Justiça e António Costa unem PS e Governo com Ventura na mira
O anúncio surgiu logo no início do debate: o Governo admite mexer na justiça e “aprofundar a reforma” do setor. Primeiro, foi Hugo Soares, líder parlamentar do PSD, a assumi-lo e, na resposta, Luís Montenegro admitiu: “Há questões que preocupam todos” no que toca à justiça e “havendo na sociedade portuguesa e na Assembleia da República disponibilidade para poder ter na justiça penal alguma ponderação de alterações, o Governo, naturalmente, está disponível e não deixará de estar, com contributos da Assembleia da República”.
Naquele que foi o primeiro debate quinzenal com o primeiro-ministro após as eleições europeias, Luís Montenegro recordou que, em 2007, era deputado e acompanhou o “pacto da justiça”. E, comparando com o que então fora proposto, há várias áreas que podem dar uma pista para eventuais mudanças. Afinal, admitiu o primeiro-ministro, “os objetivos do legislador” em relação a uma série de temas, “como a detenção fora de flagrante delito, o combate à violação do segredo de justiça, o uso de intersecções telefónicas como meio complementar de prova - e não como meio exclusivo - não foram totalmente acolhidos na prática”. Acabar com os chamados megaprocessos - que “têm sido sobretudo instrumentos para protelar processos e para dar azo a manobras dilatórias que são indutores de injustiça” - será também uma prioridade para o Executivo.
Questionado sobre os dados mais recentes em relação ao défice, o primeiro-ministro defendeu que “a situação que foi legada não correspondia” ao que o anterior governo anunciava, fazendo passar a ideia “de que os cofres estavam cheios e o país nadava em dinheiro”. A intenção é, no entanto, chegar ao fim de 2024 com “contas positivas”, mas tal “não responsabiliza só o Governo”. Ou seja: acima de todos os outros partidos, Luís Montenegro faz mira a PS e Chega, que ontem acusou de quererem “legislar em substituição do Governo”, como no caso das medidas para mexer no IRS.
Em resposta, Pedro Nuno Santos perguntou diretamente a Montenegro (já depois de ter aberto a porta a mexidas na justiça): “Vai repercutir a baixa do IRS já em 2024?” A resposta não foi direta. O primeiro-ministro apontou que o líder socialista “se calhar cometeu um erro” neste tema, e disse que o diploma “não teve por base uma proposta de lei [que é feita por iniciativa do Governo]”, porque “o processo legislativo” sobre o assunto é exclusivo da Assembleia da República.
O apoio governamental a António Costa para o cargo de presidente do Conselho Europeu também não ficou de fora do plenário. Luís Montenegro reiterou o apoio ao seu antecessor -“o melhor socialista” para o cargo - e André Ventura, líder do Chega, afirmou que existem dirigentes que “corariam de vergonha” com este apoio. Em resposta, o primeiro-ministro lembrou ter feito oposição aos governos PS, mas que tal não significa que não tenha “condições para reconhecer as capacidades [de Costa] para estar à altura de uma função que é de conciliação, de agregação de famílias políticas diferentes”. António Costa foi “muito pior primeiro-ministro do que vai ser presidente do Conselho Europeu”, disse ainda.
Semana de quatro dias pode vir a ser adotada
Já na reta final do debate, a líder parlamentar do Livre, Isabel Mendes Lopes, perguntou diretamente a Luís Montenegro: está o Governo disponível para alargar a semana de quatro dias a todo o país? Ainda que não se tenha comprometido, o primeiro-ministro referiu que “não consegue responder já”, mas também não excluiu. “Porventura”, o fator será “a manutenção da carga horária semanal”.
Antes, Mariana Mortágua, líder do BE, voltou a colar a política de imigração do Governo ao Chega, recordando as palavras de André Ventura, que considerou o pacote de medidas como “uma grande vitória” do seu partido - aproximação que Luís Montenegro rejeitou.
A assistir nas galerias estiveram soldados ucranianos, que estão em Portugal para receber tratamento. Esta presença motivou uma troca de galhardetes entre o líder da IL, Rui Rocha, e Paulo Raimundo, secretário-geral comunista. O liberal acusou os comunistas de mostrarem uma “total falta de entusiasmo” durante o aplauso inicial aos soldados. Na resposta, Raimundo reforçou que o partido defende um “caminho de construção da paz”, que é “o maior ato de solidariedade” possível para com qualquer povo.