Rita Chantre / Global Imagens
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A “Constituição moral” do PS, segundo Pedro Nuno

Num discurso em seis andamentos – dos 50 anos do 25 de Abril, às ambições para o país, passando por um capítulo sobre a importância de “decidir e avançar” –, o líder do PS definiu o rumo programático do partido.
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Pedro Nuno Santos passou a campanha interna do PS a tentar evitar ficar colado à imagem de radical, suavizando o discurso sobre ideologia que o tornou tão popular nos últimos anos na geração sub-40 do partido. Mas no discurso de encerramento do 24.º Congresso do PS, não só não fugiu à que entende dever ser definição programática do Partido Socialista, como elencou uma “constituição moral” que, acredita, o distingue dos outros partidos e em especial da direita.

“Camaradas, Abril é a nossa referência, a nossa âncora moral”, declarou, começando por vincando que as conquistas da revolução não são irreversíveis e que “Abril não é só passado, é também futuro”.

E se muitos dos partidos que compõem o sistema partidário se reclamam herdeiros de Abril, Pedro Nuno Santos quis explicar o que diferencia o PS. “O que faz de nós socialistas democráticos? Para onde aponta a nossa bússola moral?”, perguntou, para responder sem hesitação: “Para mim, é claro: os valores morais da empatia, da cooperação, da generosidade, do respeito mútuo, da reciprocidade nos laços que mantemos com os outros e com os seus problemas, com os problemas da comunidade”.

Contra o individualismo da direita

Estes “valores primeiros”, como lhes chamou, fazem parte do que Pedro Nuno vê como a “constituição moral” do PS. Para o novo líder socialista, é este entendimento dos problemas como coletivos e a negação do individualismo competitivo que afastam o PS de partidos como o PSD, a IL e o Chega, que referiu sem nomear. “É também esta visão que nos separa da atual direita, que, ao defender o lema individualista do ‘cada um por si’ organiza o mundo em função de uma competição geradora de poucos vencedores e muitos vencidos”, disse.

Para Pedro Nuno Santos, essa forma de ver o mundo faz com que problemas como a precariedade, a crise na habitação, as baixas pensões ou os problemas na saúde e na educação não sejam só de quem os sente na pele, mas de toda a comunidade. “Cooperamos porque, para nós, os problemas de uns são os problemas de todos”.

O enunciado marxista

Para o novo líder do PS, a noção social-democrata de Estado Social é que melhor responde a este entendimento dos problemas sociais como coletivos. Pedro Nuno Santos acredita que o “Estado Social é a melhor tradução da ideia de comunidade”.

Sem citar, Pedro Nuno Santos recorreu a uma noção marxista para enunciar o que entende ser a melhor forma de organização da sociedade. “De cada qual, segundo sua capacidade; a cada qual, segundo suas necessidades”, é o princípio definido por Karl Marx, mas que não é estranho ao ideário socialista dos últimos anos.

Em 2016, num debate parlamentar com Assunção Cristas, António Costa explicava a sua ideia de comunidade. “Uma sociedade decente é uma sociedade onde cada um contribui para o bem comum de acordo com as suas capacidades, e cada um recebe de acordo com as suas necessidades”, disse Costa, assumindo que essa era a sua convicção. “Foi esta sociedade que eu aprendi na minha casa a acreditar”, acrescentou.

Agora, Pedro Nuno Santos usa uma formulação parecida, explicando que sua “ambição” para o país é de ter “uma comunidade de direitos e deveres onde todos contribuem em função das suas capacidades e beneficiam em função das suas necessidades”.

Fugir à média europeia

Neste elencar da sua visão para Portugal, fugiu ao jargão das contas certas (que reafirmou por voz própria ou através dos seus apoiantes ao longo de todo o Congresso) e também não perdeu muito tempo com a Europa.

A única referência que fez ao contexto europeu foi para vincar aquela que é a sua “ambição” para Portugal. “Não queremos um país na média europeia. Ambicionamos um país no topo: no topo da qualidade de vida, da segurança e da inovação”, declarou.

“Avançar com convicção e responsabilidade”

Pedro Nuno Santos voltou a insistir na ideia de que é um fazedor e de que a direita está presa ao imobilismo e à indecisão e a tentar apresentar-se como alguém que alia o ímpeto à responsabilidade.

A pressa que o fez precipitar-se, como ministro, no despacho sobre a localização do novo aeroporto é agora reapresentada como qualidade política. “A verdade é que não podemos esperar. Portugal não pode esperar. Queremos decidir. Queremos avançar”, disse, depois de criticar a direita para quem, entende, “decidir representa um pesadelo”.

Para Pedro Nuno, a direita (que não nomeou) está presa ao mantra que o mercado tudo resolve, por um lado, e por outro à sua “inexperiência e impreparação governativa”, depois de oito anos de PS no Governo. “É por isso que, depois de 8 anos na oposição, terão de estudar a solução para a alta velocidade (num país que já leva trinta anos de atraso em relação ao seu vizinho Espanha); depois de mais de 50 anos e 19 localizações, terão de criar um novo grupo de trabalho para estudar a localização de um aeroporto essencial para o desenvolvimento do país, para a sua adequada internacionalização”, atacou.

“Avançar com convicção e com responsabilidade. Com visão e com previsibilidade. Com ambição e estabilidade. Estabilidade não é inércia, não é paralisia, não é indecisão”, afirmou, deixando claras aquelas que são as suas prioridades: “defender as instituições democráticas, desenvolver e reformar o Estado Social e acelerar a transformação da economia”.

“Um Portugal Inteiro, que não se negoceia”

Para o fim, ficou o apelo ao voto, numa sala já conquistada, aplaudindo de pé o líder que voltou a mostrar saber mobilizar os socialistas com os seus discursos.

“Dia 10 de março, vamos continuar a avançar. Juntos porque sabemos que isolados e sozinhos não vamos a lado nenhum. Concretizando aqui e agora um Portugal Inteiro, que não se negoceia, nem se divide”. Ficou por explicar o que não quer negociar.

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