Outra Joana Marques Vidal, pois claro!

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No já longínquo dia 12 de Outubro de 2018, Joana Marques Vidal poderia ter sido reconduzida para um segundo mandato como Procuradora Geral da República. A sua recondução seria um acto normal de gestão à luz do que tinha sido o seu mandato, irrepreensível e de um enorme profissionalismo. Por ela passaram importantes processos jurídicos que atingiram, entre outros, o então primeiro-ministro José Sócrates, o banqueiro Ricardo Salgado, o presidente da empresa angolana Sonangol, Manuel Vicente, desencadeando, ainda, as investigações ao caso de Tancos e ao incêndio de Pedrógão Grande.

Joana Marques Vidal podia e deveria ter sido reconduzida, mas isso não se verificou. Apesar da sua significativa qualificação técnica e do modo profissional como tinha gerido o Ministério Público, um estranho entendimento entre António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa impediram a sua recondução, obviamente, por exclusivas razões partidárias e da conveniência de António Costa, que nada tinham a ver com as prioridades do país e com o desejo de um efectivo combate aos problemas da corrupção em Portugal.

O actual Presidente da República e o ex-primeiro-ministro tinham agilizado uma solução que passava pela vontade política de Costa ter na Procuradoria alguém da sua confiança política e pela necessidade de uma cooperação institucional entre Belém e São Bento. E, com estas lógicas, o país é que ficou a perder.

Joana Marques Vidal tinha uma ideia correcta sobre o modo como devia ser gerida a Procuradoria-Geral da República. O papel do Procurador-Geral, no seu entendimento, é o de alguém que deve promover a organização, a articulação e a capacidade de gestão que possibilite aos restantes procuradores e magistrados trabalharem mais e melhor a favor de uma bom modelo institucional de Justiça. Para isso, Joana Marques Vidal reunia, mensalmente, com procuradores e magistrados. A comunicação era um aspeto importante no exercício das suas funções, defendendo que a Justiça deve comunicar com clareza e simplicidade.

O seu mandato marcou como excelente protagonista da Justiça, sem dúvida quem melhor exerceu o cargo de Procuradora-Geral da República e nos antípodas do mandato da actual Procuradora, Lucília Gago, que escolheu uma via de uma maior discrição e uma quase total ausência de presença mediática e contacto com o público e com a classe política. A prestação da actual Procuradora tem sido fraca e errática ainda que, com a sua ida ao parlamento, na passada quarta-feira, tenha desmantelado alguns dos mitos que, atualmente, avassalam a Justiça. Ficámos a saber que o número de escutas que era de 15.441, em 2015, desceu para 10553, em 2023. Com a sua passagem pelo Parlamento confirmou-se, melhor, alguns problemas que hoje atingem a Justiça, nomeadamente a falta de recursos humanos, uma questão que deverá merecer uma atenção especial do actual governo, dado que no período de 2026 a 2028 haverá um significativo aumento de reformas de magistrados.

Em breve Marcelo Rebelo de Sousa e Luís Montenegro terão, em consenso, de encontrar um novo nome para a Procuradoria-Geral da República. Seria importante que a sua escolha comum reflectisse o interesse nacional, a absoluta urgência no combate à corrupção. E, sobretudo, que a escolha venha a recair sobre alguém com um bom perfil técnico. Um nome que coloque de novo na agenda da Justiça o combate à corrupção a exemplo do que fez Joana Marques Vidal. Não ceder à tentação de uma qualquer escolha baseada, exclusivamente, na confiança partidária em detrimento de um perfil de qualificação técnica torna se vital num momento em que o PRR está em execução. A melhor homenagem que se pode fazer a Joana Marques Vidal é encontrar alguém que dê continuidade ao seu legado na exigência e rigor que coloque no exercício da sua função. Nomear, assim, uma nova Joana Marques Vidal, pois claro.

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