Tudo começa na educação tecnológica

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A maior diferença entre “dominar” a onda da transformação digital ou “sobreviver” ao vortex de informação e dados atual é definido numa palavra apenas: capacitação. E, no caso da inteligência artificial, capacitar não é uma escolha, é uma necessidade.

Um estudo bastante recente, levado a cabo pela Salesforce, indica que a maioria dos profissionais não tem a formação adequada para lidar com a Inteligência Artificial, no seu dia a dia. E há mesmo quem afirme que não confia nesta tecnologia. Em Portugal, em particular, e segundo o Instituto Nacional de Estatística, as empresas portuguesas usam pouco IA - apenas 8%.

Olhando para estes dados, é interessante pensar sobre a forma como a Inteligência Artificial, e a própria GenAI, é apresentada: uma tecnologia disruptiva que está a mudar completamente a forma de trabalho, a sociedade e o processo de tomada de decisão. Mas se ainda existem tantas pessoas que não estão, efetivamente, a par do verdadeiro potencial desta área, quais as razões?

Acredito que a principal razão se prende com a falta de literacia e conhecimento das áreas ligadas à IA, gerando desconfiança, desinformação e medo. Premissa base: a implementação das novas tecnologias relacionadas com IA só é eficaz quando todos os envolvidos entendem o processo, as suas variáveis, as considerações éticas e o seu objetivo.

As organizações são os espelho da sociedade, por isso dou um exemplo prático em ambiente empresarial. Uma empresa conclui, pelos seus relatórios de produtividade, que pode tornar o seu trabalho mais rápido e de acordo com os objetivos de vendas se conseguir realizar uma triagem inicial a quem os contacta, percebendo se se tratam de leads que se podem tornar negócio. Este é um processo que, por si só, exigiria alocação de recursos humanos e a formação de um colaborador especializado para esta função.

Problema #1: é uma função rotineira, com pouco espaço para criatividade ou “human-touch”. Contudo, a empresa pode optar por este caminho,  tendo, assim, de investir em formação e, em última instância, tempo para tornar todo este processo eficiente, sofrendo também com um custo de oportunidade grande por estar a alocar recursos humanos escassos.

Problema #2: É um processo que demora, e que tem alguma probabilidade de falhanço, principalmente por desmotivação do colaborador que passa a estar a realizar uma tarefa rotineira, sem qualquer tipo de criatividade.

Com recurso a IA, a empresa pode investir numa solução de chatbot, perfeitamente especializada e alinhada com os objetivos de negócio, ficando com o seu problema resolvido “chave-na-mão”. Não precisa de alocar recursos financeiros de forma contínua, ganha tempo, torna o trabalho mais produtivo e pode alocar os seus recursos de vendas aquilo que mais interessa: desenvolver relações com os clientes e criar leads mais humanas. Porém, é importante que a empresa, e as pessoas que aí trabalham, entendam como funciona este chatbot. Como é que as pode ajudar? Qual é, afinal, o processo tecnológico por detrás da identificação de leads qualificados? Para onde vai a informação? Sem entender este tipo de
aspetos, a empresa não sabe que serviço está a contratar nem irá retirar benefício de um bot que é considerado um corpo estranho na empresa.

Talvez nem consiga diferenciar um chatbot que pode fazer a diferença de um simples “assistente virtual” que recolhe apenas informação e não a sabe trabalhar. Neste caso, é esta compreensão da tecnologia que faz diferença e ao final do dia cabe às organizações capacitar as suas pessoas de um conhecimento básico em inteligência artificial. Claro que não devem ser todos experts em tecnologias avançadas para conseguirem gerir negócios e garantir produtividade e bons resultados. Não é isso que se espera nem isso que se quer. Espera-se, sim, que exista capacitação, educação, compreensão daquilo que funciona e daquilo que é especializado ou não.

E para a sociedade, o que devemos fazer?

Por um lado, é cada vez mais importante estarmos perto de desenvolvimentos e redes que estão próximas da inteligência artificial. Quem aposta num percurso académico e/ou profissional na área de Data Science, Inovação e IA deve saber escolher os melhores locais para a sua evolução. Os melhores cursos (com os recursos mais práticos), as redes de
networking mais apropriadas (com os profissionais éticos que sabem os benefícios e riscos), as atividades extracurriculares que melhor permitem acompanhar as tendências, bem como incentivar o pensamento crítico.

Incentivo todos aqueles com quem trabalho e a quem dou aulas a manterem-se atentos a eventos tecnológicos, a não perderem as mais recentes inovações do setor e a estudarem para conseguirem oferecer ideias verdadeiramente incríveis.

Depois, é importante também olhar para o paradigma atual da educação.

Estão as escolas prontas para garantir literacia digital? Que iniciativas estão a ser feitas para levar a sociedade (e o futuro da sociedade, aqueles que estão agora a ocupar as salas de aula) a sentir entusiasmo pelo contexto atual, a querer participar ativamente na transformação tecnológica (diária) que vivemos? A literacia vai além de saber usar o computador, ou fazer testes pelo tablet.

Espera-se que exista, realmente, uma orientação para a inovação e para que a inteligência artificial beneficie todos.

Cada um tem a sua vocação, disso não há dúvidas. Mas todos nós fazemos parte deste aminho tecnológico, em todos os aspetos. É impossível fugir dele. E porquê fugir? As descobertas de inteligência artificial não irão voltar para trás. A formação é mesmo essencial.

Para todos. Porque a nossa humanidade é definida pela nossa capacidade de nos adaptarmos a todos os desafios que a tecnologia nos coloca.

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