Roménia: derrota do Centrão?

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Em política, que na definição de Carl Schmitt é o terreno do amigo e do inimigo, a alegria de uns acaba sempre por ser a tristeza de outros. Enquanto o polaco Karol Nawrocki, candidato do Partido Lei e Justiça às eleições presidenciais de 18 de Maio, o italiano Matteo Salvini, líder da Liga, e a francesa Marion Maréchal, do Reconquête, celebravam a primeira volta das eleições romenas, onde o candidato da direita nacional populista, George Simion, triunfava com mais de 40% dos votos, o primeiro-ministro do governo de Bucareste, Marcel Ciolacu, do PSD, apresentava a demissão.

Os resultados da eleição de Domingo foram simultaneamente uma punição e uma confirmação. Uma punição para os políticos romenos e europeus que, perante a vitória de Calin Georgescu de Novembro de 2024, tentaram “parar a extrema-direita e salvar a democracia”, alegando atabalhoadamente “interferência russa” via redes sociais e anulando a eleição através de uma decisão unânime do Tribunal Constitucional.

Georgescu teve, em Novembro, 23% dos votos; Simion, na mesma eleição – a anulada –, tinha tido 14%. Desta vez, Simion, apoiado por Georgescu, teve 41; e se 23 mais 14 são 37, então a votação na área política proscrita aumentou…

O partido de Simion chama-se Aliança para a Unidade dos Romenos (AUR). É um partido nacionalista e popular, fundado em 2019, e teve 9% dos votos na eleição parlamentar de 2020; em 2024 dobrou para 18%. Antes da AUR, havia um outro partido radical romeno, o Partido da Grande Roménia (PGR), fundado por Corneliu Vadim Tudor, misturando nacional-comunismo e antissemitismo. Apesar disso, Tudor, na eleição presidencial de Novembro de 2000, ficou em segundo lugar, com 28%.

A AUR de Simion, que na juventude foi PGR, procura distanciar-se da confusão ideológica de Tudor. Claramente anticomunista, o partido é eurocéptico ou eurocrítico e manifesta o seu alinhamento com o nacionalismo do MAGA trumpiano. Quanto ao passado romeno e às duas figuras dominantes dos anos 30, Corneliu Codreanu, fascista e líder da Legião do Arcanjo S. Miguel, e o ditador marechal Ion Antonescu, Simion tem o cuidado de manter as distâncias, sem escandalizar os nostálgicos.

Simion é claramente nacionalista e anti-hegemonia de Bruxelas; diz desejar a paz na Ucrânia e mostra-se contrário ao apoio militar a Kiev. Tem também boas relações com a Igreja ortodoxa, sobretudo entre o baixo clero.

Uma das razões da popularidade da AUR e de Simion , e talvez a principal, é a crescente impopularidade das elites políticas da Roménia, um país onde um terço da população vive na pobreza; a generalidade dos cidadãos tem fraca opinião dos dois principais partidos do sistema, o PSD, Partido Social Democrata, do centro-esquerda, e o PNL, Partido Nacional

Liberal, do centro-direita, que protagonizaram graves casos de corrupção e de tráfico de influências.

Estes partidos do Centrão – PSD e PNL –, que desde a queda do comunismo e do sinistro Ceausescu estão no poder, apresentaram um candidato conjunto à última eleição, Crin Antonescu, que perdeu para o presidente da Câmara de Bucareste, Nicusor Dan, que ficou com 20,99% e vai à segunda volta contra Simion. O Presidente da República interino, Klaus Iohannis, é do PNL.

Será a primeira vez em 36 anos que o poder sai do centrão ou o centrão do poder por vontade insistente e reiterada do povo.

Politólogo e escritor. O autor escreve de acordo com a antiga ortografia

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