Adeus, MidCat. Olá, Corredor Verde. Portugal, Espanha e França com acordo para novo gasoduto

Consenso foi alcançado em encontro trilateral. Novo pipeline ligará a Península Ibérica ao resto da Europa, entrando por Marselha. PM fala em fim de "bloqueio histórico".

Um acordo que permite "ultrapassar um bloqueio histórico". Foi assim que, à chegada ao Conselho Europeu e já depois de ter reunido com o primeiro-ministro espanhol e o presidente francês, António Costa classificou o consenso a que os três países chegaram para uma interconexão de um gasoduto.

Inicialmente, o projeto destinava-se apenas a ligações para fornecer gás natural, vindo da Península Ibérica e chegando ao resto da Europa depois de entrar em França via Pirenéus. Mas, anunciou esta quinta-feira o primeiro-ministro (PM), o projeto atual abre também espaço ao abastecimento do chamado hidrogénio verde. Esta terá sido uma das chaves para desbloquear o acordo, uma vez que França tinha mostrado resistência quanto à construção de um gasoduto ibérico que passasse pelo país.

Segundo António Costa, o acordo alcançado permite "ultrapassar definitivamente o antigo projeto chamado MidCat e desenvolver um novo" chamado Corredor de Energia Verde que, segundo o PM português, "permitirá complementar as interconexões entre Portugal e Espanha, entre Celorico da Beira e Zamora, e também fazer uma ligação entre Espanha e o resto da Europa, ligando Barcelona e Marselha (BarMar), por via marítima".

Horas depois do anúncio de António Costa, o Presidente da República reagiu à notícia franco-ibérica. Na opinião de Marcelo Rebelo de Sousa, o acordo "é muito importante" e vai beneficiar toda a Europa. Segundo o chefe do Estado, estas novas interconexões podem mesmo ser "muito úteis" para a Europa central e do norte - regiões que, diz, "precisam urgentemente, com a aproximação do inverno, de uma solução alternativa [ao gás fornecido pela Rússia através do mar Báltico]".

A discussão sobre a construção de um pipeline ibérico que chegue à Europa através de território francês não é nova, surgindo em 2009, no governo de José Sócrates. Em 2014, o ex-primeiro-ministro e, na altura, presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso defendeu a ideia como uma forma de reduzir a dependência do gás russo e, em março de 2015, o seu sucessor, Jean-Claude Juncker, chegou mesmo a reunir-se com o ex-presidente francês François Hollande, o ex-PM português Passos Coelho e o ex-chefe do governo espanhol Mariano Rajoy, discutindo então o reforço de ligações ibéricas ao restante mercado energético europeu.

Mas para ultrapassar a resistência do lado francês o novo projeto passou agora a incluir o hidrogénio verde - algo que no MidCat não acontecia. Para o Presidente da República, este fator é positivo, uma vez que se "ultrapassou o problema que havia em relação ao gás, utilizando o gasoduto também para o transporte de hidrogénio verde", em que "França estava sobretudo interessada". "Prevaleceu o bom senso pois se era do interesse da Europa e, no fundo, era do interesse dos três, por haver divergências que não eram decisivas, não havia razão para não haver acordo", disse o Presidente da República, em Dublin onde está numa visita oficial à Irlanda.

Macron fala em "acordo histórico"

Com este acordo, Portugal, Espanha e França chegaram à cimeira com um argumento de peso para reclamar a "solidariedade" em particular da Alemanha, no contexto da crise provocada pelo aumento dos preços da energia. O francês Emmanuel Macron, que era até esta quinta-feira um forte opositor da ligação Ibérica, considerou que o "acordo histórico", representa um "ponto importante no contexto da solidariedade europeia". E o "objetivo" reclamado pela Alemanha "de ligar Portugal" ao resto da Europa "está conseguido".

Questionado à entrada sobre as acusações de falta de solidariedade que têm sido dirigidas à Alemanha [Macron tem criticado as políticas alemãs de combate à inflação], o chanceler Olaf Scholz rejeitou a crítica. "Somos os maiores contribuintes da Europa", respondeu. Lembrando que o seu país é responsável por "26% do orçamento [comunitário]", o chanceler afirma que a Alemanha "está a desenvolver muitos mecanismos de solidariedade, tal como na crise anterior". Scholz deu ainda o exemplo do Mecanismo de Recuperação e Resiliência, que a Alemanha "desenvolveu", considerando que se trata de "uma boa oportunidade para agir em conjunto, também nos tempos que correm". O chanceler alemão lembrou "que muitas dos verbas que foram desenvolvidas com o fundo de recuperação ainda não foram utilizadas" - algo que o governo português também afirma.

Mas o presidente francês que, há duas semanas, na cimeira de Praga, admitiu a possibilidade do país aceitar "as interligações", disse que o seu também deixou implícita a crítica ao governo alemão, dizendo que França também "era a favor de uma Europa solidária", num tempo de "crise" que exige respostas "conjuntas".

Os governos de Portugal, França e Espanha vão voltar a reunir-se a 8 e 9 de dezembro, em Alicante, à margem da Cimeira do Mediterrâneo, para discutirem a forma de executar o projeto. No encontro, explicou Pedro Sánchez, os três governos vão discutir, entre outros assuntos, "os prazos para o investimento" ou "o volume de recursos económicos" que serão mobilizados para concretizar a empreitada: "Uma exigência de que já falamos há vários meses, diria mesmo anos, ao governo francês", classificou.

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