Relações de plástico

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Vivemos uma época de correria e de fast-tudo, em que as relações interpessoais são, muitas vezes, superficiais e à distância. Trocam-se mensagens e colocam-se likes, mas raramente se dão abraços. Visualizam-se os posts e as stories, mas não se fala cara a cara. Cuida-se de bebés a fingir como se fossem bebés a sério, mantêm-se relações sexuais com bonecos ou parte do corpo - em silicone e afins -, e descuram-se as necessidades das pessoas reais.

Vivemos numa época de relações de plástico?

Em Portugal, as situações de maus-tratos a crianças são muito frequentes e os dados de incidência conhecidos refletem uma realidade que, ou tem vindo a crescer, ou a tornar-se mais visível, fruto de maior sensibilização e consciencialização. Em paralelo, os bebés reborn são tratados como crianças de verdade e têm até direito a festas de aniversário e presentes. Há ainda quem os leve ao médico porque estão “doentes” ou “precisam” de ser vacinados.

Também as relações de amizade são cada vez mais vividas à distância, sem presença, sem toque, sem beijos nem abraços. Abundam as mensagens e os likes nas publicações, mas escasseia tudo o resto. Basta pensarmos no nosso dia de aniversário: Quantas mensagens recebemos? Quantos telefonemas recebemos? Quantos abraços recebemos?

Sobre as relações amorosas, assistimos à facilidade assustadora com que são descartadas. Quando as coisas não correm bem, as pessoas evaporam-se (e até temos um termo técnico para isto - o chamado ghosting), substituem-se os parceiros por contas em aplicações de encontros e rapidamente se procura uma alternativa. E é neste contexto que surgem muitas relações que mais não são do que um penso rápido, uma bengala que permite avançar sem, no entanto, se fazer o devido luto da relação anterior.

Não generalizando, naturalmente, percebemos que existem muitas relações de plástico. Pouco genuínas, com falta de entrega, de investimento e de persistência. Sejam elas relações de amizade, amorosas ou com familiares.

É preciso voltar à essência. Ao início. Reconhecer que todas as relações, sejam elas quais forem, implicam desafios, com coisas boas e menos boas. E que esses desafios exigem persistência e resiliência.

As relações não são sempre cor-de-rosa e tantas vezes surgem salpicadas de bolinhas pretas. São assim as relações.

Psicóloga clínica e forense, terapeuta familiar e de casal

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