Os tempos de decisão no Parlamento Europeu

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Há momentos de atividade parlamentar onde sentimos que passarão muitos anos até vermos os resultados do nosso trabalho em relatórios que conduzem à aprovação de legislação. São em geral prolongadas as chamadas vacatio legis, (o tempo até a lei entrar em vigor), os quais podem estender-se por uma legislatura.

No dia a dia, esquecemo-nos disso para que esses longos prazos não nos desmotivem e retirem o sentido de urgência de concluir o nosso trabalho.

No princípio foi duro para mim, habituada que vinha do Governo a pensar e decidir muito depressa. Quando me lembrava do prazo de um ano que me haviam dado em 2005 para começar a emitir o cartão de cidadão, um dos projetos de modernização administrativa mais complexos que tive de coordenar, achava que em Portugal vivemos no país mais eficaz da Europa, o que não sendo verdade em todos os domínios é seguramente em muitos serviços públicos, das Lojas de Cidadão, às declarações fiscais ou renovação de documentos.

A pior história de que me lembro foi a de um Portal para a cooperação judiciária em que a Comissão Europeia pedia 9 anos para o ter disponível! Lembro-me de me indignar numa das reuniões, argumentando que daqui a 9 anos já nem haveria portais. Mais ou menos como reagia antes em Portugal quando, no âmbito do Programa Simplex, me pediam mais do que um ano para ter um portal pronto. No fim, lá acordámos os 5 anos!

Houve outros prazos longos que me doeram muito mais. O último foi, sem dúvida, os 3 anos para a entrada em vigor do Regulamento que proíbe a circulação de produtos fabricados com trabalho forçado na União Europeia. São 27 milhões de trabalhadores sujeitos a esta forma de escravatura moderna que podem ver a sua vida melhorada quando deixarmos de consumir produtos mais baratos à custa da violação dos seus direitos humanos básicos.

Esta demora é muitas vezes explicada pela falta de recursos financeiros para a Comissão Europeia preparar os instrumentos necessários à aplicação da lei, sejam eles portais, guidelines ou bases de dados. Contudo, há uma solução para este problema, desde logo que as propostas que entrem no Parlamento tenham a cobertura financeira para a sua execução com a flexibilidade para acolher as alterações que possam resultar da fase de negociação.

Acrescente-se ainda que este tempo de vacatio legis soma a um tempo já bastante longo que medeia entre a elaboração da proposta pela Comissão e a sua aprovação pelo Conselho e Parlamento, explicada pelo tipo de procedimento legislativo adotado. Também ele merecia alguma reflexão no sentido de o tornar mais curto, o que não é uma missão impossível mesmo que nunca vá ser muito rápido.

O que me parece incontornável, neste mundo cada vez mais acelerado e imprevisível, é que o tempo de decisão nas instituições europeias - incluindo o Parlamento - não tenha de ser encurtado, que a legislação não incorpore mais instrumentos de flexibilidade (e também seja mais simples) e que os instrumentos de avaliação não tenham de ser mais eficazes, beneficiando da enorme capacidade de recolha e tratamento de dados. Como isso se fará, é o que vamos ver nos próximos anos, nunca excluindo que há por aqui interessados que nada mude, sobretudo se for para melhor!


Eurodeputada

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