Engana-se quem pensa que, ao celebrarmos o Dia Mundial do Doente, estamos inevitavelmente a incluir todas as pessoas mais velhas na equação. De facto, podemos congratular-nos que envelhecer não seja sinónimo de doença, mas para satisfazer tal ambição é fundamental seguir o rumo do envelhecimento saudável, processo que deve iniciar-se desde muito cedo. Para cumprir esse objetivo, existem medidas bem reconhecidas, como a atividade física, a alimentação saudável e equilibrada, a salvaguarda da saúde mental, a socialização e o respeito pelo sono..À medida que envelhecemos, o teor destas recomendações varia. Aquilo que se recomenda a um adulto de 50 anos não é necessariamente igual ao que se recomenda aos 60 ou 70. Muitos mitos dominam a nossa sociedade, podendo condicionar um envelhecimento menos bem sucedido. .Por exemplo, é comum a ideia de que a atividade aeróbica, como acontece nas caminhadas, é suficiente para as pessoas mais velhas. No entanto, há cada vez mais evidência de que também os mais velhos devem fazer exercícios de força. .Outro mito instalado diz respeito à alimentação, sendo que as pessoas mais velhas consomem insuficiente quantidade de alimentos ricos em proteínas: contudo, devem consumir nalguns casos o dobro da quantidade de proteínas dos jovens, para manter a massa muscular, a mobilidade e consequentemente, a autonomia. .Estes e muitos outros ensinamentos são transmitidos na consulta de Geriatria, cada vez mais procurada não só por doentes mais velhos que querem reverter a fragilidade e divergir de um caminho menos favorável, mas também pelos saudáveis, todos os que não querem vir a ficar doentes e celebrar amargamente o 11 de fevereiro como o seu dia. Efetivamente, a consulta de Geriatria transforma-se frequentemente numa sessão de literacia em saúde, especializada na pessoa mais velha. Enquanto médica geriatra, frequentemente digo que a minha missão é fazer com que aquela pessoa chegue aos 90 anos, com qualidade de vida e autónoma, continuando a viver na sua casa e junto dos seus..Refletir sobre o Dia Mundial do Doente, transporta-nos para a definição de saúde da Organização Mundial de Saúde: mais do que ausência da doença, deve ser uma situação de completo bem-estar físico, psíquico e social. Nesta lógica, conseguir um envelhecimento ativo e saudável implica uma atenção especial não só aos vários órgãos do corpo humano, mais vulneráveis ao desenvolvimento de doença pelo desgaste da idade, mas também às outras esferas determinantes do bem-estar, como a dimensão psicológica e a dimensão social..A integridade destas dimensões é ainda mais abalada entre as pessoas mais velhas, face a eventos de vida comuns nessa fase da vida, como o luto e a solidão. É, assim, um grande desafio preservar a saúde, de forma holística, considerando a pessoa no seu todo, nesta população mais sénior, mas é algo perfeitamente possível, com um acompanhamento médico especializado e a abordagem global necessária, sem menosprezar nenhum detalhe mais corriqueiro que a pessoa valorize. Não estranhe quem ouvir dizer que na consulta de Geriatria se recomendou sair mais de casa e telefonar aos amigos. .Ainda que possa acolher muitas pessoas séniores saudáveis, que reconhecem a necessidade de cuidados especializados para viver mais e melhor, também é frequente recebermos pessoas mais velhas com várias doenças crónicas e agudas, sobrepostas a condições tipicamente geriátricas, como a incontinência, o défice de memória, a instabilidade na marcha e quedas, a má nutrição, a sarcopenia, ou perda de massa muscular, entre outras. .A vulnerabilidade clínica, não deve, contudo, ser o argumento para a despersonalização da pessoa. Antes pelo contrário, a pessoa mais velha que vive com uma ou diversas doenças precisa ainda mais que a sua individualidade e a sua essência sejam reconhecidas e respeitadas, já que a falta de saúde não a define. Além das intervenções terapêuticas prescritas numa consulta de Geriatria, dirigidas à doença, a potenciação de outras capacidades a que dá importância, ajudam-na a sentir-se pessoa e não doente. Assim, espero que, neste dia 11 de Fevereiro, muitas pessoas que vivem com doenças não sintam este dia como seu. .Responsável pela Consulta de Geriatria no Hospital CUF Descobertas e na Clínica CUF Belém