Uma mentira repetida não é uma verdade

Publicado a

Uma mentira recorrentemente usada torna-se uma verdade para os incautos, mas não deixa de ser uma mentira. É o caso da repetida ideia de que a Ordem dos Médicos é uma instituição corporativista que apenas defende os interesses da classe médica. Esta perceção, embora compreensível, está longe da realidade.

A Ordem dos Médicos é essencialmente o conjunto dos médicos e, por conseguinte, reflete o que se passa na profissão: um dia-a-dia com prioridade à defesa dos doentes, na procura dos melhores cuidados, no respeito pela vida humana. Sou médico e sei que tenho como missão, primeiro e acima de tudo, a de dar o melhor aos doentes. Sei também que a minha Ordem, de que sou dirigente, se empenha tanto nisso como eu.

Os médicos são uma das profissões mais reguladas e avaliadas do mundo. Cada médico, no seu trabalho diário, sabe que está sujeito a um escrutínio a que nenhum outro profissional está sujeito. Isto não acontece por acaso: todos os passos na formação médica estão devidamente definidos e avaliados, criando um espírito profissional que tem como consequência natural dar aos doentes o melhor que é possível.

A Ordem dos Médicos tem como missão fundamental regular o exercício da medicina, assegurando que todos os médicos cumprem os mais elevados padrões de competência técnica e conduta ética. Esta função reguladora não é opcional nem negociável – é uma responsabilidade legal e moral perante a sociedade portuguesa.

O papel da Ordem na formação médica é exemplar e reconhecido internacionalmente. Portugal forma médicos de excelência, procurados em todo o mundo, graças ao rigor do processo formativo estabelecido pela Ordem, desde a aprovação dos currículos das faculdades de medicina até à certificação das especialidades médicas. Os internatos duram entre 4 a 6 anos conforme a especialidade. Cerca de 1.500 médicos internos encontram-se atualmente em formação sob supervisão rigorosa, cumprindo programas formativos detalhados, realizando avaliações periódicas e defendendo currículos perante júris especializados. Este processo assegura que cada especialista está plenamente preparado para exercer com segurança e competência.

Quando um doente é tratado por um médico em Portugal, tem a garantia de que esse profissional cumpre todos os requisitos formativos, éticos e deontológicos exigidos. Esta segurança não existe por acaso.

O Conselho Disciplinar da Ordem desempenha um papel crucial na proteção dos doentes. Longe de proteger médicos incompetentes ou negligentes, este órgão investiga rigorosamente todas as queixas apresentadas, aplicando sanções sempre que necessário. Anualmente, dezenas de processos disciplinares resultam em advertências, censuras, suspensões e, nos casos mais graves, expulsão da Ordem – o que equivale à proibição definitiva de exercer medicina.

O Código Deontológico estabelece regras claras sobre a relação médico-doente, o sigilo profissional, a prescrição de medicamentos, os conflitos de interesse e muitos outros aspetos da prática médica. Qualquer violação destas normas é passível de processo disciplinar.

Portugal tem hoje uma das medicinas mais respeitadas da Europa, com indicadores de qualidade que nos colocam no topo dos rankings internacionais. Os nossos médicos são reconhecidos pela sua competência técnica e rigor ético. Esta reputação é o resultado direto do trabalho regulador da Ordem dos Médicos.

Vivemos tempos de populismos quase impossíveis de enfrentar com sucesso pela via da verdade, mas fica registado que é desadequado e injusto o epíteto de corporativista associado aos médicos na dimensão mais negativa do termo – o de uma prática de ocultação de negligência e erro e de defesa dos seus a qualquer custo.

A Ordem dos Médicos existe para que os portugueses tenham sempre a garantia de que, quando procuram um médico, estão nas mãos de um profissional competente, ético e devidamente qualificado. Esta é a sua missão primordial, e é por isso que merece o reconhecimento e o respeito de toda a sociedade.

João Dias Ferreira

Conselho Regional do Sul da Ordem dos Médicos

Diário de Notícias
www.dn.pt