Por uma escola inclusiva
O pequeno filme da campanha publicitária de Natal de uma empresa de comunicações nacional conta em traços largos cinco histórias de vida que propõem uma reflexão sobre a diferença e a integração. Pilar, Ester, Viviane, Benedita e Francisco representam alguns dos excluídos que, neste final feliz, exemplificam que não há impossíveis desde que nos mobilizemos para que existam oportunidades.
A educação é, sem dúvida, um poderoso meio para criar oportunidades e, por isso, a Agenda 2030 estabelece como um dos seus Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável que se garanta "uma educação de qualidade, inclusiva e equitativa" para todos. Em 2018, a OEI e a UNESCO prepararam um guia para assegurar a inclusão e a equidade na educação da região ibero-americana. Como o próprio nome indica, tratou-se de estabelecer um conjunto de medidas para superar obstáculos e alcançar mais justiça e igualdade social.
A OEI acaba de publicar um estudo comparativo envolvendo 22 países da região, em que são analisados os dados relativos aos avanços alcançados na educação inclusiva que, nos últimos dois anos, se cruzou com os efeitos da pandemia. Contando com os contributos dos Ministérios da Educação, de peritos em educação inclusiva e aberto aos contributos da sociedade civil, este estudo mostra que as diferentes abordagens (e resultados) começam no próprio conceito de educação inclusiva e nas formas como está plasmada nas normas legais dos diversos países. Se os princípios da inclusão e da equidade estão presentes nas constituições ou na legislação de mais de 87% dos países, em 94,4% refere pessoas com deficiência e, em 88,9% inclusão de género, sendo muito menos expressiva a referência a população vulnerável, ou a refugiados e migrantes. No imaginário social, a educação inclusiva confunde-se com a educação especial destinada a pessoas com deficiência, quando cada vez mais as formas de exclusão são diversas tendo como elemento comum o estigma de ser diferente.
Sem qualquer surpresa, a crise sanitária da Covid-19 agravou a situação destes grupos, não só porque, em muitos casos, o apoio a alunos com deficiência foi suspenso, como também porque foram os mais vulneráveis que tiveram menos condições para aceder a dispositivos digitais ou, muito simplesmente, poder alimentar-se. Nos países mais pobres, ou com mais desigualdades, as agências de cooperação internacional foram obrigadas a criar programas de emergência, desde a formação de docentes a distribuição de recursos educativos, dispositivos eletrónicos ou simples alimentos.
Apesar das assimetrias, a situação de Portugal distingue-se da maioria destes países e constitui até um estudo de caso no que se refere à educação inclusiva, não só por um entendimento abrangente da inclusão, como pelas abordagens que tem vindo a fazer em territórios mais vulneráveis ou em relação às dolorosas fraturas dos que não se reveem no sexo com que nasceram. Em 2006, o Professor David Rodrigues publicava o artigo "Dez Ideias (Mal feitas) sobre a Educação Inclusiva" em que começa por constatar "Neste aspeto, poder-se-ia dizer que quanto mais a exclusão social efetivamente cresce, mais se fala em Inclusão. O termo Inclusão tem sido tão intensamente usado que se banalizou de forma que encontramos o seu uso indiscriminado no discurso político nacional e setorial, nos programas de lazer, de saúde, de educação etc."
O conselheiro nacional de educação e fundador da Associação Pró-inclusão tem vindo a demonstrar como a exclusão resulta de múltiplos fatores e, assim, a importância de escolas inclusivas que acolhem todos os alunos, também aqueles que apresentam algum tipo de deficiência ou dificuldade de aprendizagem. Mais importante é que estas escolas disponham de equipas multidisciplinares que possam apoiar as necessidades de cada aluno. Citando os versos de António Gedeão que servem de lema à Associação Pró-Inclusão, "Não há, não/duas folhas iguais em toda a criação./Ou a nervura a menos, ou a célula a mais,/não há, de certeza, duas folhas iguais". Esse é o desafio da escola como comunidade: responder na diferença e, ao mesmo tempo, aproveitar essa diferença para enriquecer o coletivo.
Diretora em Portugal da Organização de Estados Ibero-Americanos