PCP. "Conferência nacional pode dar imagem de força interna"
Vai acontecer em novembro, em Corroios, e é apenas a quarta do género na história dos comunistas. Moldes ainda não são claros, mas espera-se uma maior abertura da parte do partido.
Os moldes ainda não são conhecidos, mas já é um dado adquirido: a 12 e 13 de novembro, o PCP terá uma conferência nacional. Em 100 anos de história, é apenas a quarta vez que tal acontece. Antes, os comunistas reuniram-se em 2002, 2003 e 2007.
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A decisão foi anunciada no passado dia 6 de junho quando, no final da reunião do Comité Central, Jerónimo de Sousa veio a público elencar as conclusões do encontro magno dos comunistas. O objetivo, explicou então, é "contribuir para a análise da situação do país, centrando-se na resposta aos problemas e nas prioridades de intervenção" do partido. Mas como se pode justificar a decisão? "Acima de tudo, o PCP quer dar uma imagem de força no contexto pós-eleitoral", explica ao DN a politóloga Paula do Espírito Santo. Segundo a docente e investigadora no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP), "decidir convocar esta conferência é uma mostra de que o PCP se pode querer virar mais para a sociedade - ou para os trabalhadores e o povo, como é apanágio -, mostrar que pode ser um partido que responde às suas necessidades". Por outro lado, António Costa Pinto, politólogo e investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS), vai mais longe: "O PCP, enquanto partido comunista, mantém uma estrutura e militância muito definidas e, após o desaire eleitoral, o fim da geringonça e a questão da guerra na Ucrânia, acabou por haver achas a serem deitadas na fogueira que motivaram um maior debate, mesmo entre os militantes". E isso, diz, pode justificar em parte a decisão de convocar a conferência nacional.
Tal como nas edições anteriores, a conferência marcada para novembro acontece numa altura em que o Governo em funções tem maioria absoluta. Em 2002 e 2003, era o caso com o governo de Durão Barroso (em que a maioria era PSD + CDS). Em 2007, a maioria era absoluta com José Sócrates como primeiro-ministro.
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Na noite eleitoral do passado mês de janeiro, o secretário-geral comunista, Jerónimo de Sousa, vincou que, face à composição parlamentar que se adivinhava na altura, o partido iria ter de passar a fazer "oposição na rua". Convocar esta conferência pode ser sinal disso mesmo, considera a docente do ISCSP: "O tempo de preparação até ao evento é grande, e é possível que daqui resulte essa agenda de oposição e o partido acabe por marcar uma posição política forte junto da sociedade", porque, explica, "o PCP tem de lutar muito até para não correr o risco de perder a representação parlamentar, depois do resultado eleitoral de janeiro", que representou uma perda de metade dos mandatos.
Por outro lado, a conferência de novembro acontece a meio caminho entre congressos. O último foi em 2020 e, seguindo a lógica dos últimos anos, o próximo será em 2024. Segundo Paula do Espírito Santo, "pode haver também um lançar de bases. Com um tempo de preparação considerável o partido pode começar já a preparar a agenda política a pensar no próximo congresso".
Apesar do anúncio ter sido feito publicamente, nesta altura ainda não há certezas sobre os moldes das intervenções ou palestrantes na conferência nacional. Contudo, e segundo apurou o DN, o evento será aberto. Ou seja, não se fará apenas com militantes ou com o "núcleo duro" comunista, havendo espaço para simpatizantes e lugar para a comunicação social. Na ótica de Paula do Espírito Santo, esta possível abertura não é nova e relembra: "A festa do Avante!, por exemplo, é um evento à qual costuma acorrer muita gente e não necessariamente apenas militantes. Ou seja, o próprio PCP tem eventos grandes, que acabam por ser agregadores." Por outro lado, explica, "se se discutirem políticas e posições, o partido acaba por dar a conhecer uma parte da sua agenda à sociedade civil, algo que é conveniente". A mesma perspetiva não é partilhada por António Costa Pinto. Segundo o politólogo, a "maior abertura da conferência pode ser usada pelo PCP para, no fundo, revigorar e legitimar a sua imagem e posição junto do eleitorado e da sociedade como um todo."
No comunicado que o PCP divulgou após a reunião do Comité Central foi ainda esclarecido que, à semelhança do que aconteceu nas outras conferências nacionais, serão divulgadas conclusões. Tendo em conta a natureza do evento, "é algo natural". "Ainda falta algum tempo e, tendo isso em conta, é esperado que saiam algumas recomendações e considerações sobre o país e o partido", conclui Paula do Espírito Santo.
O que saiu das três conferências do PCP?
2002: A primeira
No rescaldo das legislativas de 2002 - que deram a vitória a Durão Barroso -, o PCP convocou a primeira conferência nacional da sua história. O tema de debate principal foi a análise do quadro político de então e a procura de maneiras de reforçar a intervenção e influência do partido. Uma das principais conclusões do encontro foi a preocupação com a influência eleitoral, que os comunistas consideraram ter "consequências muito negativas" para a sua atividade política de então. Por isso, concluiu a conferência, teria de haver "um estímulo à iniciativa própria e da organização e dos militantes".
2003: O PCP e o poder local
Depois das conclusões da reunião de 2002, no ano seguinte, o PCP debruçou-se sobre o poder local. Isto porque, na conferência anterior, já se problematizava sobre a perda eleitoral ao nível autárquico. No final do encontro, o PCP afirmava que a conferência nacional confirmava então "a determinação partidária em assegurar, no futuro, uma mais expressiva iniciativa política do partido no plano local e em reforçar aquela presença de trabalho, honestidade e competência que dê continuidade a um projeto com provas dadas e de reconhecida qualidade na intervenção e gestão nas autarquias, que contribuam para uma mais afirmada presença e influência do PCP."
2007: Questões económicas e sociais
Foi há 15 anos que aconteceu a última conferência nacional do PCP. Na altura, o foco foram as questões económicas e sociais. Durante o primeiro mandato de José Sócrates, os comunistas convocavam a conferência para, lia-se na página web do encontro, "afirmar a política alternativa" que consideravam "realizável". Da conferência nacional saíam duas conclusões principais: por um lado, pretendiam ver aprovadas as conclusões e linhas de trabalho apresentadas no texto-base da conferência. Por outro, o PCP apelava à concretização das orientações que saíam do encontro, tornando-as "num fator de exigência de uma nova política e de afirmação de confiança num Portugal de progresso, de justiça social, desenvolvido e soberano."
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