Os verões na banca de investimento já não são o que eram
Em vez da praia ou da esplanada, a sala de mercados passou a ser o "destino" forçado de férias dos analistas nos últimos verões. Primeiro foi a crise do subprime. Depois, a volatilidade da dívida soberana associada à quebra da liquidez nos mercados. De repente, os meses quentes deixaram de ser um período calmo. Não só se alterou o funcionamento interno das corretoras, como alguns ativos que antes ficavam esquecidos nas carteiras de investimento ganharam protagonismo.
"Há muito que os verões deixaram de ser épocas sossegadas e tem--se assistido a um aumento da volatilidade nos últimos anos", defende Pedro Lino, CEO da corretora Dif Broker, tal como constata Pedro Pereira Coutinho, administrador executivo da corretora Fincor, ao confirmar que "os últimos anos foram caracterizados por um forte aumento da incerteza nos mercados financeiros", já que "alguns eventos importantes ocorreram no verão, o que exponencia o seu impacto nos mercados, uma vez que este período do ano, nomeadamente o mês de agosto, é geralmente caracterizado por uma menor liquidez".
Mas o que mudou realmente nos mercados nos últimos verões? O diretor de negociação da GoBulling, João Queiroz, dá a resposta: "A maior sensibilidade dos investidores à dívida soberana, as perceções sobre riscos políticos, a evolução de variáveis macroeconómicas como o crescimento económico e o emprego, e a maior atenção à evolução de sectores mais sensíveis aos ciclos".
Já o diretor de investimentos do Banco Best, Diogo Serras Lopes, vai mais longe ao sublinhar que a crise financeira de 2008 "deixou cicatrizes profundas e é a principal causa, por exemplo, da atual crise de dívida europeia", levando o mercado a experienciar "picos de volatilidade e que, nesse sentido, algumas das #'regras' implícitas que guiavam os mercados têm vindo a ser revistas".
Não foram só as regras a serem revistas, já que as próprias corretoras e bancos de investimento têm vindo a implementar medidas que lhes permita estarem preparadas para qualquer surpresa negativa ou má notícia que surja e, inevitavelmente, proporcionar um maior acompanhamento dos seus clientes.
"Quando normalmente teríamos menos pessoas nas mesas de negociação durante o verão, procuramos acautelar aumentos de volatilidade mantendo os níveis normais, característicos do resto do ano", revela Duarte Caldas da IG Markets. No caso da Dif Broker, Pedro Lino adianta que "as férias tendem a ser mais repartidas, e em épocas que se prevejam de maior volatilidade existem reforços no acompanhamento dos clientes". Além de manter o apoio constante ao cliente, o administrador delegado da XTB, Francisco Horta, sublinha a componente da formação praticada pela corretora ao continuar a "realizar entre 25 a 30 seminários por semana, sob diversos temas relacionados com os mercados financeiros".
Além destes reforços, com o calor das crises, os analistas admitem que passaram a olhar com outros olhos para ativos que antes não dispensavam tanta atenção. "Alguns ativos, que no passado eram considerados de baixo risco, passaram a ser considerados de alto risco, pelo que necessitam de um acompanhamento de maior proximidade com o mercado e com as decisões económico-políticas que os poderão influenciar", reconhece Pedro Borges, diretor da Orey Financial. E que ativos são esses? A resposta é simples: as obrigações governamentais de países como a Grécia, Portugal, Espanha e Itália. No entanto, este olhar mais atento deixou de se resumir apenas aos meses quentes do verão para se estender ao ano inteiro.