Uma outra União Europeia?

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Qualquer pessoa que tenha acesso às notícias saberá o que se passou entre os Presidentes dos Estados Unidos e da Ucrânia na sexta-feira. E qualquer pessoa que se sinta confortável com o sistema internacional baseado no direito, no multilateralismo e na diplomacia terá ficado aterrada com o que aqueles 15 minutos nos dizem sobre a posição americana no mundo.

Mas a mesma pessoa que estará aflita com as últimas 72 horas poderá lembrar-se da montanha-russa (e a expressão é particularmente adequada…) que temos vivido desde que Trump regressou à Casa Branca: guerras comerciais contra aliados e adversários; pretensões imperiais direcionadas ao Canadá, Dinamarca, Panamá e Palestina; abandono dos mecanismos multilaterais e asfixia financeira dos apoios aos países que mais precisam de ajuda; e comentários derrogatórios dirigidos aos amigos da América, acompanhados por elogios a Putin. Uma coisa se diga sobre Trump: não há sofisticação ou jogos de sombras. Ele diz o que pensa.

De facto, e como disse a Alta Representante da UE para a Política Externa, “o mundo livre precisa de uma nova liderança”. E acrescentou, que deveria ser a a União Europeia a assumir esse desafio. Mas, e ao mesmo tempo, os Primeiros Ministros da Hungria e da Eslováquia defendem publicamente que a UE deveria seguir o exemplo dos Estados Unidos e negociar o futuro da Ucrânia diretamente com a Rússia e a Eslováquia acrescenta que não apoiara Kiev “financeiramente ou militarmente”, aguardando-se o que pensará a Itália. Embora as reticências de Budapeste e Bratislava não sejam novidade, as posições de ambos aparecem na semana em que os Chefes de Estado e de Governo terão a primeira reunião formal da UE sobre a Ucrânia desde a reunião entre Washington e Moscovo há duas semanas.

A UE, que surge para impedir que uma nova guerra voltasse a destruir o continente, e face à incapacidade de construir uma estrutura política e militar coordenada, optou por seguir o caminho de uma integração económica de tal forma profunda que a paz estaria, igualmente, assegurada. E a História mostra que tinha razão.

No entanto, esse caminho significa que as instituições e processo de tomada de decisão não estão desenhados para a UE ser uma potência política e militar. No que diz respeito à presença externa da UE, são ainda os Estados que detêm a palavra final e se a Hungria ou a Eslováquia decidirem bloquear as decisões dos outros países, não há nada que possamos fazer.

Se a UE pretende assumir o papel de liderança das democracias do mundo terá que ser capaz de olhar para dentro de casa e mudar substancialmente, aproximando-se de uma federação com os elementos chave um Estado Soberano como a política externa, a defesa e o sistema fiscal. A UE é composta por democracias e se quisermos mudar a sua natureza, teremos de ter essa conversa com os europeus e, eventualmente, tomar as decisões difíceis de avançar com quem o deseje e deixar para trás quem não o queira.

Professor Convidado IEP/UCP e NSL/UNL

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