Os sempre adiados 2% na Defesa

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Portugal teve nos últimos dias um especial protagonismo no que diz respeito à guerra da Ucrânia, sobretudo porque o ex-primeiro-ministro António Costa, agora presidente do Conselho Europeu, prometeu apoio total e incondicional a Kiev, mas também por a embaixada portuguesa na capital ucraniana ter sido atingida por destroços de um míssil russo, o que levou o Ministério dos Negócios Estrangeiros a chamar o Encarregado de Negócios da Rússia em Lisboa para protesto formal.

É óbvio que são as palavras de Costa o verdadeiramente importante, até porque foram ditas na presença do presidente Volodymyr Zelensky e incluíram um desejo/promessa de ver um dia a Ucrânia na UE. Já o incidente com a embaixada deve servir para lembrar que desde fevereiro de 2022 Kiev está sob constantes ataques de mísseis, e não faltam os edifícios, oficiais, mas essencialmente de habitação, que exibem as feridas de uma guerra prolongada que terá já morto mais de dez mil civis ucranianos (militares terão sido 43 mil, segundo o próprio Zelensky já admitiu).

Porém, Portugal tem uma explicação a dar no contexto do esforço militar da NATO, que hoje claramente se destina a contrariar o expansionismo russo, desde logo na Ucrânia. Sim, houve fornecimento de material de guerra aos ucranianos e, do ponto de vista político, Lisboa tem sido constante no apoio a Kiev, não só nos tempos de Costa, como hoje com Luís Montenegro à frente do Governo. E a opinião pública portuguesa é das mais solidárias com os ucranianos, em grande medida pelo capital de simpatia que a sua comunidade imigrante tem entre nós. Mas se olharmos para o investimento militar do país em termos gerais, continua aquém do desejado, muito aquém mesmo.

É evidente que investir os tais 2% do PIB em Defesa que a NATO exige desde a Administração Obama não é fácil para um país de recursos limitados, em que a Educação e a Saúde surgem como prioridades, governe a esquerda ou a direita. Mas a situação é cada vez mais difícil de explicar aos parceiros, e em especial aos Estados Unidos quando Donald Trump tomar posse como presidente a 20 de janeiro.

Só para dar uma ideia, em 2016, quando Trump foi eleito pela primeira vez para a Casa Branca, só cinco dos então 30 países da NATO cumpriam a fasquia dos 2%. Portugal estava entre um vasto grupo de 25 países reticentes em aumentar o gasto militar, mesmo com o risco de desagradar a quem manda na América. Agora que Trump está de volta, e com a nova realidade de uma NATO aumentada para 32 membros devido ao fim da neutralidade da Finlândia e da Suécia em resposta à invasão russa da Ucrânia, a pressão para os 2% (ou mais) vai aumentar e a nova realidade é que só nove países ainda falham, e um deles é Portugal. Ou seja, se em 2016 Portugal tentava passar despercebido entre uma maioria de incumpridores, agora não se consegue esconder entre um pequeno grupo de países reticentes em gastar.

Pode Trump conseguir ou não o fim da guerra. E pode ou não a Rússia permanecer como uma ameaça à Europa. Mas a instabilidade geopolítica, as próprias obrigações no espaço da NATO e da UE, aconselham a um esforço de Portugal para acelerar em direção ao objetivo dos 2% de investimento militar. E usei a palavra investimento em vez de gasto exatamente por ser a forma certa de encarar este desafio. Seria importante que os dois grandes partidos portugueses, aqueles com tradição de chefiar Governos, de serem europeístas e de serem atlantistas, vissem aqui um objetivo comum.

Diretor-adjunto do Diário de Notícias

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