Da “guerra de Putin” à Energia: o que pensam os cabeças-de-lista dos principais partidos?
Dentro de precisamente um mês, os eleitores são, novamente, chamados às urnas. Desta feita, para escolher os novos 21 eurodeputados portugueses.
Com todas as listas praticamente renovadas desde eleição de 2019, as maiores surpresas vieram dos cabeças-de-lista da AD (Sebastião Bugalho) e do PS (Marta Temido). De resto, todos os nomes, da esquerda à direita, foram vistos com alguma normalidade - ainda que haja estreantes e alguns menos conhecidos.
O mandato ainda será pautado pela guerra na Ucrânia. Há também uma previsível subida dos partidos populistas e um eventual alargamento está na mira. Mas o que pensam os cabeça-de-lista dos partidos com assento parlamentar?
O alargamento “imperativo”
Sebastião Bugalho, da AD, não tem dúvidas: “Estrategicamente, o alargamento da União Europeia [a mais países] é hoje um imperativo”. Porquê? “A guerra de Putin veio comprovar a necessidade de reforçar o espaço de integração europeu, alargando-o à Ucrânia, à Moldávia, aos Balcãs Ocidentais e, eventualmente, à Geórgia.”
António Tânger Corrêa, do Chega, refere que o seu partido é "favorável" à adesão de novos países. É, no entanto, necessário respeitar "todos os critérios de adesão, sem exceção". O novo alargamento trará, obrigatoriamente, "uma revisão do quadro institucional e financeiro da UE". O partido estará "atento" porque "é contra um eventual fim do princípio de um comissário por Estado-membro".
Pela Iniciativa Liberal (IL), o cabeça-de-lista, João Cotrim Figueiredo, explica que o partido “é favorável” ao alargamento, desde que se enquadre nos “critérios de adesão de Copenhaga”, seja por motivos económicos ou políticos. Isto significa que “é necessário proceder a reformas” que permitam estas adesões.
À esquerda, Catarina Martins considera-o também “indispensável”, porque a “política de coesão tal como está já não chega para a realidade atual das divergências económicas dentro da UE ”.
Francisco Paupério, do Livre, considera que o alargamento deve ser feito “com critérios bem definidos”, porque “os valores democráticos e o Estado de Direito são pilares inabaláveis” da União.
Pedro Fidalgo Marques, do PAN, afirma que “o espírito europeu deve pautar-se pela solidariedade”. E, defende, “qualquer país deve ter em consideração a disponibilidade e trabalho para acompanhar os valores democráticos e de inclusão que pautam a UE”.
Guerras também na agenda
Olhando para os dois conflitos próximos da UE (na Ucrânia e em Israel), Sebastião Bugalho defende que o apoio a Kiev, militar ou não, “deve manter-se até à derrota russa” e que, no Médio Oriente, a “solução de dois Estados” é importante e deve ser o caminho a seguir. “É nossa intenção [AD] que o reconhecimento formal da Palestina aconteça num âmbito multilateral: na UE nas Nações Unidas”, remata.
Para o cabeça de lista do Chega, apoiar a Ucrânia "é do interesse da Europa e dos Estados-membros". A paz na Europa, diz Tânger Corrêa, deve ser um "objetivo fundamental" da União e de Portugal, enquanto membro. Sobre o conflito no Médio Oriente, recorda que "por razões civilizacionais e históricas" o partido está do lado de Israel, mas o desejo é de alcançar a paz "o mais rapidamente possível, no interesse da estabilidade na região".
Cotrim de Figueiredo refere que a UE “tem de manter e reforçar o seu apoio à Ucrânia e ser irredutível nos esforços de dissuasão dos avanços russos” e o conflito no país continua a ser “um desafio existencial”. Sobre o Médio Oriente, o candidato liberal refere que a UE “deve empenhar-se diplomaticamente na cessação de hostilidades que permita negociações tendentes a viabilizar a solução de dois Estados”.
Catarina Martins defende que a UE pode “construir uma diplomacia de defesa consistente da paz, direito internacional e direitos humanos” e com autonomia em relação aos EUA. O apoio à Ucrânia está a ser “exemplar”, mas que o mesmo não se verifica no conflito em Gaza, em que “as instituições europeias estão a apoiar objetivamente com a sua passividade ou apoio explícito”. Já Francisco Paupério afirma: “A invasão da Ucrânia pela Rússia é ilegítima e ilegal. Defendemos sempre o direito à autodeterminação de todos os povos, seja na Ucrânia ou no Estado da Palestina.”
Pelo PAN, Pedro Fidalgo Marques defende que a UE “deve ser muito mais proativa na via diplomática” e que o “o apoio à Ucrânia deve ser encarado como um apoio à defesa da Europa e dos valores que formam este projeto comum e da democracia”. Sobre o conflito no Médio Oriente, devem ser desenvolvidos “todos os esforços” para terminar com “o genocídio que está a acontecer”, ao mesmo tempo que se trabalha “diplomaticamente para a implementação da solução dos dois estados”.
Defesa comum deve ser tema?
À direita, a política de defesa comum deve ser mais coordenada, os países devem “começar por atingir a meta de investimento de 2% do PIB” e faz sentido “institucionalizar o pilar Europeu da NATO” (diz a IL). O candidato da AD considera que “há duas necessidades” principais: “Ter Forças Armadas capacitadas de todos os Estados-membros, nas fronteiras do continente. E o aprofundamento da Política Externa e de Segurança Comum.” Já António Tânger Corrêa, do Chega, defende que a UE deve "aumentar a sua capacidade de defesa, mantendo a soberania dos Estados" e deve ser "delineada uma forma de cooperação interativa" entre os vários membros, tornando a UE menos dependente dos Estados Unidos.
