Por que continuamos à espera para concretizar o verdadeiro potencial das Juntas de Freguesia?
Construir uma residência universitária em menos de um ano? Conseguimos.
No mesmo espaço de tempo, reabilitar dezenas de apartamentos e garantir mais habitação digna e acessível na cidade de Lisboa? Conseguimos.
Receber da Autarquia de Lisboa um prédio devoluto e transformá-lo, em tempo recorde, numa nova creche que reforça a nossa rede pública e apoia, de forma inequívoca, as famílias? Conseguimos e irá abrir no próximo mês de novembro.
São exemplos atrás de exemplos que demonstram como as juntas de freguesia têm capacidade para fazer mais, ambicionar outras competências e serem vistas como parceiros por mérito próprio, complementando não só o papel das câmaras municipais, mas colaborando efetivamente com o Estado Central na construção de uma nova geração de políticas publicas bottom-up de enorme proximidade.
São inegáveis as capacidades destas entidades públicas de comunicar e de se interligarem com as populações, bem como o aprofundado conhecimento das suas reais necessidades. Não é de estranhar, portanto, que sejam as instituições políticas com os maiores índices de confiança dos cidadãos. Segundo um estudo recente da Fundação Francisco Manuel dos Santos, 70% dos portugueses afirmavam confiar nos seus presidentes de junta.
Perante todas estas evidências, por que é que continuamos à espera? Por que continuamos a assistir, semanalmente, à abertura de novas linhas de candidaturas e financiamentos que deixam de fora as freguesias como potenciais beneficiárias?
Existe um claro “paternalismo” sobre as capacidades das nossas freguesias executarem mais competências, o que é diariamente rebatido pela ação competente e dedicada de mais de 20 mil autarcas de freguesias por todo o país. A título de exemplo, basta recordar o seu papel no combate à pandemia de covid-19, ou o apoio imprescindível nas ações de combate aos fogos e de salvaguarda das populações. No caso concreto de Lisboa, todos nos recordamos da ação fundamental na organização e bom funcionamento das Jornadas Mundiais da Juventude, em 2023.
Defendo há muito a premissa das Juntas de Freguesia enquanto verdadeiros agentes de mudança e de reaproximação dos cidadãos descrentes da política nacional e das instituições políticas.
A confiança no nosso sistema político só se reconstrói com proximidade, transparência e representatividade. Isso mesmo! Representatividade, a capacidade de um eleitor saber em quem votou, reconhecer a sua ligação às suas preocupações reais e conseguir interagir com o eleito sempre que necessitar. São estas características únicas das freguesias que as tornam o organismo mais participado, representativo e merecedor de confiança dos nossos concidadãos.
Infelizmente não é só a nível nacional que continuamos nesta espécie de limbo de indecisões e de redução da importância do papel das freguesias. Ao longo dos últimos anos, a Junta de Freguesia de Benfica tem vindo a requerer a necessidade imperiosa de se aprofundar e rever a reforma administrativa de Lisboa.
Passaram 10 anos, é fundamental revisitar as competências delegadas, os montantes das verbas transferidas e debater construtivamente um novo pacote de descentralização, de competências municipais para as freguesias lisboetas.
Alguém tem dúvidas de que uma freguesia vai fiscalizar de forma mais diligente as obras privadas que danifiquem o espaço público? Alguém tem dúvidas de que as freguesias seriam mais lestas a retirar os cabos das operadoras que invadem as fachadas da nossa cidade? Ou que em Lisboa tratariam de forma mais zelosa e respeitosa os cemitérios municipais?
Ainda este ano, a dívida desta autarquia à JFB tem vindo a limitar a capacidade da Junta de efetuar investimentos próprios. Na data em que escrevo este texto, o montante ultrapassa já um milhão e 300 mil euros. Não é admissível esta postura de incumprimento permanente do município para com as freguesias. Não é compreensível que, com o maior Orçamento Municipal da história do nosso país, não se comporte a capacidade do município de honrar os seus compromissos financeiros.
A nossa visão de futuro é ambiciosa, e sabemos que podemos ajudar a nossa comunidade, e a cidade de Lisboa, ao trabalharmos com redobrada energia e em estreita colaboração com o órgão municipal. Mas esta visão precisa de um parceiro dialogante, célere na decisão e liberto das amarras dos jogos partidários. Ainda não é tarde para arrepiar caminho e construirmos a cidade que os nossos concidadãos desejam e merecem.
Somente com uma descentralização eficaz, um investimento robusto e o envolvimento ativo da população será possível transformá-las em motores de desenvolvimento local, capazes de responder com eficiência e inovação aos desafios atuais, com um enorme impacto na vida das pessoas.
No fim do dia é por elas que trabalhamos, para que a nossa ação resulte numa maior qualidade de vida, através de habitação acessível, alojamento universitário, difusão da cultura, equipamentos sociais para idosos e crianças, programas diferenciados para as famílias, respostas sociais, entre outros. Se conseguimos? Conseguimos. Só precisamos que confiem em nós.