Parem de chamar ao Musk “oligarca”! Digam “olidiota”

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Acabo sempre por me surpreender com a capacidade dos comentadores nacionais de emprenharem de ouvido e, revelando uma maravilhosa incapacidade de pensamento original, passarem dias a fio a chamar “oligarcas da tecnologia” - ecoando acefalamente Joe Biden - aos empresários de Silicon Valley que foram à tomada de posse de Donald Trump. Isto, exceção feita a Mário Crespo que, tanto quanto vi, foi o único que disse, na CNN Portugal, que esse termo é absolutamente errado.

A América é provavelmente o mercado mais livre do mundo, pelo que, se estas pessoas são multimilionárias, são-no porque tiveram a capacidade e talento para criar negócios que lhes permitiram lá chegar. Isto num país em que os cidadãos têm o poder de decidir livremente que serviços escolhem. O oposto dos regimes cuja a economia funciona em oligarquia, como a Rússia, em que o poder económico é entregue pelo governo a um grupo restrito de cidadãos.

A questão até se poderia resumir à língua portuguesa: os EUA, com todos os seus defeitos, são uma democracia (do grego demokratía, “governo popular”, i.e., poder pelo povo), enquanto a Rússia é, desde o fim da URSS, pelo menos, uma oligarquia (do grego oligarkhía, “governo de poucos”). Mas a Economist, esta semana, pôs isto em números. Todo o valor somado das “enormes fortunas” representadas pelos empresários da tecnologia que estiveram na tomada de posse de Trump representam apenas 3,1% de todo o PIB norte-americano. Na Rússia, 20% da força de trabalho e 77% das vendas industriais estavam, antes da guerra, nas mãos de 24 pessoas amigas de Vladimir Putin...

Além disso, como os nossos comentadores deveriam saber - e transmitir -, por viverem em concorrência feroz, aqueles empresários odeiam-se mutuamente, de morte. Quase todos têm produtos concorrentes e não existe ali qualquer união entre eles ‘contra o povo americano’. Isso aliás foi visível quando Elon Musk veio insurgir-se contra o programa governamental para a IA, em que está muito envolvido Sam Altman, da OpenAI (ChatGPT), mas ele e a sua xAI ficaram de fora.

Musk, o mais visível dos apoiantes do atual presidente dos EUA, é um showman - e deve grande parte do seu êxito a isso mesmo. Objetivamente, tem dois enormes êxitos na carreira: a SpaceX e a Tesla - o espaço e os carros elétricos. Dois setores em que investiu contra tudo e todos e, reunindo os melhores engenheiros, foi bem-sucedido. Tudo o mais falhou, não saiu do papel ou funciona mal.

Musk, que nem tem qualquer formação académica relevante, é essencialmente um pretensioso e vaidoso, que lança memes no seu X e, com isso, arrasta o mercado acionista ou da cripto. Nesse sentido, pode dizer-se que é um “olidiota”... Duvido que saiba bem o que seja um nazi.

Editor do Diário de Notícias

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