À esquerda, Catarina Martins defende que deve ser promovida “a articulação das políticas de defesa nacionais” que permitam autonomia em relação a potências militares. Essa política “deve ser de defesa e não uma política de aventuras militares noutros continentes”. Já Francisco Paupério, do Livre, defende que a União “tem de reforçar a sua posição na segurança global” e deixa o seu apoio a uma “política de Defesa comum, com a partilha de recursos e conhecimentos entre Estados-Membros”.
Para o PAN, “o caminho deve ser o da promoção do restabelecimento da paz e preservação do respeito pelos valores humanitários”. E perante a guerra na Europa, a UE “tem, necessariamente, de atuar proativamente na garantia da sua segurança e defesa, nas suas diferentes dimensões, incluindo em matéria de cibersegurança, bem como na cooperação e solidariedade”.
Que reformas económicas defendem que sejam feitas?
Com as novas regras de governação económica em vigor desde 30 de abril, Sebastião Bugalho olha para este quadro como “mais flexível”, mas com um “compromisso claro com o investimento, nomeadamente na transição ecológica e digital”. O impacto das novas regras deve então ser avaliado “em devido tempo”, porque a “economia e as contas públicas” da UE precisam de “estabilidade, certeza e previsibilidade”.
O cabeça de lista do Chega refere que "o orçamento da UE é um tema fundamental" para o funcionamento da União e para os países membros. Defende, por isso, "um princípio de eficiência orçamental onde cada euro gasto tem de ter um efeito reprodutivo".
Já Cotrim de Figueiredo refere que “o instrumento económico mais importante do futuro da UE é o aprofundamento e alargamento do mercado único”, especialmente “a união do mercado de capitais, mecanismo-chave para desbloquear o investimento privado em toda a UE”.
Catarina Martins defende que o Pacto de Estabilidade tem um “caráter obsoleto e contraproducente”. As novas regras são desadequadas e isso “tornar-se-á rapidamente evidente”. O debate irá “certamente marcar o próximo mandato”.
Francisco Paupério, do Livre, afirma que devem ser feitas “reformas fiscais sem reduzir investimento público ou constantes ameaças de défice excessivo às economias do sul”. Afinal, defende, “os Estados-membros devem estar em pé de igualdade”.
O PAN, pelo cabeça-de-lista Pedro Fidalgo Marques, afirma que a UE “deve mudar a sua visão económica passando de políticas centradas na austeridade e que têm tido um impacto no custo de vida das famílias, para políticas de investimentos no futuro”, incluindo a reforma do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Energia e agricultura: prioridade
Para a AD as prioridades na energia e na agricultura devem ser, entre outras, “diversificar fontes, nomeadamente com a aposta em renováveis” e “criar políticas que permitam manter os alimentos a preços acessíveis, garantir a qualidade e combinar a sustentabilidade económica, social e ecológica da agricultura europeia”. Já a IL defende que se deve aprofundar “a integração do mercado de energia, rumo a um mercado único”, bem como “edição genómica que permita a rápida adoção desta tecnologia”, que permitirá, afirma Cotrim, “criar variedades de alimentos mais resistentes a pestes, pragas e à escassez de água”.
Tânger Corrêa destaca que o partido quer "garantir uma verdadeira soberania alimentar", aumentando para isso o "grau de autossuficiência" da produção alimentar na Europa. E destaca: "O setor primário é um dos melhores motores de desenvolvimento sustentado" porque cria "oportunidades económicas", gera "empregos de qualidade", que são parte necessária para "melhorar os padrões da qualidade de vida".
O BE defende que o combate às alterações climáticas deve estar no centro nevrálgico da política europeia. “Não é só uma emergência civilizacional. Fornece um roteiro para sociedades mais justas”. E, na agricultura, é “indispensável uma transição agroflorestal verde”, inseparável “da garantia de condições de vida decentes para quem trabalha na agricultura”. Por seu lado, o Livre defende que deve ser reforçado “o Novo Pacto Verde para uma transição energética ambiental e justa”. Na agricultura, a UE “precisa de alinhar a Política Agrícola Comum, com o combate às alterações climáticas e a sustentabilidade ambiental e apostar na agricultura sustentável”.
Por fim, Pedro Fidalgo Marques diz que é necessário “promover a transição para fontes de energia limpa e renováveis até 2040”, sendo também importante “priorizar políticas que promovam uma agricultura verde e sustentável, apoiando práticas agrícolas que respeitam o meio ambiente”, por exemplo.
Para este trabalho, o DN contactou todos os partidos com assento parlamentar. PS e CDU não responderam em tempo útil.
Os resultados eleitorais desde 1987
Em Portugal, as eleições para o Parlamento Europeu realizam-se desde 1987. Nesse ano, os eleitores foram chamados às urnas para escolher os primeiros eurodeputados, uma vez que Portugal entrara para a então Comunidade Económica Europeia em 1986. Inicialmente, eram eleitos 24 mandatos. Em 1994 e 1999, Portugal teve o seu maior número de deputados: 25. A partir daí, o número diminuiu e está fixado nos 21 desde 2014. Olhando para os dados, é possível ver que, não obstante a entrada de alguns partidos mais pequenos (como o MPT ou o PRD), o PS é quem mais ganhou estas eleições (por cinco vezes), seguindo-se o PSD (com três vitórias).
Notícia atualizada às 11h35 de dia 9 de maio com as respostas do candidato do Chega, António Tânger Corrêa, que chegaram já depois da hora de fecho da edição em papel.