Ponte de Lima

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O facto de se viver em Lisboa, fazer a gestão da vida na capital e ficar quase que umbilicalmente preso à cidade tolda-nos, por vezes, os horizontes. Não que não saibamos que há muito mais país, em todas as vertentes, do que o mundo em que nos movemos. Porém, nem sempre estamos alertas para as outras realidades. Por exemplo, Ponte de Lima celebra os 900 anos da sua carta de Foral, concedida por Dona Teresa a 4 de Março de 1125. Não é todos os dias que se comemora uma data assim. E acaso foi notícia por aqui? Não. Só soube porque, a propósito desta data, inaugurou-se na passada Sexta-feira uma estátua de D. Afonso Henriques.

Que aliás, foi notícia, num jornal regional e pouco mais. O autor é o escultor galego Elías Cochón Rei a partir de uma concepção de uma designer local, Joana Silva. Representa o primeiro rei, imponente, numa linguagem formalista de iconografia mais clássica: D. Afonso Henriques, de loriga de malha metálica, manto e túnica, apoia-se num escudo amendoado com as quinas em cruz e uma espada grande. A coroa emoldura um rosto firme, decidido, como em muitos de nós foi alimentada a sua imagem. Uma estátua em bronze, de 3 metros, sobre uma base de granito, e ninguém fala sobre isso. Claro, não é um futebolista, não é um político da moda ou um actor consagrado. É um rei, o primeiro rei, na celebração de 900 anos de História. É com pena que vejo horas infindáveis na comunicação social a debater as mesmas notícias – sempre as mesmas duas ou três – pisadas e repisadas, sem qualquer acrescento à notícia inicial, por dias seguidos. Como se mais nada se passasse no país. Não é só a questão da espuma dos dias ou aquilo que agora prende a atenção: é igualmente a frivolidade de, passado algum tempo, se esquecer dos terríveis acontecimentos que tanto povoou o nosso quotidiano em substituição da “notícia da moda”. E depois, há estes momentos. Que deveriam ajudar a ser de união, de admiração, de felicitações. E de que ninguém fala, quer saber ou noticia.

Ponte de Lima é um encanto no Minho. É e tem muito mais. E esta homenagem a um grande homem, aquele que quis fazer e fez nascer Portugal, é apenas mais uma desculpa para ser revisitada.

Professora auxiliar da Universidade Autónoma de Lisboa e investigadora (do CIDEHUS).

Escreve sem aplicação do novo Acordo Ortográfico

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