TAP: a privatização possível

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O Governo avançou com a privatização da TAP, com um modelo que se poderia considerar a solução possível e aquela que assegura maior margem de manobra, tanto no plano político como na negociação com os potenciais compradores. Há três aspetos que comprovam este facto.

Em primeiro lugar, a solução que foi encontrada, de privatização parcial mas sem fechar a porta a uma eventual segunda fase, num futuro mais ou menos próximo, é a única que poderá passar pelo crivo dos dois maiores partidos da oposição, o Chega e o PS. Ambos são contra a venda da totalidade do capital e apenas aceitam uma privatização parcial se o Governo assumir o ónus da mesma. Se algo correr mal, será responsabilidade do Executivo.

Veremos, porém, se o Chega e o PS vão viabilizar a operação, sobretudo o primeiro, que pretende que a decisão passe pelo Parlamento. Já o PS, pela voz do seu líder, disse ontem que aceita a privatização se esta permitir recuperar os 3,2 mil milhões que o Estado injetou na TAP, a médio e longo prazo. Ao contrário do que se poderia pensar, José Luís Carneiro não se enganou nas contas, nem sugeriu que a TAP valha mais que a Air France. Simplesmente passou a responsabilidade para o Governo, que é quem tem o dever de saber se uma TAP com gestão privada e inserida num grande grupo internacional terá condições para distribuir mais de dois mil milhões de euros em dividendos, num futuro previsível. De certeza que não tem, a menos que falemos de várias décadas, ao estilo do Fundo de Resolução, mas terá de ser o Governo a responder a essa questão e José Luís Carneiro viverá bem com isso.

Em segundo lugar, a solução aprovada pelo Governo dá-lhe a flexibilidade necessária para negociar um acordo parassocial com o potencial comprador onde ficarão definidas questões como o papel do Estado no conselho de administração e serão elencadas as decisões que vão necessitar de aprovação em assembleia-geral de acionistas, onde o Estado terá a maioria.

O Governo está a fazer tudo para não se comprometer nestes pontos, de maneira a ter a maior margem negocial possível na fase de elaboração do acordo parassocial. De igual modo, o Executivo mostrou abertura para falar com o Tribunal de Contas para tentar fazer com que a TAP deixe de estar sujeita ao controlo desta entidade. E deixou claro que não haverá limites aos salários dos gestores que o investidor privado escolher para a TAP, de maneira a que possam recrutar livremente no mercado. Serão temas relevantes para os potenciais interessados, tal como noticiou o DN esta semana.

Em terceiro lugar, o Governo alargou o leque de potenciais interessados, ao admitir investidores de fora da Europa e consórcios que contem com empresas de outras áreas, incluindo capitais nacionais. Ao fazer isto, aumentou o poder negocial face aos três grandes grupos europeus - Lufthansa, Air France-KPG e Iberia-British Airways - que eram tidos como favoritos na corrida. E abriu novas possibilidades, como a eventual venda a uma transportadora aérea norte-americana ou dos Emirados.

A má notícia é que esta solução acarreta um grande risco que já se materializou em tentativas anteriores de privatização. Por muito bem negociado que seja o acordo parassocial, será extremamente difícil evitar situações em que a gestão privada choque com o acionista maioritário, que será o Estado, prejudicando o futuro da companhia.

Além disso, com a gestão entregue aos privados, o Estado - leia-se, o Governo - terá dificuldade em sustentar que está a defender o interesse público na TAP, sobretudo quando forem tomadas medidas difíceis ou politicamente impopulares, que toquem nos muitos interesses instalados em volta da TAP. E, por outro lado, o acionista privado poderá sempre desculpar-se com a presença do Estado, quando não conseguir tomar decisões no interesse da empresa.

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