Passa ao outro e não ao mesmo
Há muito que Portugal é reconhecido como um dos países mais seguros do mundo, mas se há uma área da segurança que, sistematicamente, nos dá grandes dores de cabeça, é a segurança das, e nas, nossas praias.
Todos os anos, sem exceção, quando se inicia a Primavera, começam as preocupações, mais ainda quando o tempo quente decide fazer a sua aparição de forma prematura.
Será natural pensar-se que a segurança das nossas praias seria uma incumbência do nosso Estado, que a deve garantir, através dos nadadores-salvadores. Nada mais certo quanto ao princípio, nada mais errado quanto à prática.
De facto, por princípio, esta tarefa é do Estado, a quem cabe a gestão das praias, onde se inclui, entre outras, a assistência aos banhistas. Porém, na maioria dos casos, esta obrigação continua a ser "empurrada" para os concessionários das praias.
Apesar da assistência a banhistas ser atualmente uma competência das Autarquias, por via da transferência que ocorreu em 2019, erradamente sem grandes "reflexões" quanto às verbas que seriam necessárias, frequentemente esta acaba por continuar a cair nos concessionários de praia sempre que estes existam.
Sobra assim para os referidos concessionários, esta importante e necessária responsabilidade que há mais de cem anos cuidam das nossas praias e que acabam por prestar um serviço público fundamental pela sua responsabilidade na contratação de nadadores-salvadores, garantindo assim a vigilância e segurança das zonas balneares. Asseguram também muitos outros serviços indispensáveis aos veraneantes como vestiários, balneários, instalações sanitárias, postos de socorros, comunicações de emergência, informação e assistência a banhistas, limpeza da praia e recolha de resíduos urbanos. Paralelamente, podem dispor de serviços comerciais, nomeadamente de restauração e bebidas, que normalmente são prestados em fantásticas esplanadas que todos conhecemos um pouco por todo o país.
Para uma atividade que é sazonal, os custos são inúmeros e a capacidade financeira destas empresas para assegurar a vigilância das praias representa um enorme esforço, para além das dificuldades inerentes à problemática da escassez de nadadores-salvadores. Como sabemos, a maioria dos nadadores-salvadores são estudantes, e esses, quando se inicia a época balnear, estão ainda em fase de exames, o que dificulta a sua contratação.
E depois, se não houver nadadores-salvadores na praia, a responsabilidade vai para o concessionário.
E se o jovem tiver saído na noite anterior e decidir não aparecer no dia seguinte, a responsabilidade é...do concessionário.
Os concessionários não podem "fabricar" nadadores-salvadores. Eles têm de ser formados e disponibilizados. E há entidades que têm essas competências e a quem compete garantir um contingente que seja suficiente para as necessidades.
Portugal tem condições excecionais para poder ter uma época balnear alargada. São mais de 800 quilómetros de costa, o clima no Inverno é ameno e atrativo para muitos turistas de países mais frios, temos locais que permitem a prática de desportos náuticos durante todo o ano, mas para aproveitar todas estas potencialidades, é necessária uma análise e um estudo mais aprofundado, desde logo a questão da época balnear, mas sobretudo, a questão fora dela.
Já vamos tendo alguns bons exemplos, como é o caso do "Programa Praia Protegida" em que a Câmara Municipal de Almada, com o envolvimento de outros parceiros, não só assumiu a responsabilidade de vigilância balnear como a assumiu durante todo o ano, garantindo um dispositivo mínimo de prevenção e resposta permanente, mas também de um dispositivo flexível que pode ser modular e adaptado às alterações climáticas.
As nossas praias são das melhores do mundo e constituem um dos principais pilares do nosso turismo, essenciais para quem nelas investe, mas também para todos os cidadãos que delas usufruem, e delas não prescindem, durante os seus períodos de lazer.
Está na hora, de uma vez por todas, do poder local assumir as suas competências ao nível da assistência nas praias. É tempo de passar ao outro e não ao mesmo.
Secretária-geral da AHRESP - Associação da Restauração, Hotelaria e Similares de Portugal