"A cópia perde sempre para o original". Marcelo pede "bom senso" e avisa Montenegro e Moedas
"A cópia [PSD] perde sempre para o original [Chega] (...). É facílimo ir atrás das emoções, mas quando se vai atrás das emoções há dois problemas. Primeiro, a emoção muitas vezes não ser racional, segundo problema é aquele que é mais emocional [Ventura] ganha sempre".
Para bom entendedor, meia palavra basta? Neste caso, afirma Riccardo Marchi, investigador do Centro de Estudos Internacionais do Instituto Universitário de Lisboa (CEI-IUL), professor auxiliar convidado do ISCTE-IUL, doutorado em História Moderna e Contemporânea que se tem dedicado ao estudo das direitas radicais, "considerando a distância que temos das eleições, o discurso do Presidente da República está mais em linha com aquilo que é comportamento habitual dos partidos moderados de centro direita" ao contrário do que "está a ser dito por Carlos Moedas e Luís Montenegro".
As frases proferidas por Montenegro [ "É imoral uma sociedade onde as pessoas que trabalham chegam ao fim do mês e ganham menos do que pessoas que não trabalham"; "Temos que arriscar, procurar pelo mundo as comunidades que possam interagir melhor connosco, que se possam integrar melhor na nossa cultura, na nossa identidade"] e também a de Carlos Moedas ["Nós precisamos de mais pessoas, mas para isso temos de estabelecer realmente contingentes daquilo que precisamos"] surgem "num timing estranho porque tendencialmente, numa fase como esta, os partidos moderados de centro direita tendem a não abrir nenhuma janela de oportunidade para os seus concorrentes mais à direita para não dar essa impressão de que os estão a legitimar".
Assim, "neste momento", e com o que "é dito", é um discurso do líder do PSD que "beneficia claramente o Chega", assegura o investigador.
"Esta prática discursiva só faz sentido", explica, "quando um partido moderado assume abertamente um projeto de centro direita que inclui também a direita radical. Antes disso, o que faz é segurar o seu eleitorado dizendo "essa agenda política não tem nada a ver connosco". Não dar espaço à ideia de governabilidade porque pode provocar a saída de eleitores".
E a justificação é literalmente política e linear: "Os indecisos do PSD e do centro direita que podem ter algum fascínio pelo Chega perante um discurso como aquele de Montenegro e de Moedas podem, porque é normal que o façam, optar pelo Chega até porque é um discurso igual e viável, um discurso que entra na área dos bem comportados".
Ou seja, assegura, quase citando Marcelo Rebelo de Sousa, que "na dúvida [os eleitores] optam pelo original e não pela cópia".
Erro estratégico do PSD? "Só se existir alguma estratégia", responde Riccardo Marchi. "É que se é estratégia é extemporânea, está a ser feita no momento errado". E além do mais, acrescenta, é "uma estratégia muito conflituosa dentro do PSD. Duvido de unanimidade na direção do PSD sobre isto".
É , diz Ventura, apenas "uma parte do PSD que vai espernear (...) mas é 15% ou 10%, não é mais do que isso".
Luís Montenegro, por seu lado, confrontado com as palavras do Presidente disse "ter a certeza absoluta de que não se dirigiam a mim, porque o Presidente da República é uma pessoa sensata, que me conhece bem, os meus valores morais, éticos e humanos".
Questionado sobre se as suas declarações recentes revelam uma aproximação ao Chega respondeu assim: "Não".
Ventura tem outra leitura: "Para fora [Montenegro]diz: nós estamos a aproximar-nos do Chega, as posições são as mesmas, temos aqui a possibilidade de um entendimento (...). Mas "para dentro" o discurso é diferente para "acautelar os críticos".
Sobre a advertência de Marcelo [a cópia perde sempre para o original], Ventura colou, ainda mais, Montenegro às propostas do Chega: "Ele não está a tentar imitar-me (...), eu acho que ele pensa isto e, portanto, temos caminho para um entendimento".
Para Riccardo Marchi, o facto de o PSD não conseguir ter a "simplicidade" de dizer "um não definitivo" ao Chega é "surpreendente" porque "esse medo da extrema direita já não existe. O discurso deles [do Chega] moderou-se bastante, institucionalizou-se muito".
O que significa, na leitura do investigador, "que só o PSD perde, não há aqui ganhos eleitorais para o PS que está numa situação muito complicada. Os casos no governo, as demissões, a má governação são mais graves para um eleitor do centro do que o medo do Chega".
Marcelo Rebelo de Sousa pediu ontem "bom senso" a Montenegro e Moedas num "tema tão sensível" como os imigrantes considerando que "declarações muito emocionais feitas em cima de casos correm o risco de ser irracionais".
"O problema não é captar o sucesso da opinião pública, andar a disputar votos a ver quem é mais emocional nessa matéria - alguns dirão mais populista -, mas sim quem é que vê a questão com frieza em termos do interesse do país, do interesse de Portugal a curto, a médio e a longo prazo", afirmou.
E deixou um aviso: "Portugal tem emigrantes espalhados pelo mundo e portanto não pode ter dois pesos e duas medidas", referindo-se ao discurso de que "quando são os nossos são bons, quando são os outros são maus".
Carlos Moedas foi categórico, esta terça-feira: "Não aceito lições de ninguém nesta matéria, de ninguém".
Recordando que foi "emigrante, sou casado com uma imigrante, o meu sogro é marroquino, a minha sogra é tunisina", o autarca de Lisboa afirmou que o que existe no país "não é digno e é isso por aquilo que irei lutar. Irei lutar exatamente como político por essa dignidade da nossa imigração".