Saber sair e saber avançar

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O que começou por ser um “mau debate”, com momentos infelizes causados por “cansaço de viagens”, tornou-se num desastre. Tropeços nas palavras, silêncios longos em sinal de perda de raciocínio, mistura de temas, trocas de nomes e de cargos. Biden já deu sinais suficientes de que não estará no pleno das suas capacidades - pelo menos para assumir o mais importante cargo de uma das maiores potências mundiais.

Afinal, o que lhe vai pesar mais? A capacidade para cumprir ou o seu ego? Joe Biden acredita que é a pessoa mais capacitada para derrotar Trump, apoiando-se na sua presidência e nos feitos passados. Mas, numa eleição, está em jogo o legado histórico ou o futuro? Será injusto assumir que a resistência de Biden em sair da corrida denota, em parte, que está agarrado ao poder, e que não aprendeu a arte de saber sair?

Do outro lado, temos um nome que jura lealdade a Biden, mas que tem sido referido como a melhor opção para o substituir: Kamala Harris. Uma nova sondagem divulgada esta sexta-feira diz que seis em cada dez democratas acreditam que a atual vice daria uma boa presidente dos EUA. O seu nome é mais forte entre os negros norte-americanos do que entre os adultos brancos, efeito da identificação - Harris é filha de uma indiana e de um jamaicano.

É também mais popular entre as mulheres do que entre os homens - foi a primeira mulher vice-presidente do país. É natural o seu interesse e entusiasmo por vir a ser presidente dos EUA, mas não fica bem expressá-lo: afinal, demasiada ambição pode fazer o público vê-la como demasiado sedenta pelo poder e como uma traição ao homem que a escolheu para ser seu apoio. Deverá permanecer recatada, até que o homem da frente reconheça que o seu tempo no posto terminou.

É um equilíbrio difícil, este, que tem na sua base as dinâmicas de poder, as tricas internas e o jogo mediático da perceção. Mas não haverá também aqui uma dimensão de género?

Numa questão não há dúvidas - em geral, na política (mas não só), os homens são mais rápidos e livres a manifestar as suas ambições, que não refletem necessariamente as suas competências. As mulheres são mais comedidas a dizer: “Eu quero”; ou “Eu sou a melhor pessoa” - já vários estudos sobre recrutamento concluíram que as mulheres só concorrem a uma vaga quando preenchem todos os requisitos pedidos, já os homens tentam a sua sorte quando preenchem apenas 60% do que é pedido.

Assim, elas concorrem a menos empregos do que eles, diminuindo também as suas chances, por uma questão de probabilidades.

A política também se faz de confiança - a sua demonstração pode ser associada a sobranceria ou a arrogância, mas o seu excesso tem resultado na lamentável eternização no poder de várias figuras ao longo da História.

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