Matosinhos. Afinal, a presidente da Câmara é arguida porquê?
Escolha de uma chefe de gabinete sem concurso? Ou na verdade tráfico de influências, no âmbito da Operação Teia? Por causa das dúvidas, PGR abriu averiguação interna.
A presidente socialista da Câmara Municipal de Matosinhos, Luísa Salgueiros, é apenas arguida por ter escolhido uma chefe de gabinete sem concurso - procedimento habitual nestas escolhas, a todos os níveis do Estado, começando pelo governo e acabando no Poder Local? Ou afinal será por algo mais, enquadrando-se essa nomeação em suspeitas de tráfico de influências, no âmbito da Operação Teia?
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Esta sexta-feira, para esclarecer as dúvidas, a procuradora-geral da República, Lucília Tiago, "determinou a instauração de um procedimento especial de averiguação" sobre "a constituição como arguida da autarca de Matosinhos" (que é também presidente da ANMP - Associação Nacional de Municípios Portugueses). Será averiguada a "eventual relevância disciplinar da atuação Ministério Público" e isto conforme os "termos do art. 264, n.º 2, do Estatuto do Ministério Público". O artigo em causa refere que "o Conselho Superior do Ministério Público pode ordenar a realização de processo de averiguação sobre queixa, participação ou informação que não constitua violação manifesta dos deveres dos magistrados do Ministério Público", sendo que "o processo de averiguação destina-se a apurar a veracidade da participação, queixa ou informação, e a aferir se a conduta denunciada é suscetível de constituir infração disciplinar".
O facto de, num primeiro momento, ter sido noticiado que Luísa Salgueiro seria apenas arguida por ter escolhido a sua chefe de gabinete sem concurso, suscitou várias reações de estupefação, não só no PS - da Associação Nacional dos Autarcas socialistas, por exemplo - como até no PSD.
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O social-democrata Ribau Esteves, presidente da Câmara de Aveiro (e vice-presidente de Luísa Salgueiro na ANMP), disse que um processo destes "não tem qualquer sentido" porque a lei é clara a permitir estas nomeações sem concurso, visto tratar-se de um cargo de estrita confiança política e pessoal de quem nomeia. "Sou presidente de câmara há 25 anos, já nomeei sete vezes chefes de gabinete, adjuntos e secretários e sempre de acordo com a lei. Onde é que está a dúvida?", questiona.
Ora a dúvida é esta: poderá haver algo mais no que levou o MP a constituir Luísa Salgueiro como arguida?
A verdade é que o procurador do Departamento de Investigação e Ação Penal do Porto que tutela a investigação Operação Teia considera que Luísa Salgueiro "é suspeita de, em 27 de outubro de 2017, na qualidade de presidente da Câmara Municipal de Matosinhos, abusando dos poderes e/ou violando os deveres inerentes às suas funções, e por influência conjugada de Joaquim Couto, Manuela Couto e José Maria Laranja Pontes (ex-presidente do IPO do Porto), e com intenção de conceder benefício, ter nomeado, em outubro de 2020, Marta Moura Laranja Pontes, filha de José Maria Laranja Pontes (...) sem cumprimento dos requisitos legais".
Segundo a revista Sábado, na Operação Teia, que envolve o ex-autarca socialista de Santo Tirso Joaquim Couto e a sua mulher, Manuela Couto, investigando dezenas de ajustes diretos por "violação das regras da contratação pública" que teriam favorecido as empresas de Manuela Couto na obtenção de contratos com autarquias e outras instituições públicas, como o IPO do Porto, ressalta a "suspeita" de que uma parte das adjudicações do Instituto Português de Oncologia do Porto à empresa de Manuela Couto terão sido uma alegada contrapartida pela suposta influência de Joaquim Couto junto de Luísa Salgueiro para que a filha de José Maria Laranja Pontes fosse nomeada chefe de gabinete.
Na quarta-feira, Luísa Salgueiro, também presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), falou publicamente pela primeira vez sobre o tema. "É um assunto que compete à justiça, mas, já que foi trazido para a praça pública, não por mim, mas pelos órgãos de comunicação social, tenho de dizer o que leio do processo: a minha constituição de arguida é exclusiva sobre a nomeação da minha chefe de gabinete".
Quanto às suspeitas de tráfico de influências, são, no seu entender, "uma invenção". "Hoje foi a notícia que saiu e podia ser outra qualquer. Quando estamos no domínio da invenção tudo pode acontecer. Posso falar daquilo que está no processo e o que está é a nomeação a minha chefe de gabinete", disse a autarca de Matosinhos.
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