Superar a lacuna na implementação do projeto de desenvolvimento
As reuniões da primavera do Banco Mundial desta semana darão início à reposição da Associação Internacional de Desenvolvimento – a maior fonte de financiamento do desenvolvimento para as pessoas mais pobres do mundo. A realização do evento peca por tardia. Com a pobreza extrema, as alterações climáticas e o agravamento da crise da dívida a comprometerem o progresso rumo aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas, a AID é mais importante do que nunca.
Para muitos países beneficiários, a AID representa frequentemente a única fonte fiável e sustentável de financiamento do desenvolvimento. Para os doadores, oferece uma boa relação qualidade/preço: por cada dólar mobilizado através da AID, os países beneficiários recebem cerca de 4 dólares para apoiar o seu desenvolvimento. Mas à medida que os governos procuram uma reposição ambiciosa dos recursos da AID neste ano, devemos maximizar o impacto dos dólares da AID já em circulação.
Com a expectativa de que até dois terços das pessoas que vivem na pobreza extrema residam em países frágeis e afetados por conflitos até 2030, a implementação bem-sucedida de projetos de desenvolvimento apoiados pela AID em contextos desafiadores é vital. No entanto, como mostra uma nova investigação realizada pelo Comité Internacional de Resgate (CIR), o desembolso de fundos da AID para projetos que afetam positivamente a vida das pessoas tem de superar grandes barreiras. Durante um ciclo recente da AID, cerca de 50% dos seus compromissos de financiamento em países menos desenvolvidos afetados por conflitos não foram desembolsados. A investigação do CIR destaca a capacidade institucional limitada, especialmente em países afetados por conflitos.
Estas lacunas podem ser explicadas em grande parte pelo baixo limiar de risco do Banco Mundial e por um modelo operacional que funciona principalmente com e através dos governos nacionais. Este modelo pode levar a atrasos e suspensões de projetos, especialmente em países afetados por conflitos, sobretudo devido à capacidade institucional limitada e à falta de conhecimentos e experiência relevantes.
Isto destaca um ponto crucial. Demasiadas vezes, as discussões sobre objetivos de desenvolvimento como os ODS centram-se em duas lacunas, no financiamento e nas políticas, ao mesmo tempo que não reconhecem a lacuna de implementação. Contudo, as finanças e a política por si só não podem superar os estrangulamentos na implementação, a assistência técnica e outros apoios também são vitais. Este é um foco fundamental do Gabinete das Nações Unidas de Serviços para Projetos (GNUSP), que liderei durante exatamente um ano.
O GNUSP opera em mais de 80 países em nome do sistema das Nações Unidas e de parceiros globais, como o Banco Mundial. A maior parte do nosso trabalho ocorre em ambientes frágeis e afetados por conflitos, e somos um canal importante para a
implementação de projetos financiados pela AID, entre outras iniciativas humanitárias, de desenvolvimento e de paz e segurança. Também ajudamos os governos beneficiários a aproveitar ao máximo os fundos da AID que recebem, trabalhando em conjunto com outras agências da ONU para acelerar a execução dos projetos, superar atrasos e garantir os resultados pretendidos.
A nossa experiência, especialmente em zonas de conflito, demonstra o impacto positivo esmagador que os fundos da AID podem ter quando conseguimos uma implementação correta. No Sudão do Sul, por exemplo, a AID e as agências da ONU trabalharam em conjunto para implementar um projeto centrado em aumentar o acesso das famílias pobres e vulneráveis a oportunidades de rendimento temporário. Desde então, a situação de segurança melhorou o suficiente para começar a devolver a plena propriedade dos projetos, que atingiram mais de 420 000 pessoas em dez regiões, ao governo do Sudão do Sul e às comunidades locais.
Em Moçambique, o GNUSP está a trabalhar em conjunto com o Banco Mundial e o governo nacional para restaurar os serviços básicos para 680 000 pessoas que foram deslocadas internamente como resultado do conflito no norte do país ou que acolhem comunidades deslocadas e repatriados.
No Iémen, onde o Banco não pode trabalhar através do governo, o Banco Mundial, com financiamento da AID, trabalhou com parceiros da ONU no terreno para proporcionar acesso a serviços básicos. Um projeto, implementado pela UNICEF, pela Organização Mundial de Saúde e pelo GNUSP, prestou serviços de saúde e nutrição a mais de oito milhões de iemenitas em mais de 2000 locais e recorrendo a equipas móveis de sensibilização. Esse envolvimento ajuda a preservar os ganhos de capital humano anteriores à crise e um certo grau de estabilidade institucional, ambos essenciais para a eventual recuperação pós-conflito.
Esta capacidade de implementar projetos mesmo em zonas afetadas por crises, incluindo zonas de conflito como o Iémen, é essencial para cumprir os ODS. Mas o mesmo acontece com os esforços para prevenir crises. Estas são intervenções particularmente rentáveis: por cada dólar investido na prevenção, são poupados cerca de 16 dólares a longo prazo. Em qualquer intervenção, o tempo é fundamental. Tal como o Banco Mundial salientou, é imperativo investir precocemente o financiamento da AID, especialmente em contextos frágeis.
O recém-ampliado Conjunto de Ferramentas de Preparação e Resposta a Crises do Banco Mundial promete ajudar os países a responder a emergências, desde conflitos a desastres relacionados com o clima, e a preparar-se para choques futuros. Por exemplo, inclui medidas que permitiriam aos governos realocar até 10% do financiamento não desembolsado do Banco Mundial para a resposta a emergências. Isto, juntamente com outras ferramentas e mudanças bem-vindas no âmbito da agenda de evolução e reforma do Banco, oferece a flexibilidade necessária aos países em crise.
As reuniões da primavera do Banco Mundial desta semana oferecem uma oportunidade valiosa para refletir sobre o papel crítico da AID como fonte de esperança para os mais necessitados, e para o compromisso de aumentar ainda mais o seu impacto. Isso significa não só reabastecer os seus recursos, mas também reconhecer e colmatar as lacunas de implementação.
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