Trump vs. Hitler

Publicado a
Atualizado a

Donald Trump ainda não tomou posse, mas já pôs o pé em ramo verde. Na última semana, entreteve-se a abalar todos os fundamentos da ordem internacional, disparando em várias direções e sugerindo preocupantes avanços geopolíticos: fechar a guerra da Ucrânia, entendendo-se com Putin; tomar o controlo do Canal do Panamá; anexar a Gronelândia, que é território de uma nação europeia; e questionar a soberania do seu vizinho Canadá. Adolf Hitler não teria feito melhor.

Comparar figuras políticas em diferentes contextos é sempre arriscado e, nalguns casos, pode sugerir um certo sensacionalismo histórico. Ainda assim, encontro um paralelismo entre as figuras de Trump e de Hitler, que me proponho explorar neste breve texto.

Há, desde logo, uma semelhança no estilo retórico e de liderança. Hitler ascendeu ao poder tirando partido das frustrações e dos medos da Alemanha pós-Primeira Guerra Mundial, explorando o nacionalismo para mobilizar as massas. A sua narrativa chegou ao cidadão comum através da oleada máquina de propaganda desenhada por Joseph Goebbels.

Já Trump ganhou força política ao apelar a uma base de eleitores desiludidos, enfatizando slogans como “Make America Great Again”. De forma a chegar diretamente aos seus seguidores, contornando a moderação jornalística dos meios de comunicação tradicionais, usou e abusou das redes sociais, nomeadamente do Twitter (X), onde fez circular volumes incomensuráveis de fake news geradoras de ansiedade e descontentamento.

Como manda a cartilha dos (aspirantes a) ditadores, ambos criaram os indispensáveis bodes expiatórios. Hitler culpou judeus, comunistas, ciganos, homossexuais e outras minorias pelos problemas da Alemanha.

Por seu lado, Trump lançou uma cruzada contra os imigrantes, com especial incidência nos mexicanos, mas também contra outras minorias étnicas e religiosas, como os muçulmanos, identificando-os como a raiz dos problemas sociais e económicos dos Estados Unidos.

O enfraquecimento do regime e das instituições democráticas é outra marca comum das duas personalidades. Hitler teve a oportunidade de ir mais longe, transformando a Alemanha num estado totalitário.

Trump tem minado os mais basilares fundamentos e símbolos da democracia americana, atacando a imprensa, descredibilizando a Justiça, questionando resultados eleitorais e incentivando a desconfiança nos processos políticos.

A novidade a que estamos agora a assistir é a deriva geopolítica expansionista de Trump, que indicia querer disputar territórios soberanos como a Gronelândia, o Canadá ou o Panamá, em nome da segurança do seu país. Este novo nível do nacionalismo americano remete para o conceito hitleriano do espaço vital (Lebensraum) da “Grande Alemanha”, em nome do qual os germânicos invadiram e anexaram todos os países limítrofes.

Estamos certamente (ainda) no campo da comparação especulativa. Todavia, a História ensinou-nos que, não raras vezes, a lealdade intensa e musculada dos seguidores deste tipo de figuras carismáticas pode gerar espirais que desafiam as fronteiras do pensamento político estabelecido, rompendo equilíbrios e prometendo tragédias.

Professor catedrático

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt