Verão e a doença crónica do SNS
O Serviço Nacional de Saúde (SNS) sofre de uma doença crónica que todos os anos se agrava no verão, que é a falta de médicos de todas as especialidades nos meses mais complicados do ano, quando existe também uma grande concentração de população em algumas regiões do país, como o Algarve e todo o resto do litoral. Estamos em maio e não há ainda plano para o verão, o que naturalmente preocupa a ministra Ana Paula Martins, que no exercício das suas anteriores funções, de presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário Lisboa-Norte, composto pelos Hospitais de Santa Maria e de Pulido Valente, conhece bem esta dura realidade e está agora perante uma enorme responsabilidade no seu primeiro teste de desempenho na tutela.
Não vale a pena recordar os casos do passado, até porque todos temos memória do momento trágico em que a então ministra da Saúde, Marta Temido, se demitiu no final de agosto de 2022, após 1414 dias à frente da Saúde. Os últimos meses tinham sido de rutura do SNS, especialmente na Obstetrícia. Temido demitiu-se horas depois de ter sido noticiada a morte de uma grávida que estava a ser transferida por falta de vagas no Hospital de Santa Maria, em Lisboa.
Curioso que, na altura, no seu comentário habitual na CNN, Sebastião Bugalho considerou que “é impossível a política de saúde continuar quando o SNS está como está”. Mas continua. E hoje, Temido e Bugalho vão encontrar-se frente a frente na disputa das eleições europeias de 9 de junho, alinhando tanto pelo PS, como pela Aliança Democrática (AD), partidos estes que muitas responsabilidades têm na ineficiência do SNS nos últimos anos. É certo que nem Marta Temido está de volta, nem Sebastião Bugalho será chamado a discutir o estado atual da Saúde em Portugal, mas nenhum político pode ter má memória dos acontecimentos.
O diagnóstico da doença crónica do SNS está feito e todos o conhecem. Mas estamos a chegar ao verão e não há um plano, repito. De um ano para o outro, nada se aprende, nada se transmite, nada melhora?
Nesta edição do DN, a presidente da Federação Nacional dos Médicos, retrata um cenário de incerteza e de grande espectativa para os utentes e profissionais do Sistema de Saúde pago pelos contribuintes.
“Em maio, as grávidas continuam a andar de um lado para o outro, fazendo quilómetros, ou, em última análise, são enviadas para o setor privado, o que não foi sequer uma opção delas. Se é assim agora, em junho, já com as férias programadas, ainda vão faltar mais médicos e prevê-se cenário pior.” Joana Bordalo e Sá não tem dúvidas: “A resposta que for dada será da inteira responsabilidade do novo Executivo e da ministra Ana Paula Martins”. O que pesa também nas costas da task-force liderada pelo médico Eurico Castro Alves, a quem a ministra entregou a difícil missão de desenhar o Plano de Verão.
Mas a questão do SNS é tão mais profunda que, se não houver investimento público na melhoria das condições de trabalho e de valorização das carreiras de todos os profissionais de Saúde, os utentes irão pagar uma fatura ainda mais pesada, quando está em risco a vida de pessoas.
Diretor interino do Diário de Notícias