Saraivada de tarifas, instabilidade económica e o fim de uma era
Em 2018, por ocasião de renegociação (por imposição de Trump) do acordo de comércio livre (ACL) que instituíra a NAFTA (em 1994), Trump assinou o Acordo [de comércio livre entre os] EUA-México-Canadá (USMCA), que qualificou de “o acordo comercial mais moderno, atualizado e equilibrado da história do[s EUA], com as proteções mais avançadas para os trabalhadores já desenvolvidas”. As economias dos 3 países foram ficando mais integradas.
As empresas do México e do Canadá beneficiaram do mais fácil acesso ao mercado estado-unidense, tendo (em 2024) as mexicanas exportado para os EUA 617 mil milhões de dólares (mM$) e as canadianas 412,7 mM$.
As empresas dos EUA também beneficiaram, tendo o Canadá e o México passado a ser, de forma destacada, os maiores mercados para as exportações dos EUA; só em 2024, as exportações norte-americanas para estes dois países excederam 631 mM$.
Contudo, o Canadá e México são muito mais dependentes dos EUA do que o inverso.
Em 2024, mal tomou posse, Trump cumpriu a promessa de impor tarifas ao Canadá e ao México - com pretextos risíveis que constituem uma clara violação do acordo USMCA - estando ainda a impor uma saraivada de tarifas a outros países ou blocos económicos aliados, prometendo ainda impor tarifas “recíprocas” a “todos em toda a linha”. Naturalmente, os países e blocos económicos afetados aplicaram tarifas retaliatórias.
Trump afirma que a receita pública arrecadada através das tarifas será tão significativa que fala em substituir o IRS (Internal Revenue Service) por um ERS (External Revenue Service), alimentado pelas tarifas aduaneiras (e “por outras receitas geradas no exterior”). Todavia, para que tal possa ser concretizado, as tarifas teriam que ser enormes. A política comercial mercantilista de Trump parte do wishful thinking de que a imposição de tarifas levará ao ressurgimento da capacidade manufatureira americana. A insuspeita Tax Foundation explica que “as evidências históricas mostram que as tarifas aumentam os preços e reduzem as quantidades disponíveis de bens e serviços para as empresas e consumidores dos EUA, resultando em menores rendimentos, redução de postos de trabalho e menor produção económica.” E, quando feita de forma generalizada, a imposição de tarifas [elevadas] provoca enorme instabilidade económica e financeira, que já começou a ocorrer.
Para o querido líder estado-unidense, a estabilidade económica e financeira e o respeito pelo direito internacional, pela palavra dada e pelos compromissos de longo prazo do país valem menos do que preocupações merceeiras com a arrecadação de receita pública.
Como bem explicou o PM canadiano, “a antiga relação que tínhamos com os EUA - baseada no aprofundamento da integração das nossas economias e na cooperação rigorosa em matéria de segurança e militar - terminou.”
Consultor financeiro e business developer