Precisamos, de facto, de mais pessoas?
Num tempo em que se banalizou a ideia de que Portugal necessita de mais pessoas - sobretudo para suprir carências de mão de obra em setores estratégicos - talvez devêssemos parar para colocar a questão de forma mais profunda: será que precisamos, ou precisaremos sempre, de tantas mais pessoas?
Quando observamos o ranking da competitividade internacional, constatamos que vários países europeus com populações significativamente inferiores à portuguesa ocupam lugares de destaque. Dinamarca, Áustria, Suécia ou Suíça são exemplos de pequenas nações que, ainda assim, desenvolveram economias altamente competitivas, baseadas em setores de forte intensidade tecnológica, que geram mais valor com menos pessoas. Estes países demonstram que o sucesso económico não depende inexoravelmente da dimensão populacional, mas sim da sofisticação e produtividade dos seus modelos económicos.
Em Portugal, contudo, o debate em torno da imigração parece ter-se enredado numa narrativa simplista e pouco estratégica. Por um lado, sublinha-se a necessidade de atrair mais trabalhadores imigrantes, frequentemente pouco qualificados, para preencher vagas em setores como a construção, a agricultura ou o turismo. Por outro, discute-se a urgência de controlar e regular os fluxos migratórios.
O problema é que esta discussão, na forma como tem vindo a ser conduzida, ignora o ponto essencial: o perfil da nossa economia e, por maioria de razão, o perfil das nossas empresas.
Insistir, até à exaustão, na ideia de que precisamos de mais mão de obra é, em última análise, perpetuar um modelo económico de baixo valor acrescentado, sustentado em trabalho indiferenciado e intensivo. É, de certa forma, aceitar a estagnação.
Naturalmente, não se pode negar a necessidade de trabalhadores na construção civil. No entanto, o verdadeiro desafio deveria ser a industrialização do setor - apostando na pré-fabricação, na modularidade e na digitalização dos processos construtivos - tornando-o mais produtivo e menos dependente da mão de obra intensiva.
Do mesmo modo, é inegável que a agricultura carece de trabalhadores. Mas a prioridade deveria ser a mecanização, a automação e o fortalecimento de cadeias de valor mais sofisticadas, que integrem a transformação alimentar e a exportação de produtos de elevada qualidade e valor.
Quanto ao turismo, um dos motores da economia nacional, é evidente que continuará a necessitar de recursos humanos. Mas não será tempo de repensar o modelo? Apostar na qualificação, na inovação, e na diversificação da oferta, fugindo da armadilha do turismo de massas que, embora volumoso, cria emprego pouco qualificado e de baixa remuneração.
A questão, portanto, não é se precisamos de mais pessoas. É, antes, se queremos continuar a precisar. O caminho sustentável para Portugal passa, inevitavelmente, por investir na qualificação do tecido empresarial, na inovação tecnológica e na capacidade de criar mais valor com menos recursos. Se é viável em países pequenos e altamente desenvolvidos, é viável também em Portugal.
Não devemos, pois, aceitar como destino o que pode e deve ser uma escolha.
Professor catedrático