Paulo Núncio, líder parlamentar do CDS-PP
Paulo Núncio, líder parlamentar do CDS-PPLeonardo Negrão / Global Imagens

Bancadas mais à esquerda quase vazias no debate do 25 de Novembro

Intervenção inicial de Paulo Núncio teve clareiras do lado esquerdo do hemiciclo. Francisco Assis foi o único a aplaudir no PS.
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A intervenção com que o líder parlamentar do CDS-PP, Paulo Núncio, arrancou o debate, agendado pelos centristas, sobre a instauração de uma sessão solene anual comemorativa do 25 de Novembro, foi recebida por um hemiciclo marcar com extensas clareiras do lado esquerdo.

Dos três grupos parlamentares mais à esquerda apenas compareceram dois deputados, com Joana Mortágua e Marisa Matias (Bloco de Esquerda), Paula Santos e António Filipe (PCP), e Rui Tavares e Isabel Mendes Lopes (Livre), a comparecerem. Mas também entre o PS houve faltas e ausência de reações ao discurso de Núncio, à exceção de Francisco Assis, que aplaudiu várias passagens da intervenção do centrista.

Depois de Paulo Núncio defender a “obrigação histórica” de assinalar a data histórica, prestando homenagem aos líderes militares Ramalho Eanes e Jaime Neves por travarem “um golpe militar protagonizado pela extrema-esquerda”, pelos militares José Coimbra e Joaquim Cristo, “caídos em combate pela liberdade e democracia”, e pelos líderes políticos Mário Soares, Sá Carneiro e Freitas do Amaral, que “lutaram duramente contra os desvios totalitários das forças extremistas”.

Respondendo a uma intervenção de Rui Tavares, que alegou não saber o que se pretendia comemorar numa eventual futura sessão solene do 25 de Novembro, Núncio respondeu que essa data garantiu a liberdade de pensamento, de imprensa, económica e política, enumerando o que sucedeu durante o PREC, incluindo a existência de presos políticos, o saneamento de jornalistas, a nacionalização de empresas e ocupação de propriedades e o cerco à Assembleia da República.

“Não houve guerra civil porque houve o 25 de Novembro”, disse Núncio a Rui Tavares, levando o deputado comunista António Filipe a fazer que não com a cabeça.

De seguida, o deputado do Chega Jorge Galveias defendeu a proposta do seu partido para que o 25 de Novembro passe a ser feriado nacional. E o líder da Iniciativa Liberal, Rui Rocha, citou George Orwell para denunciar uma “tentativa de controlo do passado pela extrema-esquerda”.

Raro exemplo entre os eleitos para esta legislatura que eram maiores de idade em 1974 e 1975, o deputado comunista António Filipe disse que a iniciativa centrista de criar uma sessão solene do 25 de Novembro tem “um objectivo fundamental que se chama revisionismo histórico”, vinda “daqueles que nunca se conformaram com a revolução de Abril” e fazerem tentativas de “branqueamento da ditadura fascista”.

Apresentando como “facto histórico” que o PCP nunca tenha procurado impor uma ditadura em Portugal durante o PREC, António a Filipe mencionou os assaltos e incêndios de centos de trabalho do seu partido, recebendo aplausos ruidosos da deputada socialista Isabel Moreira. Entre referência à “rede bombista de extrema-direita que aterrorizou o país”, o deputado comunista disse que o 25 de Novembro de 1975 “abriu caminho ao processo contra-revolucionário” que não foi tão longe quanto “objetivos mais ambiciosos” como a ilegalizarão do PCP.

Ainda segundo António Filipe, a proposta centrista está relacionada com “a radicalização da direita portuguesa” e a “reabertura do campeonato do reacionarismo” devido ao aparecimento do Chega.

Antes, a deputada única do PAN, Inês de Sousa Real dissera que “o 25 de Novembro não deve ser bastião da direita, tal como o 25 de Abril não deve ser bastião da esquerda”.

Pelo PSD, o deputado Bruno Vitorino disse que “todos nos livrámos, pela coragem e determinação de alguns” de um regime baseado nas “democracias” então existentes na Europa de Leste. E disse que a luta pela liberdade deve continuar, nomeadamente contra “a ideologia nas escolas”. “Deixem as nossas crianças em paz”, disse, mencionando também tentativas de condicionar a liberdade de imprensa e o domínio do politicamente correto.

No final da intervenção, Bruno Vitorino disse que para valorizar o 25 de Novembro “não precisamos de ser radicais”. Assim sendo, ficou claro que o PSD não aprovará a proposta do Chega de criar um novo feriado nacional. “Isso não lhe tira dignidade”, justificou.

“Lição” na última intervenção de Assis

Pela bancada socialista interveio Francisco Assis, que começou por citar Mário Soares, que descreveu o 25 de Novembro de 1975 como “o virar de uma página que poderia ter sido trágica”.

Recordando os “até agora esquecidos” no debate militares do Grupo dos Nove, Assis disse que o 25 de Novembro “é uma data fundamental na História Contemporânea portuguesa”. 

“Os grandes vencedores do 25 de Novembro foram os verdadeiros democratas, que estão espalhados por vários partidos”, disse o futuro eurodeputado socialista l. E foi mais longe, admitindo que “houve um risco real de instauração de um regime autoritário que, levado às últimas consequências, seria um regime totalitário de inspiração marxista”.

Naquela que assumiu ser a última intervenção na Assembleia da República, que supostamente iria presidir na segunda metade da legislatura, Francisco Assis defendeu que o PS “liderou o combate” quando outros partidos, nomeadamente o PCP, viam a democracia ocidental como “uma democracia formal e burguesa”.

No entanto, deixou claro que “exercendo os nossos direitos cívicos estamos a comemorar todos os dias” o 25 de Novembro, disse Assis, que foi aplaudido de pé pela bancada socialista e também pelo líder parlamentar social-democrata Hugo Soares.

Hugo Soares falou de seguida e disse que Francisco Assis deu “uma lição”, mas sobretudo ao seu próprio partido. “Que falta vai fazer ao PS neste Parlamento”, disse o líder parlamentar do PSD, acrescentando que esteve várias vezes “na dúvida se estava a ouvir um social-democrata ou um socialista”.

E realçou que enquanto “toda a bancada se levantou para o aplaudir, a primeira fila ficou sentada” ao ouvir quem foi “uma voz contra a geringonça”.

Pelo Bloco de Esquerda coube a Joana Mortágua uma intervenção em que defendeu o processo revolucionário e a Aliança Povo-MFA “travada no 25 de Novembro”. Defendendo que a comemoração da data serve apenas para quem pretende “a normalização do Estado Novo com a diabolização do PREC”, a deputada bloquista aventou que “talvez queira comemorar o 25 de Novembro quem sabe que não pode comemorar o 28 de Maio”, numa alusão à data de 1926 em que um golpe militar derrubou a Primeira República.

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