Poderão as criptomoedas tornar-se na moeda corrente?

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Em pouco mais de uma década, as criptomoedas registaram um crescimento notável. Todos conhecemos a história do cryptominer que pagou 10 mil Bitcoins por duas pizas, em maio de 2010, certo? Hoje esses mesmos Bitcoins valem cerca de 391,7 milhões de dólares - é muito dinheiro para pagar por mozarela!

São estes altos e baixos que tornam as criptomoedas num investimento altamente volátil. O valor das moedas fiduciárias é normalmente determinado pelo crescimento económico e pelas taxas de juro; no caso das criptomoedas, o valor está no desconhecido.

Ainda assim, elas estão a tornar-se convencionais com muita rapidez. Um estudo a nível global revelou que 15.5% das pessoas já adquiriu criptomoedas e que, destas, quase metade as adquiriu em 2021, o que demonstra como estamos ainda a iniciar este boom das moedas digitais.

É, portanto, altura de explorar o mistério por detrás das criptomoedas, perceber o que as valoriza e se alguma vez poderão substituir a moeda regular. Poderá o Bitcoin tornar-se num meio de troca fiável e quotidiano, em vez de uma reserva de valor instável?

Sabemos que o mundo das criptomoedas é limitado pela oferta e pela procura. Apenas podem ser minerados 21 milhões de Bitcoins, por exemplo; e, tal como acontece com o ouro ou os imóveis, esta escassez impulsiona a procura e o preço.

Atualmente, as criptomoedas são, acima de tudo, ativos especulativos - a maioria dos investidores aposta no seu valor, em vez de as utilizar para a aquisição de bens e serviços. O desconhecimento acerca da sua viabilidade a longo prazo como um meio credível de pagamento também não ajuda - ninguém quer pagar as compras de supermercado com uma moeda cujo valor pode disparar no dia seguinte! Os tokens como o Bitcoin são também utilizados para pagamentos ilícitos, tendo-se registado um valor de cerca de 14 mil milhões de dólares destes só em 2021.

Por estas razões, as empresas de serviços financeiros estão ainda relutantes em adotar as criptomoedas. O setor ainda está a amadurecer e os legisladores estão a tentar descobrir como o regular sem sufocar o seu desenvolvimento. Então, o que deve mudar para que as criptomoedas possam progredir neste caminho?

Atualmente, as criptomoedas operam através de um "controlo descentralizado". Isto significa que não são emitidas por um banco central ou regulamentadas por um governo, e o seu desenvolvimento é livre, sem supervisão regulamentar. Embora isto permita uma inovação sem restrições e o anonimato dos utilizadores, também pode fazer deste mercado um "ninho" de especulação, burlas e manipulação, oferecendo aos investidores pouco controlo ou proteção sobre os seus ativos.

A legislação é crucial para o sucesso a longo prazo deste setor, prometendo a estabilidade do mercado, a confiança dos investidores e um ecossistema mais seguro. No entanto, ainda está em discussão o que essas normas devem exatamente implicar.

A falta de cooperação internacional significa que a legislação irá surgir, provavelmente, país a país. Isto cria um enorme potencial de liberdade e prosperidade nos mercados emergentes com pouco acesso ao sistema financeiro global - por exemplo, África já possui seis países entre os 20 melhores para a adoção de criptomoedas.

Entretanto, os bancos centrais estão a considerar emitir moedas digitais (CBDCs, na sua sigla em inglês) para permitir mudanças rápidas na política monetária e uma visão mais clara da saúde financeira. As CBDCs vão ajudar a reduzir os custos envolvidos na movimentação de moeda fiduciária entre os bancos, as empresas e os consumidores. No entanto, o progresso atual é lento; apenas se surgir uma política monetária internacional pré-definida, com representação de instrumentos financeiros e que ofereça igualdade para todos os participantes, é que poderão surgir oportunidades mais amplas para o comércio global.

O processo atual de movimentação de criptomoedas é ineficiente e lento - validar uma transação de Bitcoin leva, em média, dez minutos. Contudo, com a capacidade única das criptomoedas para ter instrumentos financeiros programados, a tecnologia emergente desta infraestrutura está a permitir vários novos casos de utilização, como pagamentos instantâneos e transações escaláveis.

Para que as instituições financeiras evitem perder terreno e quota de mercado, devem criar mais instrumentos financeiros baseados nas criptomoedas. De serviços de custódia a opções de investimento adicionais, ou até mesmo a um sistema de crédito baseado em empréstimos de criptomoedas garantidos, a tecnologia abre a porta a novos serviços transformadores que os bancos tradicionais podem monetizar. Não é surpresa, então, que instituições como a JPMorgan tenham começado a investir no blockchain, a criar moedas digitais e até a abrir uma versão no metaverso.

Por enquanto, comprar criptomoedas é maioritariamente uma questão de especulação, e os reguladores precisam de exercer mais controlo sobre os ativos que não podem ser avaliados em nenhum sentido fundamental. No entanto, o futuro parece entusiasmante.

Alguns players deste mercado estão a desafiar a noção de que os utilizadores devem ser completamente anónimos, através de processos "Know Your Customer" e antilavagem de dinheiro, para apaziguar as preocupações sobre a criminalidade. Em conjunto com um regime regulatório transparente, estes passos vão ajudar os bancos e os consumidores a entender prontamente os benefícios inegáveis das criptomoedas.

Em suma, o potencial é enorme, podendo as criptomoedas servir, finalmente, como um meio viável de câmbio. Em teoria, o aumento da sua adoção reduzirá a volatilidade e criará um círculo virtuoso - e, embora isso leve muito tempo e implique uma grande adesão, a sua quase inevitabilidade significa que quem se preparar desde já terá uma forte possibilidade de dominar o futuro do comércio de criptomoedas (crypto commerce). Por que não começar?


Financial Services Strategist da CI&T

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