar dos pedidos reiterados do presidente da Assembleia da República para que terminasse a sua intervenção.A insistência de José Luís Carneiro motivou críticas do líder parlamentar do PSD, Hugo Soares, e do líder do Chega, André Ventura, que acusou o deputado do PS de "querer mandar" no Parlamento..O coporta-voz do Livre Rui Tavares começou por apresentar ao hemiciclo a ideia de que "amamos todos o nosso país e o nosso território" e que "a metáfora da guerra leva o primeiro-ministro a falar de inimigo", que neste caso é o fogo, motivo pelo qual "devemos garantir que este não é um debate ciclo", até porque, a seguir, lembrou, "vamos discutir seca, e a seguir inundações"."Foi preciso chegar à situação em que estamos para que diga que quer um plano a 25 anos. Vamos perceber essa vontade de diálogo percebendo onde ela pára”, desafiou o deputado do Livre, deixando várias perguntas ao Governo: "Quer discutir a sério a profissionalização dos bombeiros? Mais meios e mais urgência para o cadastro florestal? Vamos finalmente à resposta do Estado?"Rui Tavares, com estes argumentos, disse querer saber se, por parte do Governo, "o apelo ao diálogo é sincero"..A líder da IL, Mariana Leitão, acusou o Governo de ter falhado com três “negligências”, justificando esta acusação com três argumentos: “A de nada fazer, que não introduz reformas na proteção civil e no governo da floresta; A de apenas reagir, que aposta tudo no combate a fogos cada vez mais difíceis, sem fazer antes o trabalho de prevenção; E a do calculismo político, que quando já era tarde, adiou o recurso aos meios de combate que mais precisamos para não assumir que o país vivia uma situação de calamidade.” Com a ideia de que a "legislação da floresta está um caos" e "precisa de ser simplificada e consolidada", Mariana Leitão deixou uma mensagem ao primeiro-ministro: "Se ainda está à espera de outro relatório [numa alusão a medidas da IL que não foram aprovadas] para lhe dizer isso, então o problema não é da floresta, é da sua falta de decisão.".O deputado do CDS João Almeida começou por defender que "os políticos têm de ter respostas", estendendo esta ideia ao facto do primeiro-ministro, junto com todo o Governo, independentemente de "ter estado ou não" noutro eventos, "houve conselhos de ministros" e "tomou medidas para o que estava a acontecer"."Algum primeiro-ministro do PS veio a este parlamento debater a questão dos incêndios", perguntou de forma retórica.Com esta ideia, o deputado centrista, defendeu que Luís Montenegro está no Parlamento a responder "porque quis estar"."Não há nenhum direito potestativo", disse a André Ventura, acusando a bancada do Chega de ter feito apenas "o que outros grupos parlamentares fizeram no passado".Assegurando que "é mentira o que está a ser dito da área ardida", João Almeida disse que "as ocorrências aumentaram 60%", enquanto "os despachos de meios aumentaram acima de 100%"..A coordenadora do Bloco de Esquerda afirmou que "em 45 medidas [anunciadas pelo Governo], zero para os bombeiros", lembrando perguntas que atribuiu a bombeiros que lhas dirigiram.Mariana Mortágua referiu ainda "um raminho" que foi utilizado por André Ventura num vídeo do Chega para "apagar um incêndio", acabando por se referir à "seriedade com que cada um enfrenta os incêndios".Continuando a recuperar perguntas que disse que os bombeiros lhe fizeram, a líder bloquista disse que "o Governo não preparou a época dos incêndios".Elencando vários meios que disse não estarem ativos quando era necessário que estivessem, como "detetores de fumo e mecanismo de videovigilância", Mariana Mortágua ironizou que o Governo considerou "sensato desviar 120 milhões da gestão da floresta"."Com bombeiros sem saber para onde vão", com "floresta ocupada por eucaliptos" e "meios aéreos avariados", o "Governo acha sensato adiar o Mecanismo Europeu"..