Trump, a Gronelândia e… os Açores

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A semana passada foi dominada pela conferência de imprensa em que Donald Trump anunciou que deseja integrar o Canadá nos Estados Unidos, alterar o nome do Golfo do México para Golfo da América, recuperar o controlo do Canal do Panamá e comprar ou dominar a Gronelândia, não afastando a possibilidade de, para tanto, utilizar as Forças Armadas. Partindo do princípio de que devemos ouvir e considerar o que diz o presidente da maior potência do mundo e um aliado tradicional, estas declarações são problemáticas para as democracias do mundo e poderão ser particularmente preocupantes para Portugal.

Para o mundo, o que o próximo presidente parece estar a dizer é que os Estados Unidos deixarão de assegurar um sistema internacional que tem permitido desenvolver as organizações e o direito internacionais que, com mais resultados positivos do que erros e falhas, organiza o mundo desde 1945. Se esse sistema acabar, teremos de, numa altura em os modelos autoritários estão a afirmar-se e os modelos supranacionais e democráticos atravessam várias dificuldades, encontrar uma outra forma de convivência entre Estados. Não será fácil e não temos garantia nenhuma de que o resultado desse exercício seja igual ou melhor do que o que temos.

Para Portugal, a posição do presidente-eleito coloca dois desafios diferentes e ambos sérios. Por um lado, somos, por tradição e por necessidade, um país que depende do multilateralismo e do direito internacional para promover as suas políticas e posições. De facto, num mundo anárquico e sem regras, dificilmente seríamos capazes de proteger os nossos interesses vitais.

O segundo desafio surge das explicações que Trump apresentou para justificar a posição face à Gronelândia que, importa recordar, faz parte da Dinamarca e, tal como o Canadá, é uma democracia e um Estado-membro da NATO. Diz o presidente-eleito que a Gronelândia é fundamental para a segurança económica dos Estados Unidos, pois controla as rotas de navegação do Ártico e tem um conjunto substantivo de recursos naturais e matérias-primas necessárias para a revolução digital.

O que é que isso tem a ver connosco? Um dos elementos mais importantes para a economia e para a segurança é a informação e 99% dos dados que percorrem o planeta são transportados por cabos submarinos, incluindo 10 biliões de dólares em transações financeiras diárias. Ou seja, quem controlar os cabos submarinos, controla a informação e o comércio. E se olharmos para o mapa, veremos que os cabos que atravessam o Atlântico Norte passam nas águas territoriais dos Açores ou na sua vizinhança. De facto, as mesmas razões que justificam a posição de Trump face à Gronelândia, aplicam-se aos Açores. Não, estas coisas não acontecem só aos outros…

Professor Convidado IEP/UCP e NSL/UNL

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