Sem mecanismos de capital e liquidez, não há PRR que acelere

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As empresas inovadoras são, na sua essência, de pequena ou média dimensão e com capacidade limitada financeira para se impor. Valem essencialmente pelos seus projetos em setores de enorme potencial e, para os quais, a União Europeia canalizou enormes meios na fase de pós-pandemia, através dos programas Next Generation EU e que, em Portugal através do Programa de Recuperação e Resiliência, pode atingir os 20,6 mil milhões de euros, sendo que cerca de metade deste reforço será dirigida à inovação empresarial.

A importância da implementação do PRR para transformar Portugal e criar tecido empresarial na nova geração é crucial, sobretudo para dirigir intervenção estrutural em segmentos cirúrgicos de atuação como a transição climática ou a inovação digital, beneficiando empresas nacionais que queiram posicionar-se como futuros campeões nestes setores e permitir-lhes que possam também criar empregos e uma nova escala de valor para Portugal.

A Europa como um todo mas Portugal em particular são mercados onde não existe uma cultura de capital de risco sofisticada para startups. Apesar da cultura de empreendedorismo ter vindo a conquistar mais visibilidade em Portugal - fruto também do mediatismo que algumas iniciativas de peso, como o caso do Websummit  vão tendo -, a verdade é que continuam a faltar alguns mecanismos ao nível da capitalização dos projetos que possam espoletar uma verdadeira revolução ao nível da mentalidade empreendedora portuguesa,  e soluções que permitam aos pequenos projetos ter melhores condições de liquidez nas fases iniciais da sua vida - a chamada pista de descolagem, ou runway.

No âmbito da mentalidade de assumir risco por parte das sociedades de investimento nacionais há uma questão cultural histórica europeia e nacional que tem a ver muito com a lógica da gestão de risco do balanço bancário, e que assenta muito na capacidade mais imediata de geração de fluxos de caixa.

Nos novos setores nem sempre a monetização é imediata, e a assunção do risco dos projetos não pode ser aferida da mesma forma que para setores tradicionais. Não vai ser possível aos investidores acertar em todas as oportunidades, sobretudo em áreas de inovação onde, por vezes, é necessário adaptar o projeto inicial.

Na Europa, e em Portugal necessitamos de melhorar esta cultura, e de ficarmos mais próximos do que vemos nos Estados Unidos, ou até na Ásia.

Por fim, e talvez mais importante, é a necessidade de criar melhores soluções de liquidez imediata para as empresas que já estão dentro de programas e agendas mobilizadoras do PRR. Estas muitas vezes detêm contratos-programa plurianuais, destinados a desenvolver e reter talento humano, mas sofrem na gestão diária, porque a distribuição dos apoios são muitas vezes burocráticas, e detêm atrasos relevantes nos pagamentos dos dinheiros dos incentivos públicos.

As empresas de pequena e média dimensão não têm capacidade de caixa para lidar, numa fase inicial do seu projeto, com a espera. E isso leva a que muitas vezes tenham de ir levantar capital as capitais de risco demasiado cedo - porque são negócios que levam tempo a descolar - ou a assumir endividamentos em condições demasiado desajustadas da sua realidade financeira - que criam um paradoxo: a de termos empresas com milhões atribuídos pelos incentivos públicos, mas estranguladas como se estivessem em insolvência.

A estabilidade de tesouraria é necessária para criar estabilidade de vida nas startups. E devemos dar oportunidade aos que não têm fortuna já feita, para que a possam criar e serem um Bill Gates ou Elon Musk português. O empreendedorismo é afinal de contas, o melhor e mais genuíno elevador social que existe.

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