Um Governo para um novo ciclo
O novo Governo liderado por Luís Montenegro é, como se esperava, de continuidade, com duas ou três surpresas e igual número de saídas. É, tal como o anterior, um Governo de combate, liderado por um primeiro-ministro que sabe que, no atual contexto, a diferença entre viver ou morrer estará na capacidade de continuar numa espécie de campanha eleitoral permanente, com o anúncio de medidas atrás de medidas, em várias áreas.
As grandes diferenças face ao que tivemos no primeiro Governo de Montenegro não estarão na composição ou na estratégia seguida, mas sim em dois fatores fundamentais, que o primeiro-ministro não poderá ignorar: por um lado, a envolvente macroeconómica não será tão favorável como a que existia no ano passado. A guerra na Europa não dá sinais de terminar e as tarifas comerciais impostas pelos Estados Unidos terão impacto no crescimento global, incluindo em Portugal, que é, como sabemos, uma pequena economia aberta ao mundo.
Por outro lado, as medidas que o Governo tem anunciado neste clima pré-eleitoral em que parecemos viver de forma permanente - como os aumentos salariais para diversos grupos profissionais e o Complemento Solidário para os pensionistas -, prometem conduzir as contas públicas de volta aos défices, dentro de relativamente pouco tempo. Por outras palavras, a festa foi bonita, mas o tempo das vacas gordas pode estar prestes a terminar. O que, a acontecer, terá consequências profundas no plano político.
A outra grande diferença é o crescimento do Chega, que se tornou a segunda força política e está a trabalhar para se poder afirmar como uma verdadeira alternativa de governo, dentro de um ou dois anos. Se a situação económica se agravar nos próximos tempos, Montenegro terá de tomar medidas difíceis, tendo pela frente André Ventura, um líder político que já demonstrou ser extremamente eficaz no que diz respeito a tirar partido do descontentamento popular. Se Ventura consegue 22% dos votos num ambiente macroeconómico benigno, quanto conseguiria se surgisse uma crise económica e o Governo tivesse de tomar medidas difíceis?
Daí que faça sentido, na perspetiva de Luís Montenegro, formar um Governo de combate, com um núcleo duro escolhido a dedo e com uma forte ênfase em duas pastas que poderão ser muito relevantes, nos tempos que se avizinham. A primeira será a Economia, que fica sob a alçada de Castro Almeida e aliada à Coesão Territorial, num claro sinal de que a prioridade será a execução atempada das verbas do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), para fazer aquilo que o Orçamento do Estado deixou de poder fazer de há alguns anos para cá, leia-se, investimento público. A outra é a pasta da Reforma do Estado, que estará nas mãos da grande surpresa deste Governo, Gonçalo Saraiva Matias. Acabar com a burocracia e reduzir o desperdício não só contribui para o crescimento da economia, como ajuda a imunizar o eleitorado contra discursos fáceis e populistas.
Diretor do Diário de Notícias