Luísa Salgueiro propõe criação de observatório da descentralização

A nova presidente da ANMP pretende que o observatório forneça os "dados essenciais" para seguir "uma metodologia de melhoria contínua".

Luísa Salgueiro, a nova presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP),propôs este domingo a criação de um observatório da descentralização de competências para acompanhar a execução do processo.

"Para monitorizar e avaliar a execução do processo proponho a criação de um observatório da descentralização, consolidando o trabalho que a ANMP tem feito nesta área, com o envolvimento das universidades e politécnicos, que aprofunde o nosso conhecimento do processo e nos forneça os dados essenciais para que este siga uma metodologia de melhoria contínua e para que as boas práticas sejam evidenciadas e partilhadas", afirmou.

No encerramento do XXV Congresso da ANMP, em Aveiro, Luísa Salgueiro, eleita para o cargo no sábado, considerou contudo que a descentralização só será um momento de aperfeiçoamento da democracia e da qualidade dos serviços públicos se for acompanhada por um envelope financeiro justo.

Falando num momento único, em referência a um pacote de financiamento comunitário ímpar, a também presidente da Câmara Municipal de Matosinhos (eleita pelo PS) afirmou que o mesmo deve estar ao serviço dos municípios e da sua capacidade para corrigir assimetrias.

"Sabemos que costumam existir conflitos de interesses entre os municípios mais populosos e os menos populosos. Os primeiros representam, é certo, a maioria da população, mas os segundos representam a maioria do território e não haverá coesão territorial e social, não haverá desenvolvimento sustentável, nem aproveitamento cabal do potencial do país se persistirmos em modelos que agravam as assimetrias regionais e locais", sublinhou.

E, nesse sentido, Luísa Salgueiro voltou a apontar a necessidade de se avançar para uma regionalização que seja um motor da coesão e do desenvolvimento.

Pretende-se também, acrescentou, que esse processo contribua para o reforço do municipalismo e para a melhoria da gestão da coisa pública, que reforce a democracia pela eleição direta dos níveis de poder regional e que essas decisões possam ser escrutináveis pelos destinatários das políticas públicas, que são os cidadãos.

Resolução final defende regionalização e descentralização

O congresso da ANMP aprovou uma resolução na qual considera fundamental a criação de regiões, defende o aprofundamento da descentralização de competências e alerta para fragilidades no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).

Na resolução aprovada pelos representantes dos municípios considera-se que "a criação de regiões é um instrumento absolutamente fundamental para o desenvolvimento equilibrado" do país.

"No atual quadro de recuperação económica e financeira e com os vultuosos recursos disponibilizados pela União Europeia, só a criação de regiões administrativas potenciará a implementação de políticas territoriais mais próximas dos cidadãos e favorecerá uma aplicação mais efetiva dos fundos europeus", é salientado no documento.

Os municípios consideram "urgente a criação de um nível regional que propicie políticas públicas mais consistentes, que favoreça a capacidade competitiva dos territórios, que potencie a criação de centros polarizadores de crescimento" e que seja "um meio de aprofundamento da descentralização administrativa no quadro da reorganização do Estado".

A ANMP destaca que ao longo dos anos foi criticando a excessiva centralização do Estado, que "tem como consequência a diminuição da qualidade dos serviços públicos prestados e a insuficiência das políticas implementadas".

Quando faltam pouco mais de três meses para a definitiva concretização do processo de descentralização em curso, a associação "identifica um conjunto de constrangimentos e de dificuldades que obstam ao normal desenvolvimento deste processo de descentralização".

"Desde logo a falta de capacidade ou ausência de resposta por parte dos serviços da administração central às solicitações dos municípios, a falta de acesso a dados, a ausência de informações e esclarecimentos, a falta de acesso a plataformas informáticas e, em algumas áreas, o atraso e mesmo as insuficiências das transferências financeiras para o cabal exercício das novas responsabilidades", descreve o texto.

Os autarcas consideram que é "necessário dotar o Fundo de Financiamento da Descentralização da necessária flexibilidade, permitindo em cada momento a introdução dos ajustamentos considerados indispensáveis à operacionalização concreta das competências transferidas".

Portugal continua com "desequilíbrios notórios", consideram os autarcas, defendendo ser "necessário definir e implementar políticas nacionais que incentivem o aproveitamento racional dos recursos".

Na resolução, os municípios consideram que são necessárias estratégias que "possibilitem um outro tipo de intervenção" das suas autarquias, nomeadamente no domínio da habitação, numa altura em que as Câmaras Municipais estão "num clima de grande incerteza e reféns das disponibilidades financeiras momentâneas para a sua execução, preconizando-se uma alteração de paradigma que reconheça o papel essencial" destes órgãos do poder local ao nível do planeamento estratégico e execução das medidas.

No âmbito do PRR, a ANMP "aponta fragilidades diversas", nomeadamente "a falta de transparência do mesmo, uma vez que parte dos fundos está comprometida sem que tivessem sido previamente conhecidos os contornos dos projetos e das entidades a apoiar".

"O PRR reflete também uma visão centralista e centralizadora, tendo arredado os municípios da sua gestão e das prioridades de intervenção", e "não promove, como deveria, a coesão territorial", é referido no documento.

"É necessária uma reorientação do PRR que lhe permita ter uma gestão mais descentralizadora, que privilegie os investimentos locais e eu favoreça a transparência", escrevem os autarcas.

Na resolução final do congresso, defende-se também a necessidade de uma nova Lei das Finanças Locais, o reforço do financiamento comunitários a projetos municipais e a dignificação das condições de exercício do mandato dos eleitos locais.

Carlos Moedas diz que poder local é essencial para o país concretizar desafios

Carlos Moedas, o novo presidente da Mesa do Congresso da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), assegurou na sessão de encerramento do XXV Congresso que os grandes desafios do país são "impossíveis" de cumprir sem o contributo do poder local.

"Num mundo em mudança, com equilíbrios de poder a sofrerem transformações como nunca vimos no passado, são os poderes autárquicos que podem fazer a diferença", disse Carlos Moedas.

O também presidente da Câmara de Lisboa, que se estreou em congressos autárquicos, salientou que para a implementação das reformas "verdadeiramente estruturais a voz autárquica não é apenas um complemento - é indispensável para ver o trabalho concretizado".

"Se olharmos para tudo aquilo que são as prioridades - demografia, coesão territorial, organização e modernização do Estado, captação de investimento estrangeiro e difusão da cultura -, todas elas são impossíveis de cumprir sem o contributo indispensável do poder local", acrescentou.

Na sua intervenção na sessão de encerramento, Carlos Moedas disse que os municípios pretendem "construir um Estado social local para que ninguém tenha de esperar pela burocracia dos governos centrais para ter o apoio de que precisa".

"Queremos que essas competências pertençam às autarquias em todo o país, porque só elas podem exercer essas competências para que as populações não se sintam esquecidas", frisou.

Para o novo presidente da Mesa do Congresso da ANMP, eleito no sábado, os autarcas "são os alicerces nos quais assenta a governação de qualquer país e que, por isso mesmo, decide o seu futuro".

"Está na altura de abrir o livro do localismo e começar uma nova era em que as respostas locais se juntam para combater problemas globais", sublinhou o social-democrata.

O autarca de Lisboa realçou ainda que os governos nacionais "não devem apenas contar só com o governo local para resolver os problemas do país, mas devem contar com os autarcas para os evitar, porque são eles que estão na linha da frente da crise".

"São os autarcas e só os autarcas que vão da porta do comerciante mais humilde aos centros de decisão internacionais mais determinantes", enfatizou.

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