“Não é só o País que está a arder, é a confiança dos portugueses no Estado”, afirmou o deputado único do JPP, Filipe Sousa, enquanto acusava o Governo de ter "relaxado" e de ter chegado tarde demais.Filipe Sousa fez estas afirmações depois de ter lembrado que desde o Governo liderado por Durão Barroso, em 2003, já havia medidas para combater incêndios.."Felizmente não se esqueceu dos bombeiros", ironizou o líder do Chega sobre a intervenção do primeiro-ministro, antes de atacar o Governo por Portugal não ter no terreno nenhum avião Canadair enquanto, sublinhou, a Grécia, com menor população, ter 17."Incompetência", disse o líder do Chega para classificar a ação do Governo."Não vale a pena ir ao Pontal falar de Fórmula 1, quando perdemos o mais útil, que é a vida das pessoas", criticou André Ventura."Não há evidências de que o estado falhou", questionou André Ventura de forma retórica, aludindo a declarações do líder parlamentar do PSD, Hugo Soares, acabando por afirma que "a senhora ministra da Administração Interna falhou"..Depois de uma "palavra de solidariedade às vítimas dos incêndios", o líder do PCP, Paulo Raimundo disse ao primeiro-ministro que a calamidade dos incêndios foi evidente "para toda a gente", que, "ao contrário do seu governo não pôde acordar tarde".Depois, assinalou que "escassearam meios, faltou a coordenação, gente indignada", que "viu em muitos casos os fogos consumirem os bens"."Não é possível erradicar os incêndios, mas tem de ser possível minimizar o drama", considerou o líder comunista, reforçando a ideia de que "o Governo tinha tudo planeado", mas "no fim o que houve foi mais incêndios"."Faltou coordenação", vincou, enquanto desafiou o Governo a alocar 3,5% do PIB − numa crítica ao valor de investimento em Defesa − para proteger o mundo rural..A primeira palavra de Luís Montenegro foi de "pesar" para as vítimas dos incêndios, mas afirmou que o governo esteve "antes, durante e depois de cada ocorrência", garantindo que houve "apoio rápido às pessoas e empresas mais afetadas".A lista que o primeiro-ministro trouxe preparada incluía um reforço do "problema dos sapadores florestais", "um aumento adicional para as brigadas" e a criação de "mais de 50 operações integradas de paisagem quando só existiam 12", considerou."Fizemos o controlo do fogo e autorizámos queimadas em 3562 hectares", acrescentou, antes de dizer que "estes são alguns dos exemplos do muitos que temos"."Podemos e devemos avaliar a eficácia destas" medidas, afirmou, "A força do inimigo foi enorme", disse, acrescentando que houve "mais de 25 dias ininterruptos de severidade meteorológica enorme"."Apesar das taxas de intervenção inicial ser superior a 93%, não conseguimos evitar grandes incêndios", avaliou..O presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco, começou por lembrar que este debate será a "primeira reunião depois dos incêndios das últimas semanas" e deixou uma palavra de "sentidas condolências às famílias das vítimas" e "reconhecimento aos bombeiros" e todos os agentes.Depois, disse ter "convicção de que no Parlamento serão encontradas as soluções" para responder a quem sofre..Luís Montenegro, há uma semana, enquanto era questionado sobre se se arrependia de não ter acionado mais cedo o Mecanismo Europeu de Proteção Civil, garantiu que "os critérios técnicos e operacionais" foram seguidos. "Verificaremos no final se isso teve o enquadramento devido — a minha expectativa é que sim —, mas nós seremos escrutinados como é normal numa democracia", prometeu.Esta quarta-feira, por proposta do Chega e do PCP, lançada há uma semana, que foi aceite com unanimidade parlamentar, o primeiro-ministro responderá aos partidos, numa sessão que contará com a presença da ministra da Administração Interna, Maria Lúcia Amaral.Entretanto, Chega e Bloco de Esquerda também já propuseram uma comissão parlamentar de inquérito sobre os incêndios, que, caso não seja aceite por uma maioria parlamentar do PSD e do PS, será forçada pelo partido liderado por André Ventura..Montenegro dá explicações aos deputados com a CPI à espreita.Gestão de meios e incentivos de fixação no interior são temas que peritos querem ver discutidos na AR