Ucrânia num impasse
A guerra na Ucrânia prossegue sangrenta e injusta com os russos a avançar lentamente. Neste último mês, contudo, começam a surgir nos círculos do poder anglo-americano algumas opiniões, ainda isoladas, a favor de negociações de Paz. Que argumentos avançam? Vejamos os seis principais.
Primeiro - Evitar a aniquilação das forças armadas ucranianas. Desde logo a constatação que se as armas são importantes na guerra, quem as maneja e dispara é indispensável. As forças ucranianas têm vindo a sofrer perdas consideráveis. O próprio Presidente Zelensky admitiu números da ordem dos 150 mortos e 800 feridos dia, ou seja cerca de 1.000 soldados por dia fora de combate, ie. 30.000 por mês. A guerra de atrito que os russos tem vindo a praticar está a dizimar as forças ucranianas. Seria então o momento de negociações para evitar o colapso das forças armadas ucranianas. Lembremos que um dos objetivos de Putin era a desmilitarização da Ucrânia.
Segundo - Evitar maiores conquistas de território pelos russos. A cada dia os russos tem vindo a conquistar maiores parcelas de terreno e não é crível que os ucranianos, empenhados como estão em defender o que lhes resta, os consigam recuperar.
Terceiro - Evitar o aprofundamento da crise económica americana e inglesa. A inflação, o aumento do preço da energia, a dificuldade de abastecimento alimentar e de outros produtos, a ausência de turistas russos, estão a provocar uma crise nas economias de países aliados dos Estados Unidos criando animosidade contra os americanos - que tomam decisões que depois são pagas em sacrifícios pelos seus aliados. Veja-se o caso do Egito, um dos maiores amigos dos EUA no Norte de África que poderá ter dificuldades de abastecimento de cereais.
Quarto - Estancar os gastos colossais com o suporte da Ucrânia, cuja economia está basicamente paralisada, e com o fornecimento de ajuda militar, técnica, diplomática e outra. A saída das empresas americanas da Rússia significou também uma significativa redução da sua dimensão e alcance.
Quinto - Ativos estratégicos, como o dólar e a dominação do sistema financeiro internacional, postos em causa sem contrapartida visível. A Ucrânia não valeria estes ativos. Na verdade a Rússia e outros países parecem conseguir manter o seu comércio sem recurso ao dólar e ao sistema de pagamentos controlado pelos americanos, criando-se assim pela primeira vez um desafio a este domínio estratégico.
A estes poder-se-ia acrescentar um sexto que é a perda de prestígio dos Estados Unidos. Se a Rússia chegar ao fim da guerra com a anexação do Donbass ou de territórios ainda maiores, isso constituirá um sério abalo para o prestigio norte-americano incapaz de proteger a integridade territorial de um aliado tão próximo e pelo qual tudo tem feito, incluindo colocar em risco um poderoso instrumento de poder como são a sua própria moeda e o sistema de pagamentos internacionais que domina e são hoje a infraestrutura base das relações comerciais internacionais.
Os recentes desentendimentos entre Biden e Zelensky mostram que a estratégia americana está a mudar e que se procura já um bode expiatório para o que vier a acontecer.
Poderão estas vozes, que vem de dentro do sistema de poder anglo-americano, ser ouvidas? Entretanto na Ucrânia vão morrendo mais pessoas, sacrificadas no altar dos interesses das grandes potências.