Um problema de liderança

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A morte de Odair Moniz dividiu a sociedade portuguesa nos últimos dias, com um nível de polarização que não contribui para a construção de um país mais justo e seguro.

Precisamos de uma polícia capaz e bem equipada, que cumpra a sua missão com responsabilidade e que seja digna da farda que veste. Uma polícia que saiba estabelecer relações de proximidade e confiança com as populações locais, incluindo os moradores dos bairros ditos “sensíveis”. Uma polícia que tenha a formação e a experiência necessárias para saber quando deve usar, ou não, armas de fogo, sobretudo em situações de tensão. Uma polícia que assuma as suas responsabilidades quando as coisas correm menos bem e que resista à tentação de proteger os “seus” contra tudo e todos, mesmo quando são cometidos erros graves. Em suma, uma polícia que mereça a confiança dos cidadãos.

Acredito que, como em todas as profissões, os bons polícias estão conscientes da sua responsabilidade e são os primeiros a sentirem-se incomodados com o que aconteceu no Bairro do Zambujal.

Há dois anos, três fuzileiros provocaram a morte de Fábio Guerra, um jovem agente da PSP, após uma breve altercação na noite lisboeta. No dia seguinte, o almirante Gouveia e Melo juntou as tropas e fez um discurso duríssimo, onde deixou claro que não quer “arruaceiros” na Marinha, nem militares “sem valores”.

No mesmo dia, telefonou à família de Fábio Guerra para lhe apresentar as condolências em nome da Marinha, com “um nó na garganta”. E deu ordens para que os três fuzileiros recolhessem à base, para sua própria segurança, até serem detidos pelas autoridades. Com esta forma de agir, Gouveia e Melo foi criticado internamente por, aparentemente, ter deixado cair os “seus”, mas a mensagem foi clara para todos e a honra da Marinha e dos seus militares foi preservada.

Isto foi exatamente o contrário do que o comando da PSP fez nos dias que se seguiram à morte de Odair Moniz, com um comunicado que não correspondia à verdade e uma atuação, no terreno, que deixou muito a desejar (como demonstra a visita noturna, com passa-montanhas, à família enlutada).

Se a PSP se tivesse limitado a dizer que lamentava a morte de Odair Moniz e que as circunstâncias da mesma estavam a ser investigadas, abstendo-se de dizer - erradamente - que a vítima estava armada, provavelmente as coisas ter-se-iam passado de forma diferente. Tal como os agentes envolvidos têm direito à presunção de inocência, também Odair Moniz deveria ter tido igual tratamento por parte da direção da PSP. No fim do dia, isto resume-se a um problema de liderança, ou de falta dela.

Por fim, agora que a situação nos bairros periféricos da capital acalmou, é hora de procurar perceber o que correu mal e o que temos de fazer, como país, para evitar que estes tumultos se repitam, quer do lado da prevenção, quer da eficácia do controlo policial.

Diretor do Diário de Notícias

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